Opinião
Marques Mendes: Cabrita sai tarde, "sem honra nem dignidade". Demissão é um "alívio" para Costa
No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre o Natal, a vacinação obrigatória, a saída de Cabrita e as eleições, entre outros temas.
PANDEMIA: MAIS RESTRIÇÕES NO NATAL?
- Já se volta a especular sobre algum confinamento no Natal. Ou novas restrições. Não faz qualquer sentido. Não vai haver qualquer confinamento. Nem 8 nem 80. É preciso serenidade e equilíbrio. Claro que há motivos para atenção e cuidado. Mas não há razões para tanto ruído e histeria.
- Vejamos quatro factos relevantes:
- Primeiro: não há qualquer comparação entre a situação de há um ano e a situação de hoje. Há um ano, a situação era muito mais grave. Hoje, graças à vacinação, a situação é bem melhor. Temos 1/4 de internados e de doentes em UCI em relação à um ano. E temos cerca de 1/3 de óbitos.
- Segundo: Portugal não é comparável com os demais países da Europa. Felizmente, estamos muito melhor. Porquê? Porque a nossa taxa de vacinação é grande. A da generalidade dos nossos parceiros europeus é muito baixa.
- Terceiro: a vacinação com a terceira dose está finalmente a correr bem. Os números são muito positivos: amanhã, 6 de Dezembro, Portugal atinge já o objectivo da vacinação de 1,6 milhões de pessoa, objectivo que estava previsto atingir apenas no dia 19. E as melhorias estão já a notar-se: o número de novos casos na população mais idosa está lentamente a diminuir. Prova de que a terceira dose está a resultar.
- Finalmente, as medidas que entraram em vigor esta semana estão a surtir efeito. Primeiro, o RT está a baixar lentamente; segundo, as pessoas estão a ter mais cuidado, designadamente no uso de máscara; terceiro, muitas autarquias e empresas tomaram decisões de cancelamento de festas de Natal. Não foram obrigadas, mas foram civicamente responsáveis.
Em conclusão: é preciso calma, serenidade e cuidado. Não há necessidade de histeria e ruído.
VACINAS OBRIGATÓRIAS?
- Vacinação: o exemplo português. O nosso caso é um sucesso. Reconhecido até internacionalmente. Ainda estes dias, a Alemanha nomeou para chefiar o seu processo de vacinação um general, o General Breuer, invocando o bom exemplo português. Nós, cá dentro, às vezes duvidamos ou desvalorizamos!
- Vacinação obrigatória: um outro tema em que é preciso distinguir Portugal da Europa e do mundo. Em Portugal, a questão da obrigatoriedade da vacina não se coloca. As vacinas não são obrigatórias e não vão ser obrigatórias. Não há necessidade. A população aderiu em massa à vacinação. Logo, não vale a pena entrar em especulações descabidas. Nem inventar um problema..
- Caso diferente é a situação da Europa e do Mundo. Aqui há um problema sério. Eu, não sendo a favor da obrigatoriedade da vacinação, compreendo que muitos países da Europa e do mundo acabem por decretar a vacinação obrigatória. Não têm alternativa. É que, na maior parte das geografias, a vacinação é muito baixa. E com uma vacinação tão baixa a pandemia não acaba e os serviços de saúde não aguentam. Vejamos:
- A situação no mundo é uma calamidade. Só 44% do mundo inteiro está vacinado (menos de metade); África só tem 7,5% de vacinação completa (aqui por falta de vacinas); mesmo a Europa, a América do Norte e a América do Sul não chegam a 60% de vacinados, apesar de terem vacinas.
- Na Europa, maior que a UE, a situação não é melhor. Há 358 milhões de pessoas não vacinadas. A maioria dos não vacinados está em sete dos maiores países da Europa: Rússia, Polónia, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Espanha. Assim, é difícil fugir à obrigatoriedade das vacinas.
- Vacinação das crianças( 5/11 anos): deve haver, hoje mesmo, recomendação da Comissão Técnica de Vacinação. É algo que devemos ver com naturalidade: uns são a favor; outros não. Devemos respeitar, uns e outros.
A SAÍDA DE EDUARDO CABRITA
- Eduardo Cabrita só sai porque há eleições à porta. Se não houvesse eleições mantinha-se no Governo. O que prova que o PM dá mais importância às eleições que à autoridade do Estado ou à responsabilidade política.
