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21 de Setembro de 2012 às 00:45

A esquina do Rio

Tenho para mim que muitos dos nossos queridos políticos, de todos os partidos, reconheça-se, acordam frequentemente irritados pela existência de cidadãos, de opiniões, até do próprio mecanismo do regime que os ocupa e faz viver.

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Mundo

Tenho para mim que muitos dos nossos queridos políticos, de todos os partidos, reconheça-se, acordam frequentemente irritados pela existência de cidadãos, de opiniões, até do próprio mecanismo do regime que os ocupa e faz viver. Parece-me que existem dias em que acham uma grande maçada terem de se confrontar com pessoas, em vez de andarem por uma reserva protegida onde se vêem ao espelho e estão apenas rodeados por outros escolhidos, semelhantes a si próprios. Prefeririam, talvez, um mundo perfeito onde pudessem fazer tudo sem serem contrariados, onde realizassem as experiências que querem sem protestos. Estou certo que ficam muito aborrecidos por terem que dizer mentiras nas campanhas eleitorais, imagino que entrem em depressão por sistematicamente dizerem aldrabices para conseguirem votos. E todos os dias, desde há anos, vejo as suas caras arrependidas e sofridas por estarem a fazer as coisas ao contrário do que haviam prometido, argumentando sempre que a realidade era pior do que imaginavam. Vivemos há décadas nesta alternância de protagonistas da aldrabice, de gente que nunca é responsabilizada pelo que faz, pelos efeitos das decisões que toma. Como vimos ainda esta semana eles próprios reconhecem que, no Governo, encomendam estudos que se revelam erros clamorosos e, com base nesses estudos, fazem contratos que delapidam milhões, como em várias parcerias público-privadas. A seguir, fazem um acto de contrição - e basta. Com um pouco de sorte encontram colocação no estrangeiro porque definitivamente não têm paciência para aturar a ingratidão dos locais. Vivemos nisto há tempo demais. Talvez por tudo isto, o PSD cai nas sondagens, mas o PS não sobe.

Semanada

O número de casais em que os dois cônjuges estão desempregados duplicou em relação ao ano passado; várias autarquias começaram a cortar apoios a infantários; A Polícia Judiciária resolveu contratar ex-espiões envolvidos no ano passado no escândalo das secretas; dívidas do Estado a fornecedores sobem 84% para mais de 330 milhões; a Câmara de Cascais pagou subsídios mediante facturas falsas apresentadas por um juiz que dirige uma associação de coleccionadores de armas; a economia paralela já chega a 24,5% do PIB; erros de cálculo na expectativa de tráfego da PPP estabelecida com a Fertagus, no tempo de João Cravinho, provocaram pagamentos suplementares do Estado de 45 milhões de euros - o que praticamente fez duplicar os custos a suportar pelo erário público - e Cravinho acha a coisa normal; o título adequa-se que nem uma luva à situação que vivemos - "Balas & Bolinhos- O Último Capítulo", é o nome do filme mais visto nos cinemas portugueses na última semana - uma produção nacional que vai com 80 mil espectadores.

Moeda

Quanto vale de facto um euro em Portugal, depois de deduzidos todos os impostos aplicáveis - os profissionais, as taxas e impostos municipais, as alcavalas de empresas públicas, o IVA, tudo o que metodicamente vai ao bolso dos cidadãos? Para todos nós um euro, feitas as deduções, em termos reais, vale sempre menos que 50 cêntimos. E mesmo assim o Estado quer sempre, em nome do euro e da sua mãe Europa, espremer mais um bocadinho o pouco que já nos cabe. Só vejo medidas para encolher, não vejo decisões que façam crescer. Recentemente voltámos a conquistar mercados, em sectores tradicionais, pela qualidade e pelo cumprimento de prazos, mesmo com preços superiores a outros fornecedores, como a China ou a Índia. O crescimento das exportações nos últimos anos tem que ver com a capacidade de produzir diferente e melhor que a concorrência, e já se viu que os mercados percebem que a qualidade tem um preço - o mesmo preço que, noutra escala, se paga pelo design italiano ou os automóveis alemães. O que nos faz falta é uma estratégia de crescimento económico - em vez de experiências que produzem um ciclo de empobrecimento. O que precisamos é de valor acrescentado, não é de valor diminuído. Eu estou para ver como esta crise política acaba - no fim disto tudo ainda nos arriscamos a levar com mais uma imaginativa nova carga fiscal em cima e há-de haver uns pândegos que nos quererão convencer que tudo foi resultado de uma explosão de cidadania. Por este andar não precisamos de um Seguro no Governo, mas de um seguro contra as malfeitorias governamentais. Tinha ficado bem à Comissão Política do PSD reconhecer esta semana que a crise política teve uma origem chamada TSU, criada por Passos & Gaspar, em vez de sacudir a água do capote.

