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Luís Marques Mendes 19 de Novembro de 2023 às 21:47

Marques Mendes: "No MP não há só magistrados competentes. Também há muita incompetência"

No seu habitual espaço de opinião na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre a operação Influencer, os efeitos da crise na economia, a sucessão no PS e os desafios do PSD, entre outros temas.

EFEITOS DA CRISE NA ECONOMIA

 

O país não parou com a crise. Mas a crise pode ter efeitos na economia. Vejamos:

  1. Primeiro: o que se mantém e o que é adiado. É adiada a privatização da TAP e a escolha do local do novo aeroporto. O concurso para a linha da alta velocidade ainda pode estar em dúvida se transita ou não para o próximo governo. Mas há outras questões que não tiveram qualquer alteração, designadamente: as negociações com os médicos, que devem avançar; e a execução do PRR que não está em situação brilhante.

 

  1. PRR – Para já duas marcas negativas.
  • Primeiro, na filosofia: no ranking dos beneficiários do PRR, os maiores e os principais são entidades públicas. A primeira entidade privada beneficiária surge em 15º lugar. E é uma entidade pouco privada (CEIA). Ou seja: há Estado a mais e empresas a menos.
  • Segundo, na execução: ao fim de mais de um ano, a taxa de execução do PRR é de apenas 18%. Cerca de 20% dos investimentos estão em estado preocupante e 3,5% em estado crítico.

 

  1. IUC – Caiu o aumento do IUC. A boa notícia é que caiu uma medida injusta. A má notícia é que a forma como caiu é o cúmulo do descaramento político. A medida não caiu perante os 400 mil cidadãos que pediram a sua abolição; nem perante as várias manifestações populares. Caiu apenas por causa das eleições. Para o PS não perder votos. Isto é a descredibilização total da política. É o oportunismo político em todo o seu esplendor.

 

  1. Investimento estrangeiro: depois de tudo quanto sucedeu, o País que se prepare para uma retração do investimento estrangeiro. Não há milagres.

 

  1. Finalmente, uma boa notícia. A Moodys subiu o rating de Portugal, apesar da crise. Esta é mesmo uma excelente notícia.

 

INFLUENCER: GOLPE DO MP?

 

  1. Neste processo, há para já, três certezas:
    • A primeira é que o MP teve uma derrota nas medidas de coação. Mas isto é o funcionamento da Justiça. O MP propõe e o Juiz decide. Umas vezes concordando com o MP. Outras vezes, não.
    • A segunda é que, para já, caíram os indícios de corrupção, mas não os de tráfico de influências. O que não é irrelevante. Foi por tráfico de influências que Armando Vara foi condenado a prisão efetiva.
    • A terceira é que o governo se anda a vitimizar. Quer passar a ideia que é vítima da justiça. Não é convicção. É táctica política.

 

  1. Um dos disparates que se insinuam, a favor da vitimização, é que tudo isto foi uma cabala, um golpe e uma perseguição política. Isto é o delírio total.
  • O MP é uma estrutura hierarquizada em que no topo está a PGR. E quem é que escolheu a PGR, a mais alta responsável do MP? António Costa. O PR nomeou-a, mas a escolha foi do PM. Por isso, a pergunta é: então a PGR escolhida pelo PM ia fazer um golpe contra PM? Lucília Gago, escolhida por António Costa, ia perseguir António Costa? Alguém acredita nesta tontaria? Haja bom senso.
  • O que há aqui não é cabala. São erros. Primeiro, são erros políticos. Os erros políticos que levaram á demissão do PM têm a ver com as ligações perigosas de António Costa a amigos e colaboradores altamente promíscuos. Se o PM se tivesse rodeado melhor, seria PM por muito mais tempo. António Costa só pode queixar-se de si próprio.
  • Depois, erros do MP. No MP não há só magistrados competentes. Também há muita incompetência. Não é agenda política. É falta de competência. A começar na PGR, que não tem capacidade de liderança. Como sempre tenho dito. Há cinco anos "correram" com Joana Marques Vidal. Agora é o que se vê. Na justiça os erros pagam-se.

A SUCESSÃO NO PS

 

  1. Estalou o verniz na eleição interna do PS com as violentas declarações que PNS fez hoje contra JLC. A campanha estava morna. Agora vai aquecer. Três ilações:
  • PNS continua a ser claramente o favorito. Tem mais apoio no aparelho do partido. Mas JLC surpreendeu esta semana com vários apoios de peso. Sobretudo senadores do partido. O que significa que esta eleição não é um passeio para PNS.
  • São duas campanhas muito contrastantes. PNS corre pela ala mais de esquerda do partido. Ele é o grande defensor de uma nova geringonça. Mais do que António Costa. JLC representa a ala mais moderada e aposta em mostrar que tem melhor imagem para PM que PNS. Que tem mais peso nos eleitores. E parece que vão surgir sondagens a dizerem isso mesmo e até alguns novos apoios que podem surpreender.
  • Finalmente, PNS esta declaração de PNS é uma arma de dois gumes. Para dentro do partido é mobilizadora. Para fora contraria o esforço que PNS estava a fazer para "moderar" a sua imagem. As declarações de hoje recolocam PNS no seu "habitat" natural – o homem da geringonça, que não quer nada com o centro político.

