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12 de Maio de 2008 às 13:59

As parcerias público-privadas na Saúde: a (in)experiência portuguesa

O recurso ao mecanismo de parceria público-privada (PPP) surgiu, a nível europeu, no início dos anos 90 e em sectores de actividade que exigiam ao operador tradicional, o Estado, avultados investimentos públicos. Se a opção pelas PPP encontra uma forte fu

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Se a opção pelas PPP encontra uma forte fundamentação na teoria microeconómica, pelos potenciais ganhos de eficiência, também não se pode omitir o papel determinante que a consolidação das finanças públicas desempenhou na expansão observada nos últimos anos. A Saúde tem sido, a seguir aos Transportes, o sector privilegiado de avanço das parcerias em diversos países, após a iniciativa pioneira do Reino Unido.

O que se pode afirmar, de forma inequívoca, sobre as experiências internacionais? Em primeiro lugar, o modelo aplicado ao subsector hospitalar é uma variante do designado DBFO (Design, Build, Finance and Operate), na medida em que os serviços clínicos são excluídos do contrato, por duas razões essenciais: dificuldade de uma correcta mensurabilidade daqueles e vantagem, para os utentes, da não partilha do risco da procura. Segundo, existem ganhos efectivos em termos de cumprimento de prazo e de controlo do custo relativos à construção hospitalar.

Tudo isto era, ou deveria ser, conhecido em Portugal quando se publicou em 2002 o primeiro diploma que introduziu o conceito de PPP na Saúde. Não obstante, a opção foi a inclusão da prestação de serviços clínicos nos contratos de gestão para os 10 novos hospitais.

O Programa do XVII Governo identificava como objectivo a “revisão do modelo” das PPP, “sem prejuízo de compromisso contratual, assegurando a transparência e o interesse público nos processos já em curso”. Estes referiam-se, à época, à aprovação do programa de procedimentos e caderno de encargos dos futuros hospitais de Cascais (2004) e de Braga (Janeiro de 2005). Não foi clarificado o sentido da revisão nem identificada a natureza do compromisso contratual. Seguiu-se idêntica tramitação para os novos hospitais de V. F. de Xira (final de 2005) e de Loures (2007).

Cinco anos após o primeiro diploma legislativo, as PPP continuavam envolvidas num processo pouco transparente para a opinião pública e contribuintes e inexplicavelmente moroso.

Na proposta de Orçamento de Estado para 2008, o Governo manteve a defesa das PPP tendo em vista a esperada “melhoria na qualidade dos serviços prestados e na redução dos custos associados” (p.171 do Relatório); esclarecia ainda estar previsto para o início do corrente ano o primeiro contrato de parceria (Cascais), encontrando-se os outros três hospitais apenas em fase de negociação final.

Já em 2008, o Governo decide que os serviços clínicos devem ser excluídos dos contratos de gestão, mas, informa, apenas para os seis novos hospitais da segunda vaga. Talvez para fortalecer a nova opção, anuncia a não prorrogação do contrato de gestão com o único grupo económico a gerir um hospital do SNS. Tudo isto, afirma, em nome do interesse público.

À luz da experiência internacional, a decisão pela exclusão dos serviços clínicos é correcta, mas deveria, em nome do tal interesse público, ter sido tomada no seu devido tempo e aplicada a todos os contratos em parceria.

Se, afinal, o Estado é o melhor garante da prestação de cuidados clínicos, em termos de acesso e qualidade, o que explica que este processo se tenha prolongado por três anos? E, como explicar aos utentes dos quatro novos hospitais que a produção privada ficará aquém do desejado? Haverá alguma relação entre estes hospitais e igual número de grupos privados? Perguntas sem resposta.

Será o Estado, por via dos sucessivos governos, capaz de garantir que a tomada de decisão, em todos os domínios, é sempre fundamentada e em defesa do interesse público?

Podemos estar certos de que o Estado assegura, em matéria de PPP, a melhor partilha de riscos, uma avaliação de resultados e um adequado sistema de penalizações por incumprimento do parceiro privado?

As respostas são, infelizmente, negativas para os utentes e contribuintes.

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