Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
10 de Dezembro de 2023 às 21:35

O leilão de promessas quase pornográfico

No seu habitual espaço de opinião na SIC, o comentador Luís Marques Mendes fala sobre o clima de campanha que já se assiste, das conclusões sobre o novo aeroporto de Lisboa e da polémica com as gémeas brasileiras que envolve o Presidente da República.

  • ...

PISA – QUEDA BRUTAL

 

  1. Portugal teve esta semana a pior notícia em matéria de educação desde 2006: o desempenho dos alunos portugueses de 15 anos, avaliados no PISA/2022 é uma desilusão. Houve quedas brutais a Matemática, Leitura e Ciências. Como dizem os especialistas, é como se, em termos de aprendizagens, os alunos de 15 anos, em 2022 tivessem menos um ano letivo que os seus colegas de 2018.

 

  1. A pandemia é a grande causa deste insucesso. Todos os países caíram no ranking. Mas há também causas nacionais. A prova é que Portugal caiu mais do que a generalidade dos países da OCDE.

 

  • Matemática: a queda média da OCDE é de 15 pontos face a 2018. Em Portugal, a queda é de 21 pontos.
  • Leitura: a queda média da OCDE é de 10 pontos face a 2018. Em Portugal, a queda é de 15 pontos.
  • Ciências: a queda média da OCDE é de 2 pontos face a 2018. Em Portugal, a queda é de 7 pontos.

 

  1. É preciso perceber bem a razão pela qual tudo isto sucede:
  • A queda dos indicadores de Portugal não começou na pandemia. Já vem de trás. Vem do PISA/2018; do TIMSS2019 (Matemática e Ciência); e vem do PIRLS de 2021 (Leitura).
  • A degradação da escola explica muita coisa. A falta de professores, as qualificações inadequadas de professores, a falta de apoio extra aos alunos.
  • O facilitismo no ensino, traduzido em várias medidas, designadamente a abolição de alguns exames, agrava a situação.
  • Aqui está um problema sério para o próximo governo enfrentar.

 

A CAMBALHOTA DO MINISTRO

 

  1. Perceber os sinais do PISA e começar a mudar as políticas erradas tem de ser a primeira grande prioridade do próximo governo. Mas desse futuro governo já não pode fazer parte o atual ministro. Mesmo que o PS ganhe as eleições. Ele perdeu esta semana toda a credibilidade para governar.
  • Durante 2 anos andou a dizer que era impossível recuperar na íntegra o tempo de congelamento da carreira dos professores. Que era uma despesa permanente, impossível de suportar. Por isso, tivemos um ano inteiro de greves e degradação das escolas.
  • Esta semana, acompanhando as posições de Pedro Nuno Santos, veio dar o dito pelo não dito: afinal já é a favor da recuperação integral do tempo de serviço dos professores. Uma cambalhota inacreditável.

 

  1. Isto é a política do vale tudo. Sem coerência e sem um pingo de vergonha.
  • Sem coerência. A coerência deste ministro é agradar ao chefe. Antes, o chefe era o primeiro-ministro. Agora, o seu novo chefe é Pedro Nuno Santos. Como os seus chefes têm opiniões diferentes, ele adapta-se. É o vale tudo.
  • Sem pingo de vergonha. Um ministro assim não tem convicções. Ou, se tem, troca-as por conveniências. A sua grande conveniência é agradar ao poder. É assim que se degrada a credibilidade dos políticos.

  

NOVO AEROPORTO

 

  1. O relatório da Comissão Técnica Independente (CTI) parece-me previsível, com um grande mérito e algumas fragilidades.
  • Um relatório previsível. Manter transitoriamente o Aeroporto da Portela não tem novidade. Apontar como solução previsível Alcochete também não. Era a tendência dos estudos anteriores e da maior parte dos membros da Comissão.
  • Um relatório cheio de mérito. Este relatório acelerou a decisão sobre o novo aeroporto. A partir de agora, o próximo governo não tem desculpas para não decidir. E, se não tomar uma decisão em dois meses, será politicamente crucificado.
  • Um relatório com algumas fragilidades. Primeiro, não há um cronograma para as acessibilidades ao novo aeroporto. Uma fragilidade. Segundo, falta saber quanto custa a nova ponte sobre o Tejo e quem a paga. Outra fragilidade. Terceiro, do investimento total de 8 mil milhões de euros, estimado para o novo aeroporto, donde vem o dinheiro? Do Estado, dos Fundos Europeus, das taxas aeroportuárias? E em que proporção? Nova fragilidade. Ouvindo a presidente da CTI a falar de um aeroporto que se paga a si próprio, parece-me ver, com tanto facilitismo, José Sócrates a falar dos 10 estádios de futebol para o Euro 2004. Era tudo financeiramente fácil e barato. No final, foi o que se viu.

 

  1. Finalmente, uma previsão: ou me engano muito ou o aeroporto da Portela não vai ser uma solução transitória. Vamos ter um aeroporto novo, complementar da Portela, sem dúvida. Mas a Portela vai manter-se durante décadas e décadas. A Portela é uma mais-valia para Lisboa e nenhum governo no futuro vai ter coragem de acabar com esse aeroporto. A solução dual não vai ser temporária. Vai ser definitiva.

