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Maria Teresa Goulão 23 de Maio de 2005 às 13:59

Da necessidade de ar fresco

O «choque tecnológico» para não vir a ser mais dinheiro atirado sobre os problemas, e não se revelar apenas mais como um capítulo do nosso desencontro com o desenvolvimento, implica medidas de choque contra o Estado.

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Hoje nos sectores da energia e do ambiente surgem novos instrumentos de mercado. Entram no léxico dos negócios, novas designações: certificados verdes, certificados brancos, fundos financeiros de carbono, comércio de emissões, implementação conjunta, mecanismo de desenvolvimento limpo, certificados de redução de emissões, títulos de direitos de emissão e licenças transaccionáveis para resíduos urbanos.

Nomes quase desconhecidos em Portugal e que têm a ver com dois paradigmas: a energia como motor de desenvolvimento de novos negócios e o ambiente como sector em crescimento e com oportunidades emergentes verdadeiramente empresariáveis.

Estes instrumentos funcionam em mercados maduros, regulados e com concorrência.

Olhemos para algumas realidades:

O valor global dos mercados de emissões – incluindo a transacção de licenças e de créditos gerados através de projectos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e Implementação Conjunta – poderá atingir 34 biliões de euros em 2010, num cenário de referência. Cerca de 4,5 biliões de toneladas de dióxido de carbono serão transaccionadas.

Foram criados, no ano passado, 21 fundos dedicados de carbono, que representam 1600 milhões de euros. Em 2003, existiam 12 fundos que somavam em conjunto 700 milhões de euros;

Em Abril deste ano, a Espanha investiu em três Fundos de Carbono do Banco Mundial com mais de 68 milhões de dólares. Tinha já assumido, no final de 2004, a criação do Fundo Espanhol de Carbono, garantindo assim a compra de 34 milhões de toneladas de CO2, procedentes de projectos que beneficiem o ambiente e transfiram tecnologia limpa para países em vias de desenvolvimento.

O mercado de direitos de emissão de GEE em Portugal está avaliado em 660 milhões de euros, em 2008. À escala da União Europeia (UE), o valor adiantado é de 26 mil milhões de euros, cerca de 20 por cento do PIB.

O mercado mundial de bens e serviços ambientais foi estimado em mais de 500 000 milhões de euros em 2003 – comparável com os valores das indústrias aeroespacial e farmacêutica – e continua a crescer cerca de 5% por ano.

O Reino Unido lançou o Landfill Allowances Trading Scheme, o primeiro esquema, a nível mundial, de licenças transaccionáveis para resíduos urbanos, para cumprimento da Directiva Aterros. Foram criadas «licenças de deposição» que vão ser transaccionáveis em bolsa e ser objecto de banking e borrowing.

O UBS Investment Bank lançou um programa destinado a integrar critérios ambientais e de sustentabilidade na sua avaliação global de riscos e oportunidades de investimento, aumentando o conhecimento sobre uma nova geração de riscos de investimento, aumentando a sua capacidade para identificar, analisar e gerir ricos ambientais e sociais.

No meio deste cenário de novos mecanismos de mercado, Portugal é uma jangada de pedra no meio do oceano, profissionalizando-se em serviços financeiros e na «bulimia imobiliária» que em anos atrás construía 1 milhão de novos fogos por ano. Estamos cercados pelo Estado. Os empresários reclamam mais mercado, mas em surdina organizam-se para conquistar negócios com a sua ajuda e teia de interesses. São quase sempre os mesmos nos negócios velhos e nos poucos novos que surgem. Odeiam-se mas em bloco defendem-se. Mudam os governos, mas o puzzle, passado um mês está (re)montado. Nas operações financeiras e nos negócios aparecem novas caras, mas as velhas, essas estão lá, na sombra, tecendo o seu novelo.

Aqueles novos mecanismos de mercado são uma combinação de inovação, transparência e empreendedorismo. Ar fresco.

Não tenhamos ilusões, o «choque tecnológico» para não vir a ser mais dinheiro atirado sobre os problemas, e não se revelar apenas mais como um capítulo do nosso desencontro com o desenvolvimento, implica medidas de choque contra o Estado. A muitos níveis: na governação das empresas, na avaliação dos resultados do sector empresarial do Estado, na obrigação do registo dos interesses das organização não governamentais, no reforço dos reguladores (CMVM nos produtos e serviços do mercado de carbono), a ERSE no mercado da energia e o IRAR no mercado do ambiente, na revisão da lei das finanças locais e em novos quadros de contratação pública. Precisamos de um Estado pessoa de bem e de uma missão pública nos serviços do Estado.

Uma palavra para o excelente artigo de Luís Nazaré, do passado dia 19, neste jornal, «na mouche».

Também para o lançamento do mestrado de políticas públicas e administração da Universidade Nova. Ar fresco.

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