- Manifestamente, o PM é uma pessoa com sorte. Se não fosse a acusação do MP, o PM ia ter de aguentar Eduardo Cabrita até às eleições. O Ministro ia ser o bombo da festa da campanha eleitoral. António Costa ia sofrer com este activo tóxico. Com a acusação do MP saiu-lhe a sorte grande. Foi o pretexto que o PM teve para "empurrar" o Ministro para fora do Governo. Um alivio.
- Foi uma demissão tardia. O Ministro saiu tarde. Mas, ao menos, podia ter saído bem. Mas não. Saiu sem honra nem dignidade.
- Devia ter assumido responsabilidades políticas. Tal como Jorge Coelho quando caiu a ponte de Entre-os-Rios. O Ministro não é o culpado do acidente. Mas o carro era o seu, o motorista era o seu e do acidente resultou uma vítima mortal. Ele não era um mero passageiro.
- Devia ter sido solidário com a família da vítima e agora com o seu motorista. O Ministro fez sempre o contrário: não acompanhou a vítima no momento do acidente, não foi ao seu funeral, não prestou qualquer apoio à família e andou sempre a insinuar que a culpa foi do trabalhador que morreu. Simplesmente inqualificável. E agora, perante a acusação do MP, nem uma palavra de conforto para com o seu motorista. Este homem pode ser bem formado. Mas não parece.
- Devia ter saído com humildade. Mas não. Saiu arrogante e ressabiado. Ao dizer que era um mero passageiro, sem responsabilidade, escreveu um tratado de arrogância. Passando minutos a fio a fazer o seu auto-elogio, foi ridículo. Culpando os outros por aproveitamento político, fez mais um exercício de descaramento. Nem na despedida se consegue elogiar Cabrita!
ELEIÇÕES: OS DESAFIOS DE PS E PSD
- Já tivemos um mês de pré-campanha eleitoral. O que temos, para já, é um debate enviesado. Duplamente enviesado:
- Enviesado, porque só se discutem cenários pós-eleitorais. Que coligações, que alianças, quem viabilizará o quê! Claro que isso é importante. E nestas eleições ainda mais importante. Mas atenção: mais importante ainda é discutir a governação. A actual e a futura. Que reformas concretas cada um quer fazer na economia, nos impostos, na saúde. Ou seja: para que é que querem o poder.
- Enviesado pela atitude. Toda a gente perguntou a Rui Rio e Paulo Rangel o que fariam se o PS ganhasse sem maioria absoluta. Viabilizavam governos e orçamentos do PS? Perguntas importantes, sem dúvidas. Mas não vi ainda perguntar a António Costa o que faz o PS se o PSD ganhar sem maioria. Eu admito que ele não responda. Mas convinha perguntar!
- As eleições de 30 de Janeiro são difíceis para António Costa. Ele tem muito a perder e pouco a ganhar. Se tiver maioria absoluta, claro que é um ganhador. Mas, se não tiver – um cenário mais provável –, tem muito a perder.
- Primeiro: se perde as eleições, é um derrotado. Não é hoje o cenário mais provável. Mas atenção: o Governo está muito desgastado, não tem a frescura de 2019 e o PM não é brilhante em campanha. E os debates televisivos a dois, a que ele não pode fugir, também não vão ser fáceis.
- Segundo: se ganha com maioria relativa, ganha eleitoralmente mas perde politicamente. É que a partir de agora não tem geringonça. Logo, tem piores condições de governabilidade do que tinha até aqui. Pode passar o 1º e 2º Orçamentos. O PSD já se disponibilizou para os viabilizar. Mas corre o risco de o seu governo durar no máximo dois anos. Nenhum líder da oposição viabiliza quatro Orçamentos.
- O drama de uns é a oportunidade para outros. Esta crise pode ser uma grande oportunidade para o PSD. Rui Rio está politicamente reforçado.
- É a oportunidade de ganhar as eleições agora; ou de as ganhar, daqui a dois anos. Rui Rio pode ganhar agora. Não é fácil. Mas também não é impossível face ao desgaste do Governo. Mas, se não ganhar agora, tem sérias hipóteses de ganhar daqui a dois anos. Dificilmente o Governo dura mais do que isso. Pode aplicar-se a Rio a célebre frase: será PM, só não se sabe se agora ou se daqui a dois anos!