Ver

Duas exposições imperdíveis de fotografia. A primeira está no

BES Arte, ao devastado Marquês do Pombal, onde Paulo Nozolino mostra Usura, uma exposição comissariada por Sérgio Mah, que reúne fotografias realizadas de 1999 para cá, apresentadas como trípticos. A segunda está no espaço Vera Cortês Art Agency, na Avenida 24 de Julho 54-1.º-Esq, e mostra "Utz", de Daniel Blaufuks, uma incursão pela evolução da imagem fotográfica.

Ouvir

Saiu um livro novo de Bob Dylan. Leram bem e não me enganei. Tem a forma de um disco, parece um disco, tem canções, mas conta histórias. Belíssimas histórias. É uma deliciosa colectânea de contos. Chama-se "Tempest", um nome que naturalmente tem que ver com os tempos que vivemos - embora a canção-título conte ao longo de 14 minutos o naufrágio do Titanic. Trata-se do 35.º disco de estúdio de Dylan, que aos 71 anos continua a manter-se fiel musicalmente aos blues e à country, ao mesmo tempo que continua a surpreender em canções como "Scarlet Town", "Early Roman Kings", "Tin Angel" ou "Roll On John", uma evocação decente de John Lennon.

Folhear

Se tem iPad pode fazer o download gratuito da boa edição digital da revista "Intelligent Life", publicada bimestralmente pelo grupo "The Economist". À medida que o tempo passa e o foco editorial se aperfeiçoa, a "Intelligent Life" está cada vez melhor, a abordar temas invulgares, a partir de uma perspectiva inesperada. A capa desta edição é dedicada a Sergei Polunin, e lá dentro conta-se como uma das estrelas em ascensão no Royal Ballet de Londres decidiu, de repente, aos 22 anos, deixar a carreira. O filme "Tabu", do português Miguel Gomes, tem honras de destaque na secção de cinema, e a aventura de David Byrne com Annie "St. Vincent" Clark é a escolha da música. Nos livros, o destaque é para o novo Tom Wolfe, "Back To Blood". A secção dedicada à comida e a vinhos continua deliciosa (falando de chili com carne) e um pouco à frente existe um artigo divertidíssimo sobre a tendência actual de fazer parecer as casas com quartos de hotel. Em resumo: uma bela noite na companhia do iPad.

Provar

Se são assumidamente carnívoros abriu em Lisboa um restaurante perfeito. Chama-se "Carne Alentejana" e pertence à marca homónima de produtos elaborados a partir de bovinos criados no Alentejo. Dizem-me que há dias em que se encontra essa especialidade que é rabo de boi, mas eu não tive essa sorte. A lista é extensa em carnes diversas e eu deliciei-me com um belíssimo e abundante naco de alcatra, que pode vir acompanhado de migas, batatas fritas domésticas, legumes grelhados ou salada. O couvert tem um belíssimo e escuro pão alentejano, saboroso e denso, umas azeitonas bem temperadas e azeite obviamente alentejano, como tudo o resto que ali se serve - até o vinho, claro, neste caso o honestíssimo Enjeitado.

O único problema da sala é a acústica - bem lhe podiam colocar umas cortiças alentejanas, que ficava de certeza melhor.

O serviço é bom, a carne é fantástica e o preço é razoável.

Rua da Beneficência 229, telefone 218 237 126.

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