 

AS GÉMEAS LUSO-BRASILEIRAS

 

  1. Comecemos pela questão do tratamento a estas duas crianças. Há duas perguntas essenciais. As regras clínicas foram observadas ou não? Houve ou não alguém que foi "mais papista que o Papa" e que violou as regras clínicas para agradar ao poder? A resposta a estas duas questões é essencial para se perceber se houve um tratamento de favor. É urgente esclarecer. No entretanto, há uma falha incompreensível: o silêncio do ex-diretor clínico do Santa Maria. Ele já devia ter dado uma explicação pública. É o único que sabe tudo e que conhece tudo. O seu silêncio é incompreensível.

 

  1. A seguir, a intervenção do PR: houve ou não uma cunha? Acho que houve cunha da parte do filho do PR. Acho que não houve cunha da parte do PR.
  • O filho do PR teve um comportamento inaceitável. Tentou meter uma cunha ao pai. Sendo filho do PR, devia ter-se abstido de qualquer intervenção. Não podia nem devia comprometer a imagem do PR.
  • O PR não meteu qualquer cunha. Essa pode não ser a perceção pública. Mas é a realidade. Claro que Marcelo podia ter arquivado o caso. Para evitar más interpretações. E, se voltasse atrás, eu acho que o teria feito. Mesmo assim, não arquivando, não meteu qualquer cunha: tratou o filho como qualquer cidadão, enviando a documentação para o PM, como faz em todos os casos. Milhares de casos. Nem mais, nem menos.
  • Meter uma cunha é fazer um pedido. Ora Marcelo não fez qualquer pedido. Nem ao primeiro-ministro. Nem ao Ministério da Saúde. Nem ao Hospital. Quem o fez foi o filho. Ora, da mesma forma que nenhum filho pode ser responsabilizado pelos comportamentos incorretos de um pai, também um pai, mesmo PR, não pode ser responsabilizado pelos comportamentos imprudentes de um filho adulto e com vida própria.

 

  1. Terceiro, a dimensão política. Mesmo não havendo cunha do PR, a perceção pública da situação desgasta-o e fragiliza-o. É óbvio e evidente. Apesar de tudo isto ser muito injusto para Marcelo. As suas maiores qualidades pessoais são a generosidade e a integridade. Marcelo adora ajudar os outros, sobretudo os mais fracos. E é uma pessoa absolutamente impoluta: incapaz de fretes, favores, amiguismos e compadrios. A política, às vezes, é injusta.

 

  1. Finalmente, as crianças. Investigar tudo, faz sentido. Mas é preciso também um minino de atenção às crianças beneficiadas com este tratamento. É que já são algumas dezenas. E não apenas estas duas.

 

  

AS ELEIÇÕES: NO PAÍS E NO PS

 

  1. A campanha para as eleições de 10 de março está a transformar-se num leilão de promessas quase pornográfico. É ver quem dá mais e promete mais. É nos impostos; é nas prestações sociais; é no tempo de serviço dos professores. Isto é grave porque pode comprometer as contas do Estado.
  • É preciso pôr cobro a este abuso, seja em relação ao PS ou ao PSD. Primeiro, o país deve exigir que, por cada promessa feita, os partidos expliquem quanto custa e como se paga. Segundo, os jornalistas devem ser implacáveis a exigir estas explicações. Terceiro, a UTAO devia, perante cada promessa, fazer as contas e divulgá-las publicamente.

 

  1. Da campanha interna no PS, que termina esta semana, há conclusões a tirar:
  • A primeira é que esta campanha beneficiou o PS. Deu uma boa imagem do partido. Uma imagem de mobilização e participação.
  • A segunda é que fica a perceção de que Pedro Nuno Santos começou com larga vantagem, continua com vantagem, mas viu diminuir a sua vantagem inicial.
  • A terceira é que José Luís Carneiro surpreendeu. Pela coragem da candidatura. Pelas intervenções que fez. Pelo número de apoios que alcançou. E em matéria de apoios ainda podem surgir nesta semana final de campanha alguns apoios surpreendentes. Fora da caixa.

 

  1. Finalmente, os Açores. Como não há duas sem três, além das eleições legislativas de março e das Europeias em junho, também vamos ter eleições antecipadas nos Açores. Já no início de fevereiro.

 

 

 

O FUTURO DE COSTA

 

  1. António Costa foi exonerado esta semana pelo PR. No fim da próxima semana deixará de ser líder do PS. E em abril sairá em definitivo de S. Bento. O que vai fazer António Costa, a seguir? Quais são os seus objetivos?

 

  1. Eu julgo que ele tem dois grandes objetivos imediatos:
  • Primeiro, António Costa quer ajudar o PS a ganhar as eleições de 10 de março. Seja quem for o líder eleito do PS, ele tem todo o interesse na vitória. E não é apenas por ser militante do PS e primeiro-ministro. É que, se o PS perder as eleições, os socialistas vão culpar António Costa pela derrota: foi ele que se demitiu; foi ele que abriu uma crise política; foi ele que não se rodeou bem; foi ele que ajudou a "entregar o ouro ao bandido".
  • Depois, em julho, António Costa vai fazer tudo para rumar a Bruxelas e cumprir o grande sonho da sua vida dos últimos anos: ser Presidente do Conselho Europeu. A ambição tornou-se mais difícil por causa do processo judicial em curso. Mas não é impossível. Daí as preocupações dos seus próximos, no sentido de que o processo judicial seja acelerado. A grande razão chama-se Bruxelas.
Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio