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08 de Maio de 2022 às 21:08

Marques Mendes: O PSD anda distraído com eleições internas

No seu comentário habitual na SIC, Marques Mendes considera que as eleições internas do PSD não suscitam grande curiosidade e interesse do país.

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A POLÉMICA DE SETÚBAL

1. A polémica com o acolhimento de Ucranianos em Setúbal continua. Com dois factos graves:
a) Primeiro: segundo o Expresso, Igor Khashin, líder da comunidade russa em Portugal que participava com a mulher no acolhimento de refugiados ucranianos, estava há anos a ser "monitorizado" pelo SIS. O SIS, em regra, transmite as informações que tem ao PM. Por isso, pergunta-se: por que é que o Governo não informou as autarquias de que esta pessoa não era recomendável? Isto tem de ser esclarecido. Porque esta omissão é grave. Como não é crível que o PM tenha encoberto a informação, exige-se então de António Costa uma explicação rápida e cabal.
• E é o PM o único que pode dar essa informação, mesmo à AR, porque só ele tem a "tutela" dos Serviços de Informação.
b) Segundo: inexplicavelmente, o PS, abusando da sua maioria absoluta, impediu que Presidente da CM de Setúbal e Embaixadora da Ucrânia fossem à AR prestar esclarecimentos. Importa perguntar:
• De que é que o PS tem medo? O que é que o PS quer esconder? É desta forma que o PS pretende usar a maioria absoluta? Isto não é exercer o poder. É abusar dele.

2. Finalmente, o PCP. Agora passou à fase de se fazer de vítima. O que é patético. Ninguém quer ilegalizar o PCP. As coisas são claras: o PCP tem direito às suas posições inacreditáveis; e nós temos direito a criticar com veemência o PCP. Por muito que custe ao PCP, isto é a democracia.

A FALTA DE MÉDICOS DE FAMÍLIA

1. A falta de médicos de família é um drama. Estamos hoje pior do que em 2015, no fim da troika. Portugal tinha então um milhão de pessoas sem médico de família. Hoje, tem 1,3 milhões (dados oficiais divulgados pelo Público).

2. Por que é que isto sucede? A explicação do Governo é uma desculpa de mau pagador: diz o Governo que hoje há mais pessoas inscritas nos Centros de Saúde. É verdade. Mas, se retirássemos essas novas inscrições, continuávamos com um défice igual ou maior que o de 2015. A outra explicação é falaciosa: o crescente número de médicos aposentados. Também é verdade. Mas é normal e previsível. As pessoas chegam a um limite de idade e reformam-se.

3. A verdadeira razão deste drama é outra: o SNS é hoje incapaz de reter dentro de si jovens médicos que acabam a especialidade. E tudo porquê?
• Porque a carreira para um jovem médico, no SNS, não é atrativa. O salário é baixo. A carreira não é motivadora. O projeto não é mobilizador. E os bons convites surgem cada vez mais do setor privado.
• No meio disto ninguém percebe que solução o Governo tem para este problema. Há muitos diagnósticos. Mas reformas ou medidas, nada.

4. Finalmente, o problema político. Em 2016, António Costa prometeu que nessa legislatura cada português teria um médico de família. Não cumpriu. E, perante isto, o que disse o PSD esta semana, quando estes números vieram a público? Aparentemente nada. Em vez de confrontar o Governo com esta falha, o PSD anda distraído com eleições internas e revisões constitucionais. Uma anormalidade. Assim, não se faz oposição.

A FALTA DE PROFESSORES

1. A revista Visão fez esta semana um diagnóstico cruel, mas verdadeiro: há falta de professores em Portugal e há cada vez menos candidatos a professores. Vejamos o essencial:
• Numa década, o País perdeu 28 mil professores (19% do total atual);
• Até 2030, vão reformar-se mais de metade dos professores atualmente existentes;
• Daqui a um ano, haverá 110 mil alunos sem aulas a, pelo menos, uma disciplina;
• Cada vez há menos pessoas a querer seguir a carreira docente.

2. Por que é que isto sucede? Porque ser professor deixou de ser atrativo.
• Ser professor deixou de ser atrativo pelo estatuto social. Há décadas, o professor era uma autoridade dentro da escola e uma pessoa altamente respeitada fora dela. Hoje, o estatuto de professor degradou-se.
• Ser professor deixou de ser atrativo pelo baixo salário. O salário de um professor, sobretudo no início de carreira, não é motivador. É o drama da generalidade da nossa Administração Pública.
• Ser professor deixou de ser atrativo ser pela instabilidade da carreira. Um professor anda de terra em terra, com a casa às costas. Não tem um mínimo de estabilidade. Isto não é vida para ninguém.

3. Aqui chegados, pergunta-se: o que vai fazer o Governo para resolver este problema? Criar incentivos aos aposentados para voltarem ao ativo? Melhorar salários? Estabilizar a carreira? Era importante esclarecer.

O ESTADO DA GUERRA

1. Uma guerra sabe-se sempre quando começa. Nunca se sabe é como e quando acaba. A situação que se vive é de um duplo impasse: impasse militar, porque até agora a Rússia não ganhou e a Ucrânia não perdeu; impasse político, porque não há perspetiva de cessar-fogo ou de negociação de qualquer acordo de paz.

