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Continuar uma política económica adequada

Se daqui a dois anos chegarmos à conclusão que a maior parte do que acima expus foi continuado e cumprido, não tenho dúvidas de que, ainda que os resultados não sejam, nessa altura, sentidos na sua plenitude, teremos dado passos gigantescos para nos aprox

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Finalmente, e porque o meu objectivo não é explicitar exaustivamente toda a linha de acção que deve ser prosseguida na área económica, farei apenas duas referências a áreas que, por razões diversas, considero fundamentais:

«A reforma do mercado de arrendamento, que se encontra adiada há décadas. A não existência de legislação adequada em termos de arrendamento tem privilegiado a compra de habitação própria, o que se reflectiu na progressiva perda de relevância do arrendamento no mercado total de habitação: em 1981, representava cerca de 40% do total do mercado de habitação, tendo passado para próximo de 21% em 2001, o que compara com um valor médio de aproximadamente 35% nos outros países da UE-15. No entanto, o valor de Portugal resulta da agregação de «dois mercados» de arrendamento: o que resulta do congelamento de rendas (cerca de 13% do mercado de habitação total) e o mercado de renda livre (sensivelmente 8% do total), o que agrava ainda mais a situação (na verdade, os 8% constituem quase o verdadeiro mercado de arrendamento, uma vez que a perpetuidade dos contratos de arrendamento anteriores a 1990 os transforma numa verdadeira posse de habitação). Assim, recursos que poderiam ter sido canalizados para outras áreas, acabaram por ser dirigidos para o sector da habitação residencial - e, como se sabe, o investimento em construção de habitação é o menos reprodutivo que existe: o recente relatório «Portugal: 2010» revela que o sector da construção residencial apresenta o maior diferencial de produtividade relativamente às melhores práticas internacionais (um gap total de 64% abaixo, contra uma média de todos os sectores nacionais de 48%). Desta forma, a actividade não é dinamizada nas suas mais variadas vertentes, e não são criadas as condições de desenvolvimento sustentado que outros países têm experimentado. E Portugal é o país da UE-15 que maior percentagem, quer do investimento em construção, quer do investimento total, quer do PIB, canaliza para a habitação residencial: 45.7%, 31.5% e 8.1% respectivamente, contra uma média da UE-15 de 22.6%, 10.3% e 2% (dados de 2001). E, para além de construirmos demasiado, conservamos pouco aquilo que construímos: de facto, o peso da reparação de habitação no investimento é de pouco mais de 4% em Portugal, o que compara com uma média de cerca de 17% na UE-15, o que talvez ajude a explicar o facto de cerca de 15% do parque habitacional nacional se encontrar degradado e a necessitar de obras. Mas para além de ser ineficiente, como se viu, o facto de a política habitacional nacional ter sido esmagadoramente dirigida, nos últimos largos anos, para o incentivo à compra de habitação, em detrimento do fomento do mercado do arrendamento, também contribuiu para que o nível de endividamento dos agentes tivesse atingido os valores actuais (o endividamento das famílias portuguesas representa, hoje, mais de 110% do rendimento disponível, que compara com menos de 20% no início dos anos 90), o que também restringe quer o consumo, quer o investimento mais reprodutivo. Elevou a que a mobilidade geográfica dos cidadãos tivesse ficado bastante limitada, precisamente pelo facto de essa mobilidade depender da compra de habitação - que, uma vez adquirida, não é passível de deslocalização se, por exemplo, surgir uma oferta de emprego atractiva noutra região. Ou seja, jogou a favor da imobilidade, quando era a flexibilidade que se devia incentivar. Por tudo isto, adiar por mais tempo uma reforma que dinamize efectivamente o mercado de arrendamento não é, do meu ponto de vista, tolerável.

«Implementar no mais breve espaço de tempo possível a reforma da segurança social apresentada ainda em 2002, de acordo com as linhas aconselhadas pelo Banco Mundial, que criou três pilares contributivos e que consagra a participação de entidades privadas no sistema de pensões. Trata-se de uma reforma muito importante no sentido de ajudar a garantir a solvabilidade sustentada do sistema de segurança social mas que, do meu ponto de vista, e dadas as tendências demográficas correntes, se poderá revelar insuficiente para alcançar tal desiderato. Assim, julgo ser necessário começar a pensar na melhor forma de introduzir na realidade portuguesa duas «receitas» que o próprio FMI já preconizou:

(1) o aumento da idade da reforma, acompanhando o aumento da esperança média de vida; de acordo com o FMI, progressivamente, num prazo de 30 anos, poder-se-á passar da actual idade de 65 anos para 69 anos;

(2) a tributação das pensões de reforma como se de rendimentos do trabalho se tratasse. Portugal é um dos poucos países da UE-15 que tributa parcialmente as suas pensões de reforma (os outros são a Alemanha, a Itália e o Reino Unido).

É evidente que se trata de duas medidas claramente impopulares mas quando a opção é entre garantir (ou pelo menos ajudar a garantir) a solvabilidade sustentada do sistema de pensões ou pura e simplesmente caminharmos para uma situação de ruptura em que, num prazo não muito distante (pode não ultrapassar algumas dezenas de anos), o pagamento de pensões de reforma não está assegurado, julgo ser claro que toda a população entenderá as medidas que forem tomadas. Ao mesmo tempo deve ser assegurada a continuação da convergência das pensões mínimas de invalidez e velhice do regime geral para, até 2006, um valor entre 65% e 100% do salário mínimo nacional líquido da taxa social única, tendo em conta a duração das carreiras profissionais; bem como o aumento, até 2006, do valor das pensões sociais para 50% do salário, mínimo nacional líquido; e a subida das pensões agrícolas, de forma a atingirem, até 2006, 60% do mesmo indexante (o que irá perfazer um número total de 1.510.000 pensionistas abrangidos).

Estou certo que outras áreas poderiam igualmente ter sido abordadas; a opção por estas tem a ver, obviamente, com a minha área de formação - mas também porque as considero fundamentais do ponto de vista da eficiência, da competitividade, do desenvolvimento económico sustentado e da subida do nível de vida da população, e também da justiça social.

Se daqui a dois anos chegarmos à conclusão que a maior parte do que acima expus (e que faz parte do Programa de Governo apresentado à Assembleia da República em Abril de 2002) foi continuado e cumprido, não tenho dúvidas de que, ainda que os resultados não sejam, nessa altura, sentidos na sua plenitude, teremos dado passos gigantescos para nos aproximarmos do pelotão da frente da Europa. Não tenho nenhuma razão para duvidar que tal não venha a acontecer.

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