Opinião
Já chega de vã glória. (queremos ser esclarecidos, não persuadidos)
"A Aborto", "regionalização", "eutanásia", "Estado Social", "dívida pública", "imigração", "aquecimento global", "serviços públicos", "apoio às Artes": amostra aleatória de temas fracturantes, autênticos mananciais para os extremistas pouco pensantes em que se transformaram os líderes políticos e de opinião.
"A Aborto", "regionalização", "eutanásia", "Estado Social", "dívida pública", "imigração", "aquecimento global", "serviços públicos", "apoio às Artes": amostra aleatória de temas fracturantes, autênticos mananciais para os extremistas pouco pensantes em que se transformaram os líderes políticos e de opinião. Os assuntos vão e voltam, os (tele)jornais enchem-se, e o que sobra realmente? Fracturas, vazios onde cresce a demagogia e a perfídia oportunista de parte a parte. À medida que as facções se posicionam nos extremos mais longínquos do campo-de-batalha, os infindáveis "soundbytes" fazem o retrato do imóvel conflito. Em milhares de horas de inflamadas posições antagónicas, quanto é que realmente adiantámos no sentido do esclarecimento? Nada, votos, apenas, para este ou para aquele lado; é o conflito ideológico a substituir-se ao debate construtivo, a democracia em autofagia. O único benefício evidente é para os governantes - eleitos ou messiânicos pretendentes - que podem assim manter-se num nível de imaturidade mais condizente com a farsa heróica para que arduamente trabalham. É um sistema muito pouco civilizado, este, sobretudo quando olhamos para o desastre das oposições: esta semana, Marcelo Rebelo de Sousa rebentou "à bomba" com o Partido Socialista. Quem ganhou?
Assuntos nevrálgicos como o funcionamento das Oposições, ou do seus poderes enquanto forças políticas de representação popular, estão afastados de qualquer lógica minimamente responsável, para gáudio dos selvagens que espreitam a primeira oportunidade para ganharem o seu quinhão de Poder, ainda antes de o legitimarem com o exercício de uma qualquer responsabilidade clara e assumida. Caso dramático nesta perspectiva do perigoso vazio - e que, pelo andamento inexpugnável da coisa, se constitui como um exemplo do que é, de facto, um "bloco central de interesses" - é o Plano Nacional de Barragens. Porventura capaz de, em meia dúzia de anos, estropiar irreversivelmente paisagem e populações preciosas, mas já de si vulneráveis na sua condição de gente periférica de um país insular, o Plano tem um mérito sinistro no fenómeno comunicacional em que se disfarçou. Seguindo inusitadamente o caminho ínvio do estímulo ao equívoco e à indiferença (cultivado pelos "snobs" reaccionários das elites incultas dos centros de poder), Eduardo Souto Moura foi convidado para "desenhar" a barragem do Tua. Entrou a matar, o Pritzker, mas com argumentos que cairiam à primeira pergunta bem colocada. Em declarações melífluas, Souto Moura alega não perceber os ambientalistas, pois o Património Mundial do Douro também foi, ao longo dos anos, intervencionado pela mão do homem - facto edificado na "obra" dos socalcos que desenham aquela paisagem. Uma declaração sinistra porque ambígua, que se desmonta em dois pontos:
- Não são nem o Arquitecto, nem os ambientalistas, nem a EDP que importa ouvir como ponto de partida; são as populações. As posições extremadas a que assistimos por parte de diversos grupos cívicos - e que Souto Moura deslealmente evoca para consagrar a supostamente inatacável posição do seu cliente - são já de si um resultado germinado na absoluta impotência representativa do poder local, enfraquecido por se ter de substituir a um Estado que nele se marimbou, mas de que abusa quando precisa da defesa contra os mais elementares atentados à dignidade (falo de doença, frio e fome).
- A intervenção "humana" a que Souto Moura tão diligentemente se refere foi - como ele sabe melhor que eu - burilada ao longo de séculos, na procura de um equilíbrio entre a exploração dos recursos e a sua sustentabilidade, assunto sobre o qual ainda não se ouviu uma palavra à EDP, o cliente de Souto Moura. Qualquer semelhança entre esta artesania histórica e as toneladas de betão a que o Pritzker achou que tinha de dar forma, é pura coincidência; não estamos a falar de estádios para jogar à bola.
Mais uma vez, sobre política energética e seus rácios custo-benefício, zero. Venha à obra, de preferência por nomes consagrados que qualquer saloio tomará depressa por incontestáveis; e tu, "povo", piu.
