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28 de Agosto de 2022 às 21:30

UNITA venceu politicamente eleições angolanas

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre as eleições em Angola, os desafios do Governo agora que António Costa regressa de férias e o balanço dos seis meses de guerra na Ucrânia, entre outros temas.

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ELEIÇÕES EM ANGOLA

 

  1. Comecemos pela polémica em torno dos resultados eleitorais:
  • Convém não dramatizar: a polémica era previsível, a posição da UNITA é legítima, mas esta querela não vai originar qualquer guerra civil como sucedeu em 1992. Nem provavelmente grandes reações de rua.
  • Os últimos sinais são de apaziguamento. A Comissão Nacional de Eleições (CNE) já sinalizou que os resultados definitivos podem ser algo diferentes dos provisórios. E hoje a UNITA já só falou de correção de mandatos, não tanto de vitória eleitoral.
  • Em qualquer caso, o Presidente João Lourenço deve ser o primeiro interessado em clarificar todas as suspeições. Governar sob suspeita é um desastre.

 

  1. Quanto aos resultados indicados pela CNE, constata-se que há dois vencedores. O MPLA, que venceu eleitoralmente. A UNITA, que venceu politicamente.
  • O MPLA tem uma vitória eleitoral com um certo sabor a derrota política. Claro que ganhou as eleições, e teve maioria absoluta. Mas baixou fortemente de votação em relação a 2017; teve uma derrota histórica em Luanda; está a perder apoio de eleição para eleição; e já percebeu que o próximo passo é provavelmente perder o poder.
  • A UNITA teve uma derrota eleitoral com um certo sabor a vitória política. Perdeu na contagem dos votos, mas subiu imenso de votação. Mostrou ter líderes bem preparados. Mobilizou o país, em especial os jovens. E sobretudo ganhou o estatuto de alternativa credível.

 

  1. A situação futura é muito complexa. Politicamente o País está dividido ao meio. Economicamente está estagnado. Socialmente é um barril de pólvora.
  • Angola precisava de um Governo de Unidade Nacional, entre MPLA, UNITA e independentes. Para ganhar força internamente e reforçar credibilidade internacional. Para recuperar a economia. Provavelmente não é solução viável. Mas seria uma boa experiência.
  • Na democracia eleitoral, Angola precisa de corrigir falhas que não são normais em democracia: a discriminação dos partidos da oposição no acesso á comunicação social pública. Democracia requer eleições livres e justas.

  

 

PRIMEIRO-MINISTRO REGRESSA DE FÉRIAS

 

  1. António Costa regressa de férias amanhã. Vai ter um trabalho árduo pela frente. O PS está a baixar nas sondagens e o primeiro-ministro, pela primeira vez, com mais opiniões negativas que positivas. Não admira. Só nos últimos dois meses houve demasiadas polémicas altamente desgastantes: a crise com Pedro Nuno Santos sobre o Aeroporto; o caos nas urgências, com Marta Temido; a contratação de Sérgio Figueiredo, com Fernando Medina; as barbaridades da ministra da Agricultura; as declarações infelizes de duas governantes sobre incêndios.

 

  1. Nada disto era expectável à partida. Mas não é assim tão surpreendente.
  2. Primeiro: a fadiga da governação. Hoje é muito mais difícil governar do que era há 10, 15 ou 20 anos. O escrutínio é maior e o desgaste chega muito mais depressa. António Costa já leva quase sete anos de PM. Ora, 7 anos hoje correspondem a 9 ou 10 do passado. O desgaste é natural e inevitável.
  3. Segundo, a falta de resultados. Ao fim de 7 anos, é preciso ter resultados a apresentar. Não chega ter habilidade política. O caso da Saúde é emblemático. Durante anos a habilidade e a retorica disfarçaram a inação e as falhas. Agora, não é possível disfarçar o caos e a desorganização. E a saúde é dos sectores que mais desgasta o governo.
  4. Finalmente, a perda de autoridade. Este é um governo unipessoal. Está muito dependente do primeiro-ministro. Ora, o primeiro-ministro já não tem a autoridade que tinha.
  • Basta ver as críticas que, em privado, lhe fazem vários socialistas (no penúltimo Expresso, acusam-no de "incapacidade reformista"; de "falta de agenda governativa"; de chefiar um "Governo de segundas linhas"). Até parece a oposição a falar. Mas são declarações de figuras socialistas ouvidas pelo Expresso. O "brilho" do primeiro-ministro já não é o que era.

  

PRÓXIMOS DESAFIOS DO GOVERNO

 

  1. O grande desafio político é o da iniciativa política. O Governo está parado, sem iniciativa em várias questões essenciais. Na saúde, na educação, nos impostos, na justiça. Tudo se resume ao PPR, como se fosse um D. Sebastião. Isto não é normal num governo de maioria. De uma maioria exige-se mais ambição e mais energia. E já passaram 5 meses. Há uma parte dos Ministros que o país nem conhece. Parecem clandestinos. Até em questões instrumentais está tudo atrasado. Exemplo: o novo aeroporto de Lisboa. Já houve reunião entre o primeiro-ministro e o líder do PSD. Ao que sei, António Costa também já resolveu que não será o LNEC a fazer a Avaliação Ambiental Estratégica. Então o que falta para avançar?  

