Opinião
Economia partilhada em serviços financeiros: por onde começar?
A digitalização assume um factor preponderante na descentralização das relações comerciais e na disrupção dos modelos de negócio assentes em canais convencionais - serviços financeiros.
Numa realidade de constante evolução tecnológica, o fenómeno da economia partilhada é um crescendo através, principalmente, do conceito de serviços "peer-to-peer" ("P2P") cada vez mais presente em algumas indústrias como expoente máximo da intermediação digital em transacções efectuadas (e.g. casos de sucesso incluem plataformas como a Airbnb ou a Uber).
A realidade em serviços financeiros
Na indústria de serviços financeiros, o conceito de serviços "P2P" começa a ganhar destaque através da criação de plataformas online e soluções inovadoras por empresas que não as tradicionais instituições de serviços financeiros. Esses serviços incidem sobre actividades-chave para clientes privados e empresas, nomeadamente em soluções de: pagamentos (e.g. Paypal, Venom); crédito (e.g. Lendingclub, Crofun) ou "risk underwriting" (e.g. Friendsurance, Inspeer).
A relevância destes serviços é, ainda, marginal quando comparada com os serviços tradicionais prestados pelas instituições financeiras. As novas empresas e plataformas que agora emergem têm dificuldades em se afirmar como substitutos às operações tradicionais neste sector, sobretudo pela percepção menos transparente do serviço que fornecem e de um maior perfil de risco inerente à falta de regulação destas operações. Não obstante, o seu crescimento no sector é de extrema importância para clientes e instituições tradicionais.
O crescimento da utilização de serviços "P2P" desafia o modelo de negócios das instituições tradicionais de serviços financeiros. Na visão da Roland Berger, a introdução de soluções "P2P" neste sector pode ser feita através de duas formas:
a) Crescimento de "players" com soluções puramente "P2P", actuando como serviços complementares aqueles fornecidos por instituições tradicionais - soluções a serem direccionadas a clientes com um perfil de risco mais elevado e um perfil tecnológico mais evoluído;
b) Evolução do modelo de negócio dos "players" tradicionais integrando soluções "P2P" na sua proposta de valor, beneficiando de um ecossistema existente de clientes e soluções integradas - soluções com maior segurança para os clientes, maior nível de transparência e regulação de serviços.
Evolução do modelo de negócio dos "players" tradicionais - uma solução "win-win"
A evolução dos modelos de negócio tradicionais são uma solução "win-win" para clientes e instituições financeiras, através da criação e desenvolvimento de novas soluções para clientes com um perfil mais sofisticado. Em diversos mercados europeus estes serviços "P2P" são uma realidade e comprovam os benefícios para ambas as partes. Nomeadamente:
• Clientes: ganham acesso a uma oferta mais abrangente e potencialmente mais vantajosa em que a proposta de valor oferecida é mais adequada às suas necessidades (e.g. plataformas online de "crowdfunding", onde as empresas poderão recorrer a financiamento e investidores privados poderão participar);
• Instituições tradicionais: desenvolvem um modelo de receita associado a estas plataformas e serviços relacionados (e.g. "fees" de transacção nas plataformas, angariação de investidores, classificação de níveis de risco,…).
A evolução do modelo de negócios das instituições tradicionais está assente num conjunto de decisões-chave que as empresas terão de tomar na redefinição da abordagem ao mercado de serviços financeiros. As principais decisões a considerar passam por:
1. Proposta de valor (o que oferecer?): O desenvolvimento e sucesso da implementação de estratégias de serviços "P2P" depende largamente de um de-senvolvimento de proposta de valor em torno das necessidades dos clientes - modelo que os bancos têm tido dificuldade em implementar;
2. Identificação de clientes-alvo (para quem?): o desenvolvimento de soluções inovadoras pretende responder às necessidades de um conjunto de clientes mais sofisticado. Contudo, os actuais modelos de segmentação de clientes utilizados pelos bancos não incorporam variáveis que permitam identificar este conjunto de clientes - a evolução desses modelos é chave para o sucesso no curto prazo de iniciativas de carácter disruptivo;
3. Modelo operacional (como fazer?): as instituições financeiras poderão ter de optar entre o desenvolvimento de uma plataforma própria para oferta de serviços "P2P" ou cooperação com plataformas existentes no mercado, com conceito e funcionamento comprovados. Não obstante, a adopção de um modelo de cooperação deverá garantir às instituições financeiras condições de flexibilidade na introdução de novas soluções, desenvolvimento de diversos produtos e testes em larga escala.