 

  1. A grande perplexidade deste processo radica em Francisco Assis. Como é que Assis, que sempre foi contra a geringonça, apoia o único candidato à liderança que defende a geringonça e que até pretende reeditá-la? Parece uma contradição. Mas há uma explicação: este é um bom "negócio" para ambos.
  • Bom para PNS, que está preocupado com a sua imagem radical e tenta ganhar uma imagem de moderação. Assis dá-lhe essa caução.
  • Bom para Francisco Assis, que ganha apoio para uma sua ambição legitima: ser candidato a PR. Com António Costa tal ambição era impossível de concretizar. A relação entre Costa e Assis não é brilhante. Agora, com PNS tudo é diferente. Assis pode ser candidato presidencial apoiado pelo PS em 2026, se Pedro Nuno Santos for líder do PS.

 

AS CONTRADIÇÕES DE CENTENO

 

  1. Esta semana, Mário Centeno foi igual ao que costuma ser: um homem competente, mas com uma relação difícil com a verdade. Com muita facilidade, diz uma coisa e o seu contrário. Já foi assim, no passado, com o ex-Presidente da CGD António Domingues. Fez-lhe promessas para ele aceitar o cargo. Depois, confrontado com a pressão, desmentiu as promessas que fez. A verdade com Centeno anda sempre aos trambolhões. Vejamos o último ziguezague:
  • No dia 12 de novembro disse ao FT: "Recebi um convite do PR e do PM para considerar a possibilidade de liderar o governo" Menos de 24 horas depois, no dia 13, desmentiu-se a si próprio, dizendo: "É inequívoco que o PR não me convidou para chefiar o governo".
  • O Governador do Banco de Portugal legitimou a mentira. Disse uma mentira, foi desautorizado pelo PR e desmentiu-se logo a seguir. Sem dar uma explicação para tamanho ziguezague.

 

  1. Centeno não se demite nem vai ser demitido. Mas está duplamente fragilizado. Está fragilizado pelo lado da política: com toda a ambição que tem, colocou-se a jeito para a polémica, quando António Costa o sondou para ser candidato a PM; e está fragilizado pelo lado da supervisão: quando o Governador do BP precisa de ser defendido pelos banqueiros, está tudo dito. O apoio dos banqueiros não lhe dá força. Dá-lhe dependência. Passa a ser o Governador dos banqueiros. E esta não é uma imagem que dê força a ninguém.

 

OS DESAFIOS DO PSD

 

  1. O PSD tem no próximo sábado um momento importante: o seu Congresso. Antes desta crise, seria um Congresso banal e sem história. Depois da crise, ganhou enorme importância. Ou este Congresso é um forte momento de viragem ou vai ser tudo mais difícil no futuro.

 

  1. O PSD anda deslumbrado com a ideia de que a vitória está garantida. Porque não ter António Costa como adversário torna tudo mais fácil; e porque ter como opositor PNS é como lhe tivesse saído o Euromilhões. Tudo isto é verdade. Mas eu gostaria de recordar três realidades perigosas:
  • Primeiro, o PSD pode ganhar as eleições. Mas esta vitória nem está garantida nem são favas contadas. Recordo que há 21 anos, numa crise semelhante, nascida da demissão do PM António Guterres, a vitória do PSD, que parecia muito fácil à partida, aconteceu por uma "unha negra". Ferro Rodrigues esteve quase a ganhar. E não havia o Chega.
  • Segundo, o Chega é o grande risco do PSD. Está muito alto nas sondagens. Em sondagens já divulgadas e outras ainda não divulgadas. Enquanto o PSD fizer o discurso politicamente "descontraído" que anda a fazer, o Chega não baixará. E sem o Chega baixar, o PSD terá muita dificuldade em ganhar.
  • Terceiro, o facto de a IL ter recusado uma coligação eleitoral pode ser um suicídio para a IL mas pode também ser fatal para uma vitória do centro-direita. É bom que o PSD pense em tudo isto antes que seja tarde de mais.

 

ESPANHA, EUA E GUERRA

 

  1. Em Espanha aconteceu esta semana um dos erros mais graves que se podem cometer em política: Pedro Sanchéz, para se manter no poder, "vendeu a alma ao diabo". O negócio que fez com os separatistas espanhóis vai ter, entre outras, três consequências sérias: primeiro, vai gerar uma crise social séria, dividindo a Espanha ao meio; segundo, vai dar uma força nunca vista aos independentistas; terceiro, vai irritar os tribunais, por causa da aplicação da lei da amnistia; pode ser o primeiro passo para quebrar a unidade da Espanha.

A divisão não é apenas entre esquerda e direita. É mesmo dentro da própria esquerda. Até Filipe Gonzalez, histórico socialista e antigo Presidente do Governo de Espanha, alertou para a irresponsabilidade de tudo isto. São más notícias para a Espanha, para a Europa e para Portugal. É preciso não esquecer que a Espanha é o nosso principal parceiro comercial.

 

  1. Uma boa notícia na frente externa foi o encontro nos EUA entre o Presidente Biden e o Presidente Xi Jinping. Uma visita que permite desanuviar o ambiente internacional; que pode impedir que um incidente militar redunde num conflito grave; e que pode evitar uma nova Guerra Fria. Claro que não há conteúdo concreto e palpável deste encontro. Mas há o mais relevante: o diálogo entre os EUA e a China foi reatado. Enquanto durar é um bom sinal de esperança.

 

  1. No Médio Oriente, continua a catástrofe. A operação militar está na fase mais complexa e intensa; e a situação humanitária é dramática. Mas há, ao menos, uma notícia esperançosa: o PM da Qatar anunciou que está iminente um acordo para libertação de reféns e para algumas pausas humanitárias. São sinais positivos que podem permitir evitar uma maior escalada na guerra.
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