 

  1. O grande desafio económico é o OE para 2023. Há caminhos óbvios, opções mais difíceis e um meio termo. Caminhos óbvios: vai haver uma forte redução do défice e da dívida. Bom para o país. Opções difíceis são, sobretudo, duas: a subida dos salários, por causa da inflação e a reforma fiscal. Meio termo são as pensões de reforma: terão em 2023 uma forte actualização por força da lei. Mas julgo ser muito provável que uma parte seja antecipadamente paga ainda este ano por força da folga orçamental, e a outra parte em 2023.

 

  1. O grande desafio social é a aprovação dos novos apoios sociais às famílias mais afectadas pelo custo de vida. O Governo prometeu-os para setembro. E vão ocorrer na primeira quinzena. A verdade, porém, é que este programa já vem atrasado. O governo anda a correr atrás do prejuízo. O primeiro plano visava compensar as famílias por uma inflação da ordem dos 4%. Hoje já vamos em mais do dobro e ainda não há novas compensações sociais. Este atraso não é justo. Ainda por cima porque o Estado tem os cofres cheios!

 

  1. O Governo antecipou esta semana uma decisão importante em matéria de tarifas do gás. A medida teve dois méritos: foi uma resposta rápida às decisões da EDP e da GALP; e permitiu que, no imediato, as pessoas tenham uma "saída" para o pesadelo dos aumentos.

Mesmo assim, há dúvidas que o Governo devia esclarecer:

  • No País da burocracia, como se consegue em tão pouco tempo transferir 1,2 milhões de consumidores de um operador para outro?
  • O que sucede quando o operador regulado também tiver de comprar gás a este preço "louco"?
  • Não havia alternativas melhores? Baixar o IVA? Alargar a tarifa social? Criar um vale social?

 

6 MESES DE GUERRA

 

  1. Estes seis meses evidenciam politicamente uma derrota da Rússia. Não aconteceu a guerra rápida que Putin pensava; a resistência ucraniana superou todas as expectativas; a unidade do Ocidente surpreendeu toda a gente; militarmente a Rússia mostrou ser um gigante com pés de barro; e Zelensky foi a grande surpresa, ao demonstrar uma capacidade de liderança invulgar. Seis meses depois, Putin não tem qualquer motivo para festejar.

 

  1. O futuro joga-se nos próximos seis meses e o desafio essencial é fácil de sumariar: está nas mãos do Ocidente decidir o futuro da guerra.
    • Militarmente, esta é a guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Politicamente, é a guerra entre a Rússia e o Ocidente (EUA e Europa).
    • Se o Ocidente não quebrar o apoio à Ucrânia, dificilmente Putin consegue ganhar a guerra e obter ganhos eficazes em futuras negociações de paz. Será sempre um derrotado político.
    • Se o Ocidente reduzir ou parar o apoio à Ucrânia, será o desastre: Putin ganhará à Ucrânia; ganhará ao Ocidente; minará a UE e manterá a Europa sob chantagem de novas investidas ou invasões.

 

  1. Acredito que a unidade do Ocidente não vai quebrar. Mas há três riscos fortes:
    • Primeiro: o cansaço europeu face ao Inverno e ao frio. A Rússia aposta na falta de gás para mudar o estado de espírito dos Europeus.
    • Segundo: a fadiga europeia face á inflação e á carestia de vida A Rússia acredita que os políticos vão ceder para não perderem apoio popular.
    • Terceiro: mudanças políticas no Ocidente. Os maiores riscos são as eleições em Itália e sobretudo as legislativas nos EUA. Se os democratas perdem, o poder de Biden para apoiar a Ucrânia pode diminuir.

 

 

O ESTADO DA INTERNET EM PORTUGAL

 

  1. O Eurostat divulgou nas últimas semanas alguns dados sobre a Internet que são de alguma forma surpreendentes para Portugal. Uns pela positiva, outros nem tanto. Como estamos na era do digital, vale a pena conhecer e reflectir.

 

  1. Assim:
  • Empresas que mais utilizam inteligência artificial (2021). Aqui está a primeira grande surpresa. Portugal está num prestigiante 2º lugar na UE. Somos um dos países em que mais se recorre à IA. A seguir à Dinamarca e muito acima da média da UE. Os sectores em Portugal que mais recorrem a IA são: a informação, a comunicação, os serviços, a indústria e energia. E os que menos a usam, são os sectores do imobiliário e construção.
  • Cobertura por internet de alta velocidade (2021). Também aqui estamos bastante bem. Em 7º lugar no ranking europeu. Bem acima da média da UE, o que mostra que tem havido um grande esforço em matéria de investimento em infraestrutura nesta área.
  • Utilização de internet em casa (2021). Aqui já a realidade nacional não é tão positiva. Se em matéria infraestrutural estamos bem, em matéria da sua utilização estamos pior. Portugal tem um grau de utilização da internet de 87%, ligeiramente abaixo da média europeia (92%).
  • Uso da internet na interacção com serviços públicos. Aqui a nossa realidade fica bem aquém das expectativas europeias. Somos dos países da UE que menos usam a internet para interagir com a Administração Pública. A média europeia é de 58%. Portugal está nos últimos lugares do ranking europeu (49%). Os hábitos levam tempo a mudar.
  • Consumo de notícias através da internet (online). Outro dado curioso. Cerca de 81% dos portugueses (dos 16 aos 74 anos) consomem notícias através da internet. Ou seja, por via online. É certo que 15 outros países da UE usam este meio digital mais dos que nós, portugueses. Mas novamente aqui, estamos bem acima da média da UE.
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