2. Amanhã, 9 de maio, é o Dia da Vitória da Rússia. Apesar do aparato militar, tudo será muito diferente do que o Kremlin imaginava:
• Putin pensava anunciar neste dia uma vitória militar. Falhou.
• Celebrar amanhã qualquer vitória é impossível.
• Anunciar que passa de operação militar a guerra é só propaganda.
• Mesmo assim, a ideia de Putin estar em queda é um exagero.
• Putin está isolado fora da Rússia, mas sólido dentro do país.

3. A grande questão, neste contexto, é esta: como acabar com a guerra?
• No imediato não há qualquer solução. Nem vitória militar nem cessar-fogo provisório.
• A perspetiva é de uma guerra longa e impasse militar e político.
• Há o risco de a guerra alastrar a outros países.
• Há o risco da utilização de armas não convencionais.
• O perigo de recessão na Europa é cada vez maior.

4. A UE prepara-se para avançar com um novo pacote de sanções à Rússia, sobretudo centrada no embargo à importação de petróleo russo. Será eficaz?
• No 6º pacote de sanções, a UE divide-se: Hungria e Eslováquia reticentes.
• Estas sanções terão pouca eficácia: atingem o petróleo e não o gás russo.
• A grande fonte de financiamento da Rússia é o gás.
• UE precisa de tempo para se separar energeticamente da Rússia. É a sua grande fragilidade.

5. No Ocidente, a única boa notícia é António Guterres. Antes tão criticado, teve uma semana de elogios: afinal, na sequência da sua intercessão, os civis de Mariupol foram finalmente evacuados. Não é muito para o que se esperaria da ONU. Mas é importante para a credibilidade do seu Secretário-Geral.

A FUGA DE JOÃO RENDEIRO

1. Em 2021, o CSM instaurou um processo de averiguações à fuga de João Rendeiro. Agora, um relatório apresentado veio concluir que os juízes não tiveram qualquer responsabilidade. Mas acrescenta que houve falhas sérias:
• Houve um julgamento que devia ter começado em 2018 e só começou em 2020.
• Noutro caso, o processo levou 28 meses a descer dos tribunais superiores até à primeira instância para emitir mandado de prisão.
• Durante este tempo, dois anos e quatro meses, o Juiz titular não foi informado do que se passava na Relação, Supremo e TC.
• Sendo que o Tribunal de primeira instância precisa de informação para eventual mudança de medidas de coação.

2. Aqui chegados, concluiu-se o seguinte:
a) Primeiro: perante todas estas falhas, ninguém tem responsabilidades? A culpa volta a morrer solteira?
b) O problema da nossa Justiça não é a qualidade e a competência dos juízes. É o desleixo, a falta de gestão e de organização. E o drama de os vários Tribunais não falarem uns com os outros. Cada um vive na sua "quinta". Precisa-se de um gestor como Ministro da Justiça.

3. Há, entretanto, um outro caso, divulgado pelo DN, que vai dar que falar: um acórdão do TC vai fazer com que milhares de inquéritos sejam arquivados. Era um terramoto anunciado: o Tribunal de Justiça da UE declarou inconstitucional legislação europeia sobre o uso de metadados; a seguir, era óbvio que o nosso TC faria o mesmo; isso obrigará a AR a fazer nova legislação, corrigindo as falhas apontadas, mas dificilmente salvaguardará casos passados.
• Isto podia ter sido evitado se, nos últimos anos, Governo e AR tivessem legislado, antes da decisão do TC e nos dois pontos controversos. Houve quem o recomendasse: o Procurador do MºPº, Carlos Pinho. Em 2018 ele chamou a atenção e antecipou este terramoto. Ninguém lhe deu ouvidos, e mal.

ELEIÇÕES INTERNAS DO PSD

1. Apesar de estarmos a três semanas das eleições internas do PSD, a verdade é que elas não suscitam grande curiosidade e interesse do país. Primeiro, porque a guerra e as questões económicas e sociais, sobretudo a subida do custo de vida, ocupam o essencial das preocupações dos portugueses; depois, porque os candidatos à liderança têm privilegiado mais o discurso para dentro do partido e menos para a sociedade.
A grande novidade é a divisão, como se esperava, dentro das personalidades que até agora apoiaram Rui Rio: Francisco Pinto Balsemão e Manuela Ferreira Leite apoiam Jorge Moreira da Silva; Alberto João Jardim e José Manuel Bolieiro apoiam Luís Montenegro.

2. Uma coisa é certa: o PSD precisa urgentemente de ter líder. O que se está a passar não é bom para a democracia. Fica a sensação de que o PSD ou vive num vazio ou está em autogestão. É preciso colocar ordem na casa.
• Estar a discutir se o PSD deve apresentar projetos de revisão constitucional e de mudança de leis eleitorais sem um líder eleito e definitivo não é normal. São opções de fundo. Só um novo líder pode decidir.
• Como não é normal que o país tenha os problemas sérios que tem na Saúde e na Educação e a voz do PSD seja curta e reduzida. Esta falta de oposição não é só um défice partidário. É uma exigência democrática.
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