Tenho-me penitenciado, no meu espírito burguês de autocrítica, sobre se estas crónicas deveriam ou não centrar-se mais nos "problemas" do que nas "soluções"; francamente, não sei o que isso significa, porque nunca aprendi nada com "as soluções" senão a enfiar a cabeça na areia para não ter de ver "os problemas". Acredito na civilidade do nosso sistema para que organicamente consiga sugerir caminhos, desde que prevaleçam o debate e a decência; e quanto mais relevados forem os problemas, maiores hipóteses haverá de que surjam verdadeiras e honestas soluções. Para além desta fé ingénua e insular, resta-me esperar, a montante, que a narrativa da conquista e manutenção incondicional da independência e integridade territorial portuguesas vão ganhando relevo no ensino da História de Portugal, ganhando o merecido equilíbrio com o da evocação sistemática dos Descobrimentos (que também se pode fazer em Holandês, ou em Inglês ou em Castelhano). Já chega de vã glória; queremos ser esclarecidos, não persuadidos.
Assuntos nevrálgicos como o funcionamento das Oposições, ou do seus poderes enquanto forças políticas de representação popular, estão afastados de qualquer lógica minimamente responsável, para gáudio dos selvagens que espreitam a primeira oportunidade para ganharem o seu quinhão de Poder, ainda antes de o legitimarem com o exercício de uma qualquer responsabilidade clara e assumida. Caso dramático nesta perspectiva do perigoso vazio - e que, pelo andamento inexpugnável da coisa, se constitui como um exemplo do que é, de facto, um "bloco central de interesses" - é o Plano Nacional de Barragens. Porventura capaz de, em meia dúzia de anos, estropiar irreversivelmente paisagem e populações preciosas, mas já de si vulneráveis na sua condição de gente periférica de um país insular, o Plano tem um mérito sinistro no fenómeno comunicacional em que se disfarçou. Seguindo inusitadamente o caminho ínvio do estímulo ao equívoco e à indiferença (cultivado pelos "snobs" reaccionários das elites incultas dos centros de poder), Eduardo Souto Moura foi convidado para "desenhar" a barragem do Tua. Entrou a matar, o Pritzker, mas com argumentos que cairiam à primeira pergunta bem colocada. Em declarações melífluas, Souto Moura alega não perceber os ambientalistas, pois o Património Mundial do Douro também foi, ao longo dos anos, intervencionado pela mão do homem - facto edificado na "obra" dos socalcos que desenham aquela paisagem. Uma declaração sinistra porque ambígua, que se desmonta em dois pontos:
- Não são nem o Arquitecto, nem os ambientalistas, nem a EDP que importa ouvir como ponto de partida; são as populações. As posições extremadas a que assistimos por parte de diversos grupos cívicos - e que Souto Moura deslealmente evoca para consagrar a supostamente inatacável posição do seu cliente - são já de si um resultado germinado na absoluta impotência representativa do poder local, enfraquecido por se ter de substituir a um Estado que nele se marimbou, mas de que abusa quando precisa da defesa contra os mais elementares atentados à dignidade (falo de doença, frio e fome).
- A intervenção "humana" a que Souto Moura tão diligentemente se refere foi - como ele sabe melhor que eu - burilada ao longo de séculos, na procura de um equilíbrio entre a exploração dos recursos e a sua sustentabilidade, assunto sobre o qual ainda não se ouviu uma palavra à EDP, o cliente de Souto Moura. Qualquer semelhança entre esta artesania histórica e as toneladas de betão a que o Pritzker achou que tinha de dar forma, é pura coincidência; não estamos a falar de estádios para jogar à bola.
Tenho-me penitenciado, no meu espírito burguês de autocrítica, sobre se estas crónicas deveriam ou não centrar-se mais nos "problemas" do que nas "soluções"; francamente, não sei o que isso significa, porque nunca aprendi nada com "as soluções" senão a enfiar a cabeça na areia para não ter de ver "os problemas". Acredito na civilidade do nosso sistema para que organicamente consiga sugerir caminhos, desde que prevaleçam o debate e a decência; e quanto mais relevados forem os problemas, maiores hipóteses haverá de que surjam verdadeiras e honestas soluções. Para além desta fé ingénua e insular, resta-me esperar, a montante, que a narrativa da conquista e manutenção incondicional da independência e integridade territorial portuguesas vão ganhando relevo no ensino da História de Portugal, ganhando o merecido equilíbrio com o da evocação sistemática dos Descobrimentos (que também se pode fazer em Holandês, ou em Inglês ou em Castelhano). Já chega de vã glória; queremos ser esclarecidos, não persuadidos.