Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
Pedro Santana Lopes - Advogado 30 de Outubro de 2020 às 16:40

As decisões e as contradições

A prudência aconselha que haja um esforço para falar menos quando não se está seguro. E talvez fosse bom, também, acabar com tanta conferência de imprensa. Uma vez por semana será suficiente.

Os tempos que vivemos são pouco propícios a textos que não digam mal de alguém ou de algo.

 

Para "não ficar mal na fotografia" digo, desde já, que também discordo de várias decisões das autoridades de saúde, nomeadamente a deste fim de semana sobre as deslocações entre concelhos. É, de facto, inconstitucional e, em minha opinião, desadequada ao que se pretende evitar. Também eu me espanto, desde o 1º de Maio, passando pela Festa do Avante e indo a outras iniciativas autorizadas, com as contradições de várias permissões, tendo em conta várias proibições.

 

Só que, independentemente do que cada um pense dos decisores políticos na área da saúde, devemos ter presente que foi imprevista e é inédita a situação com que o mundo se depara.

 

Na campanha eleitoral dos EUA em que, obviamente, se discute intensamente a pandemia, o lado Democrata, que se insurge vivamente contra o quase - negacionismo de Donald Trump e de muitos Republicanos, o que preconiza como lema de atuação, caso o seu candidato vença? Seguir o que dizem os cientistas. Mesmo não considerando Donald Trump um negacionista, são conhecidas as suas divergências mesmo com alguns cientistas que trabalham com a Casa Branca. Têm sido frequentes as manifestações de desacordo entre o Presidente americano e o Dr. Anthony Fauci, Presidente do Instituto de Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas. Pode-se dizer que Trump ouve os cientistas mas, muitas vezes, não os segue. Qual dos métodos é o mais adequado, mais sensato, mais eficaz? Seguir ou só ouvir os cientistas? Seguramente que a resposta estará a meio caminho para confirmar, mais uma vez, o ensinamento de que é lá que mora a virtude: ouvir tanto quanto possível, desejavelmente seguir, sempre que haja consenso, a comunidade científica e assumir sempre a autonomia da decisão política.

 

As orientações expostas suscitam logo, por si mesmas, a questão que quero hoje destacar: quais cientistas é que se devem seguir? Os que também exercem funções dirigentes em organismos públicos? Os que têm altas posições nas Universidades ou Centros de Investigação? Só Nacionais? Os de organizações internacionais? Tem-se criticado muito o Ministério da Saúde por oscilar nas suas posições e nas diretivas que emana como, por exemplo, quanto ao uso de máscara. É muito confuso sem dúvida e, em minha opinião, o uso obrigatório já devia ter sido imposto há muito mais tempo. Mas não ouviram opiniões diferentes também da parte de destacados cientistas ouvidos pela Comunicação Social? Qual deles terá razão neste e noutros assuntos colocados pela pandemia?

 

Lembro-me de Carlos Moedas contar publicamente as dificuldades que teve, enquanto Comissário com a área da Investigação, para sensibilizar entidades e conseguir apoios para trabalho urgente de pesquisa na prevenção de pandemias como esta. Quase ninguém queria saber e andava tudo entretido com outras matérias. Constatamos agora que a comunidade mundial de cientistas ainda não tem explicação para muitos factos que vamos conhecendo todos os dias, relacionados com a propagação, ou não, do vírus. Por exemplo, ninguém consegue explicar as razões de não haver contágio entre pessoas que moram na mesma casa, muitas vezes marido e mulher, e também os Filhos. Pessoas que dormem juntas e em que um está positivo e o outro sempre negativo. Pais e filhos que estão na mesma casa, em que o isolamento total, com crianças pequenas, é muito difícil, em que um dos pais ou um dos filhos acusa positivo e nenhum dos outros familiares coabitantes é contagiado.

 

Sabemos como os investigadores procuram, com toda a entrega, essas explicações e, principalmente, a cura. Só que, pelos vistos, sabendo-se já mais do que há meio ano, há muito ainda por descobrir. Por isso, quando oiço algumas contradições na Direção-Geral da Saúde, dou comigo a pensar: se nem os cientistas sabem... Só que há decisões que são eminentemente políticas, como algumas ligadas a partidos e autorizações, nuns casos, e proibições noutras, na área desportiva.

 

A prudência aconselha que haja um esforço para falar menos quando não se está seguro. E talvez fosse bom, também, acabar com tanta conferência de imprensa. Uma vez por semana será suficiente.

 

Como viram, não falei de preconceitos ideológicos. É que nem quero sequer admitir que possam existir numa situação como esta. O SNS tem feito muito, mas o setor social e o setor privado são essenciais para este árduo combate ter sucesso e para as pessoas que precisam de cuidados de saúde, seja qual for a causa, serem bem tratados e tratados a tempo e horas.

 

Os tempos que vivemos são tempos de união para a resposta ser mais forte. Seja o Governo que for, este ou outro - nunca se sabe - só pode ser assim.

 

PS - Que curiosa, a situação nos Açores... Há tantos provérbios que se aplicam.

 

Advogado

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio