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14 de Junho de 2004 às 13:59

Financiar a Saúde

O futuro, e não demorará muito a chegar, trará, certamente, modificações substanciais ao actual modelo, que parece estar esgotado. ...

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O Estado Português tem assegurado, no decurso das últimas décadas, o financiamento dos diversos serviços de saúde prestados à população. Referimo-nos concretamente a grande parte do dispêndio em consultas médicas em estabelecimentos de saúde públicos, exames complementares de diagnóstico e medicamentos, entre outros eventualmente menos «visíveis».

No caso de Portugal somos mesmo o país que mais gasta, em proporção do PIB, relativamente aos outros países da União Europeia (UE).

Com a entrada, no pelotão dos quinze, de mais dez novos países, a questão da protecção social, e mais especificamente da assistência na doença, coloca-se com particular acutilância. É que, de facto, não só o investimento na Saúde e em infraestruturas, são áreas prioritárias de investimento, por parte da UE, como igualmente os novos membros são aqueles que apresentam os piores indicadores de saúde, como sejam por ex. a esperança média de vida, a prevalência de doenças do foro oncológico e de doenças cardiovasculares e os respectivos factores de risco, nomeadamente inactividade física, tabagismo e consumo de alcool.

A adicionar a estes elementos refira-se também que o nível de investimentos, destes países recém admitidos na UE, em saúde são significativamente inferiores aos da média dos quinze, já que representam 4,5% do PIB, contra 8,5%.

Os desafios para os próximos tempos parecem pois ser, além de se garantir os valores universais que têm norteado os sistemas de saúde não só em Portugal como na maioria dos países europeus, nomeadamente equidade, universalidade e tendencial gratuitidade, assegurar igualmente a qualidade, uma resposta rápida e a gestão eficiente dos recursos limitados que existem à disposição dos governos. A juntar a este aspecto refira-se, com particular ênfase, a existência de um desafio ainda maior, já que com a entrada de países com populações menos saudáveis e com pior assistência sanitária proporcionada pelos respectivos sistemas de saúde, a maior movimentação de pessoas entre estados membros pode criar distorções muito acentuadas no campo da prestação e consequentemente limitar o controlo de custos e o planeamento efectuados nos países mais bem dimensionados. Significaria dizer que os sistemas mais eficientes seriam sobrecarregados na procura dos seus serviços de saúde por novos «vizinhos», sem terem possibilidade de descartar-se dessa prestação, com o consequente aumento da sua despesa pública em saúde.

Outro assunto cada vez mais na «ordem do dia», tem a ver com a própria «arquitectura» dos sistemas de saúde.

Assim, o Estado assume, actualmente, para com os utentes, três tipos de relacionamento:

- O modelo público integrado, em que o Estado é simultaneamente financiador e prestador de cuidados, como acontece maioritariamente em Portugal.

- O modelo de contrato público, em que o o Estado contratualiza com fornecedores de cuidados de saúde privados.

- O modelo fornecedor / seguro privado, em que o Estado determina a existência de seguros de saúde para a prestação de cuidados aos cidadãos, abrindo grandemente à iniciativa privada a concretização dos mesmos, e assegurando a entidade estatal a cobertura aos mais carenciados ou a todos aqueles que o queiram mediante, habitualmente, o desconto directo no salário mensal do cidadão.

O que nestes diferentes modelos não deixa de ser curioso é que os países que dispôem, maioritariamente, do modelo integrado são simultaneamente aqueles que mais insatisfeitos os utentes se revelam. Estão neste caso países como a Grécia (79% de insatisfação) Portugal (74%) e Itália (72%).

No futuro o Estado Português, bem como outros ao nível da UE, deverão continuar a assumir uma intervenção financiadora, mas tendencialmente menos prestadora já que existe hoje novos enquadramentos jurídico-legais que possibilitam uma maior intervenção de empresas privadas ou entidades sociais, do tipo misericórdias.

De uma forma ou de outra o cidadão terá, forçosamente, de pagar para ter mais Saúde, sendo que no caso de modelos de intervenção estatal mais pronunciada começa a existir um dilema difícil de resolver. Quem paga impostos não se sente satisfeito com os serviços prestados pelo Estado e progressivamente a carga fiscal tem aumentado, já que a evasão fiscal no nosso país assume proporções escandalosas.

Dai muitos pensarem que seria melhor cada um escolher e pagar o sistema que melhor o serve, reservando-se o Estado para acudir a situações de evidente dificuldade de acesso de utentes a esses mesmos serviços.

O futuro, e não demorará muito a chegar, trará, certamente, modificações substanciais ao actual modelo, que parece estar esgotado.

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