Opinião
A crise e a independência nacional
Quando o ministro da Finanças do Governo que acaba de se demitir nos vem dizer
Quando o ministro da Finanças do Governo que acaba de se demitir nos vem dizer - cito com base numa notícia do Jornal de Negócios de 28/2 - que "uma das grandes lições da actual crise é que não há prosperidade sustentável assente no endividamento", o meu espanto deriva somente do facto de o economista Fernando Teixeira dos Santos ter tardado tanto tempo a chegar a esta conclusão. E conclui o ainda ministro: "Por isso temos de reduzir o nosso consumo público e privado para níveis que sejam consistentes com os nossos níveis de produção de riqueza. O futuro exige mais produção, mais produtividade, mais eficiência do nosso sistema produtivo".
Começa, porém, a ser evidente que Portugal não vai produzir, no futuro, riqueza suficiente para pagar a dívida, porque destruiu o seu sistema produtivo e acreditou no dinheiro fácil. A sua economia não é auto-suficiente, existindo uma enorme dependência do exterior, a qual se tornou crítica no plano energético e alimentar. Temos, por isso, que arrepiar caminho. Essa é a grande conclusão que ressalta, como novidade, das palavras do ministro Teixeira dos Santos, mas que os "mercados" já há muito perceberam.
O sector energético, sector-chave de qualquer economia, é deficitário. Infelizmente o louvável esforço que foi e está a ser feito nas energias renováveis será insuficiente. Portugal vai ter de continuar a comprar carvão para as centrais térmicas, gás natural para cozinhar e aquecer as casas e para as centrais de ciclo combinado, e petróleo para alimentar as refinarias de gasóleo e gasolina. O preço destas matérias-primas aumenta continuamente, e continuará a aumentar no futuro.
O turismo, sector fortemente empregador, foi um daqueles em que mais se investiu e apostou, e onde mais expectativas se criaram. Porém a crise actual, que afecta os países geradores de fluxos turísticos, e as consequências do preço dos combustíveis nas transportadoras aéreas vão agravar os problemas do sector.
O sector de serviços de tecnologia/conhecimento, pela reconhecida capacidade dos nossos técnicos e empreendedores, é um sector onde Portugal poderia ter um importante papel. Mas numa economia deprimida, a nossa massa cinzenta tenderá a procurar emprego noutras paragens. E o investimento feito na educação acabará por ser aproveitado por outros.
O sector primário da agricultura e das pescas está de rastos. Os campos estão abandonados e improdutivos, e a frota pesqueira desmantelada. Vamos ter que voltar a olhar para este sector, se quisermos reduzir a nossa dependência externa e alimentar as pessoas.
Muitas das empresas produtoras de bens transaccionáveis fecharam ou foram deslocalizadas. No curto prazo e numa economia aberta e global, não se vislumbra a forma de enfrentar a concorrência da China e de outros países com custos de produção mais reduzidos.
A construção civil, muito suportada pelas Obras Públicas, é um sector gerador de emprego. Mas, numa primeira fase, acaba por pesar no agravamento do déficit e não vai produzir riqueza no futuro.
"Reduzir o nosso consumo público e privado para níveis que sejam consistentes com os nossos níveis de produção de riqueza", como diz Teixeira dos Santos, exigirá a aplicação duma receita muito violenta! Vistas bem as coisas, existem dois caminhos para Portugal, que se resumem a um dilema: ou a diluição na Europa e a sujeição às suas leis, com a sequente perda progressiva de independência; ou o caminho da bancarrota e da pobreza.
A perda de independência traduzir-se-á na redução do peso do estado e da Administração Pública, na aceitação das regras comunitárias para a política de reformas da saúde, da educação e da legislação laboral. Obrigará a uma mudança de regras na justiça, e a uma eficaz penalização da corrupção. As forças armadas, na sua concepção e no seu papel de garantir a independência do país, deixarão de ter sentido e desaparecerão. Na prática, Portugal passará a ter o estatuto de região com alguma autonomia, com uma língua própria, mas sem expressão significativa na cena internacional. Será inevitável uma revisão da Constituição, e muitos verão nisso uma humilhação nacional.
Neste caso, a nossa sorte andará ligada à sorte da Europa, ela própria incerta. Mas a alternativa é a pobreza, se não for antes o caos. Por ser tão má, será que tal hipótese é uma alternativa?
Presidente do Grupo Marktest
Membro da ASPO-Portugal
Assina esta coluna mensalmente à segunda-feira
Começa, porém, a ser evidente que Portugal não vai produzir, no futuro, riqueza suficiente para pagar a dívida, porque destruiu o seu sistema produtivo e acreditou no dinheiro fácil. A sua economia não é auto-suficiente, existindo uma enorme dependência do exterior, a qual se tornou crítica no plano energético e alimentar. Temos, por isso, que arrepiar caminho. Essa é a grande conclusão que ressalta, como novidade, das palavras do ministro Teixeira dos Santos, mas que os "mercados" já há muito perceberam.
O turismo, sector fortemente empregador, foi um daqueles em que mais se investiu e apostou, e onde mais expectativas se criaram. Porém a crise actual, que afecta os países geradores de fluxos turísticos, e as consequências do preço dos combustíveis nas transportadoras aéreas vão agravar os problemas do sector.
O sector de serviços de tecnologia/conhecimento, pela reconhecida capacidade dos nossos técnicos e empreendedores, é um sector onde Portugal poderia ter um importante papel. Mas numa economia deprimida, a nossa massa cinzenta tenderá a procurar emprego noutras paragens. E o investimento feito na educação acabará por ser aproveitado por outros.
O sector primário da agricultura e das pescas está de rastos. Os campos estão abandonados e improdutivos, e a frota pesqueira desmantelada. Vamos ter que voltar a olhar para este sector, se quisermos reduzir a nossa dependência externa e alimentar as pessoas.
Muitas das empresas produtoras de bens transaccionáveis fecharam ou foram deslocalizadas. No curto prazo e numa economia aberta e global, não se vislumbra a forma de enfrentar a concorrência da China e de outros países com custos de produção mais reduzidos.
A construção civil, muito suportada pelas Obras Públicas, é um sector gerador de emprego. Mas, numa primeira fase, acaba por pesar no agravamento do déficit e não vai produzir riqueza no futuro.
"Reduzir o nosso consumo público e privado para níveis que sejam consistentes com os nossos níveis de produção de riqueza", como diz Teixeira dos Santos, exigirá a aplicação duma receita muito violenta! Vistas bem as coisas, existem dois caminhos para Portugal, que se resumem a um dilema: ou a diluição na Europa e a sujeição às suas leis, com a sequente perda progressiva de independência; ou o caminho da bancarrota e da pobreza.
A perda de independência traduzir-se-á na redução do peso do estado e da Administração Pública, na aceitação das regras comunitárias para a política de reformas da saúde, da educação e da legislação laboral. Obrigará a uma mudança de regras na justiça, e a uma eficaz penalização da corrupção. As forças armadas, na sua concepção e no seu papel de garantir a independência do país, deixarão de ter sentido e desaparecerão. Na prática, Portugal passará a ter o estatuto de região com alguma autonomia, com uma língua própria, mas sem expressão significativa na cena internacional. Será inevitável uma revisão da Constituição, e muitos verão nisso uma humilhação nacional.
Neste caso, a nossa sorte andará ligada à sorte da Europa, ela própria incerta. Mas a alternativa é a pobreza, se não for antes o caos. Por ser tão má, será que tal hipótese é uma alternativa?
Presidente do Grupo Marktest
Membro da ASPO-Portugal
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