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Maria Teresa Goulão 18 de Abril de 2005 às 13:59

As tarefas de Golias do próximo PSD

«As perigosas tentações que espreitavam de todos os lados, para apanhar de surpresa o crente desprevenido, atacavam-no com redobrada violência nos dias de festas solenes». Declínio e Queda do Império Romano, Edward Gibbon

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No PSD parece que ainda pouco aprenderam com a lição dada pelas eleições de Fevereiro passado.

O mundo mudou e a política também. O que não acompanhou esta mudança é a forma de fazer política e os novos ideais que esta tem que revelar aos portugueses.

Sabemos que esta é uma tarefa de Golias: mudar um partido que durante décadas se encostou ao facilitismo do poder, se habituou às mordomias dos corredores da influência, que fez um novelo de teias entre partido e Estado, que colocou a sociedade civil nas catacumbas e que só se importou com ela em épocas eleitorais.

O PSD promoveu e alimentou a confusão entre partido e Estado, Administração Central e Local. Gerou uma imensa teia de cumplicidades entre governo e parlamento, sector empresarial do Estado, empregos públicos locais e outros patamares onde surgia o poder, o poderzinho, o favor, a cunha e a comissão.

Ao que ao nosso sistema viciado em corporativismos oportunos e atávicos ajudou, nunca contestando, antes introduzindo-se, capciosamente no próprio interior do partido e do governo, nas estruturas locais, para que vingassem de forma mais fácil os poderosos interesses das classes corporativas.

A «J» feita de uma tribo ignara e sedenta de poder, que subiu ao governo e ao parlamento à conta de lugares conquistados nos festins dos congressos palacianos, ajudou à festa da diminuição da qualidade dos agentes políticos. O poder foi exercido por séquitos unicamente pelo próprio poder, pela vaidade e lisonja, sem competência técnica, alicerçado numa lógica partidária e de eleição em concelhias e distritais, escola de muitos (não de todos, diga-se), políticos actuais do PSD.

Essa diminuição da qualidade dos seus agentes políticos e a sua imensa impreparação política para uma situação sem precedentes onde esquerda está no poder em maioria absoluta, vai ser uma factura muito cara a pagar nos próximos tempos para o PSD.

Deste congresso falou-se de regressos messiânicos, de líderes vindos da estrutura partidária, com a inflamação dos discursos com os aforismos de sempre. De novo, só quase se falou sempre de líderes. No congresso, o PSD de novo a olhar para o seu umbigo.

Onde está a viragem que tem que ser dada? Perceber que o eleitorado jovem foge do PSD e não se revê neste partido, entender a erosão do eleitorado rural e do que vive nas cidades. Curioso é que sabendo que 39% da população portuguesa vive em 55% do território nacional que em 2015, 68% dos portugueses viverá em aglomerados com mais de 1 milhão de habitantes, o congresso não tenha reflectido sobre o que esse movimento sobre cidade traz para o PSD e que implicações e que novas respostas exige.

Como é que o PSD vai conquistar esse eleitorado que tem aspirações diferentes e que tem baixas expectativas quanto ao PSD? Quais são os novos ideários? Que resposta tem para eleitorados diferentes? Portugal não é um país de esquerda. O que mudou então? Que alternativa tem o PSD a este Governo? Como irá ele fazer uma oposição activa, credível e permanente e ao mesmo tempo mostrando a Portugal que tem um programa próprio e que não segue fielmente a agenda da esquerda. Tarefa de Golias para um partido que nunca se viu neste registo: fazer uma boa oposição e ao mesmo tempo construir alternativas de políticas, que não sejam erráticas nem demagógicas.

Como é que o PSD vai fazer para que os portugueses vivam melhor. Qual ao modelo que quer para o Estado? Como vai sair do cerco da esquerda? O eleitorado que irá votar em 2009, data da 1º eleição após este ciclo eleitoral que acaba nas presidenciais, tem agora 14 anos. Como é que o PSD vai agir neste mundo pós Google?

Estas deviam ser as respostas que deviam ter inquietado o congresso e o PSD.

Há uma nova geração que não tem memória do 25 de Abril. Já nasceram em democracia e que querem coisas novas dos partidos. Os blogs, que surgem 70 por dia em Portugal, mostram que há gente que reflecte sobre a política. Mas que não cola ao que é hoje o programa do PSD, um programa acantonado por temas tradicionais. O PSD para mudar, tem que integrar os novos tempos, as novas pobrezas que nos são revelados por estudos da Saúde e da Segurança Social, a exclusão social, a cidade, a desertificação do mundo rural, as novas causas que o mundo hoje não cessa de nos mostrar.

Usa-se muito a expressão ruptura. O PSD precisa de uma nova governação. Mas é isso mesmo, o PSD para voltar ao poder tem que fazer a ruptura de dentro para fora, ir buscar novas pessoas, apresentar respostas novas aos desafios contemporâneos e emergentes da sociedade, fazer emergir uma nova classe política preparada e formada fora do contexto das redes tradicionais, que também elas assentes em interesses olham com ambição o exercício da política, promover a reforma do sistema política sem a qual Portugal está refém de um modelo datado e nada eficiente.

Há que perceber que o BE ganhou eleitorado porque fez política a uma escala que os grandes partidos, o PSD não entende. As pessoas não querem já grandes causas, a política não cola a grandes combates. A política tem que ser feita numa escala mais reduzida: na escola, no bairro, no quarteirão, na net, onde estão as pessoas que têm expectativas e inquietações locais; o ambiente, o desordenamento urbanístico, a segurança. Tornaram-se pequenas grandes causas. A política é uma missão para as pessoas. È nisso que os portugueses estão descrentes em relação ao PSD. Entendem que o PSD se serve da política e que não os serve a eles. Nada há mais perigoso que esta distância e este desacreditar no exercício da política: só promove radicalismos e anomias.

O PSD só pode crescer na procura da diferença de políticas e no confronto de novas causas, desapegado de consensos que por nunca terem sido objecto de contestação, são dado como bons. Um trabalho de Golias.

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