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05 de Maio de 2019 às 21:06

Notas da semana de Marques Mendes

As notas da semana de Marques Mendes no seu habitual comentário na SIC. O comentador fala sobre a "crise" dos professores, as decisões do PSD e CDS e as consequências da "crise", entre outros assuntos.

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A "CRISE" DOS PROFESSORES

 

  1. António Costa teve uma atitude responsável, inteligente e oportuna.
  2. Primeiro: mostrou sentido de responsabilidade ao rejeitar uma decisão que é financeiramente insustentável, além de injusta para a generalidade dos portugueses que sofreram com a crise e que não viram as suas carreiras reparadas – os pensionistas, os funcionários públicos em geral, os trabalhadores por conta de outrem, os desempregados, os emigrados.
  3. Segundo: mostrou inteligência política. Na governação, estava há meses na defesa, com erros e recuos, problemas de imagem e dificuldades na coligação. Agora passou ao ataque. Depois, "salvou" a campanha do PS para as eleições europeias. A campanha estava um desastre, agora ganha um novo élan e mobilização.
  4. Terceiro: teve uma atitude oportuna. Aproveitou a ingenuidade e o amadorismo dos partidos da oposição. PSD e CDS colocaram-se a jeito. Estenderam ao PS uma passadeira vermelha. Colocaram condições mas depois aprovaram os 9 anos, já sem condições. Um erro brutal. O PM foi rápido a perceber a oportunidade que tinha pela frente, aproveitou-a, fez-se de vítima e cavalgou a onda da responsabilidade e da credibilidade.

 

  1. PSD e CDS, ao contrário, cometeram um erro enorme.
  2. Primeiro, um erro de posicionamento. PSD e CDS não devem, em matéria financeira e orçamental, votar ao lado do PCP e BE. Não é por qualquer preconceito. É porque são incompatíveis. O PSD e o CDS são pelo controle da despesa, do défice e da dívida. PCP e BE pensam exactamente o contrário.
  3. Segundo, um erro no plano da credibilidade. Se estivessem no Governo nunca aprovariam uma decisão destas. Nenhum MF do PSD ou do CDS autorizaria uma despesa destas. Logo, fica a sensação de oportunismo político e isso mina a credibilidade.
  4. Terceiro, um erro no plano da coerência. O PSD e o CDS criaram no Governo uma imagem de responsabilidade financeira, o que é um grande activo. De repente, passam de responsáveis a despesistas.
  5. Finalmente, um erro no plano do discurso. Quem anda a pedir redução da dívida e baixa de impostos não pode "autorizar" uma despesa desta envergadura. Sol na eira e chuva no nabal é impossível.

 

  1. Em conclusão: o PM teve uma das melhores prestações políticas da sua carreira. Rui Rio e Assunção Cristas cometeram o maior erro das suas lideranças que lhes vai custar bem caro no futuro.

 

 

AS DECISÕES DO PSD E DO CDS

 

O PSD e o CDS tinham uma de duas hipóteses – ou persistir no erro ou arrepiar caminho. Ou confirmar a lei ou rever a sua posição.

 

  1. Persistir no erro seria um suicídio. É que a seguir aos danos que já houve podia ter mais dois outros igualmente pesados. Primeiro, o eventual veto político do PR a esta lei; depois, a eventual antecipação de eleições. Essas duas decisões, a existirem, seriam fatais para o PSD e o CDS. Porque seriam vistas, obviamente, como uma sanção política ao PSD e ao CDS e um aval à decisão do Governo.

 

  1. Arrepiar caminho era a única solução possível e sensata. Primeiro, porque emendar a mão é sempre melhor que insistir no erro. Depois, porque ajudava a limitar os danos em vez de os agravar e ampliar. Finalmente, porque, no caso do PSD, ao arrepiar caminho, Rui Rio ainda tentava salvar aquilo que é o melhor da sua imagem – a ideia de que é um político responsável.

 

  1. Como eu imaginava, PSD e CDS recuaram. Arrepiaram caminho. Entre o mau e o péssimo, optaram pelo mal menor. Fizeram bem. Assim, evitaram uma crise política, um drama financeiro para o país, um veto provável do PR e eleições antecipadas em Julho que lhes poderiam ser fatais.

 

  1. PSD e CDS demoraram bastante tempo a reagir à decisão do PM. O que significa que foram apanhados desprevenidos. Não previram esta situação. O que demonstra uma enorme impreparação política. Pelo menos há 2 semanas que este cenário da demissão estava na cabeça do Governo (desde a notícia da RR nesse sentido).

 

 

CONSEQUÊNCIAS DA "CRISE"

 

  1. O PS é o grande ganhador desta "crise".
  2. Primeiro: salvou a campanha das Europeias ;
  3. Segundo: consolida a imagem de um partido de contas certas, de rigor, moderação e responsabilidade financeira. Quem diria, o partido que há poucos anos quase levou o país à bancarrota!
  4. Terceiro: tem agora condições para lutar pela maioria absoluta. É difícil, mas ganhou agora um élan e uma força que já tinha perdido.
  5. Quarto: depois de comportamento errático (ora à esquerda, ora ao centro), vai agora afirmar-se como uma referência para o eleitorado moderado do centro, onde novamente se ganham eleições com maioria.

 

  1. O PSD e o CDS são os grandes perdedores. Tiveram um dano sério de reputação, de credibilidade e de discurso. E ficaram politicamente fragilizados.

A política tem destas coisas: mudanças drásticas e às vezes imprevisíveis. Numa semana, muita coisa mudou. Há uma semana, o Governo estava à defesa e em baixo de forma; uma semana depois, passou a estar ao ataque, cheio de força e mobilização.

 

  1. Finalmente, acabou para os professores a ideia dos 9 anos. Na minha opinião, mesmo que a lei avançasse, nunca teriam os 9 anos: primeiro, porque podia chumbar no TC; depois, porque podia ter um veto do PR; e mesmo que entrasse em vigor o governo não a cumpriria, porque não inscrevia no OE, ano a ano, as verbas necessárias.

 

 

LEI DE BASES DA SAÚDE

 

Com tudo o que aconteceu com a questão dos professores, a polémica da Lei de Bases da Saúde passou para segundo plano. Mesmo assim, da forte crispação do último debate quinzenal (entre António Costa e Catarina Martins), resultaram conclusões:

 

  1. Primeiro: foi um erro fazer este debate e querer aprovar uma nova Lei de Bases da Saúde em período pré-eleitoral. Há demagogia a mais e racionalidade a menos. Sobretudo num tema tão ideológico como este.

 

  1. Segundo: não havia qualquer urgência neste debate. Mesmo nas questões das PPP da Saúde. Desde logo, porque foi o PS que em Portugal iniciou a experiência das PPP na Saúde, através do Ministro Correia de Campos. Depois, porque tal como as iniciou também pode acabar com elas. A actual Lei de Bases nem as impõe nem as proíbe.

 

  1. Terceiro: o PS e o Governo não ganham nada com este debate e até podem perder. Com um discurso muito à esquerda, perde no eleitorado moderado. Com um articulado que agrada ao centro, perde votos no eleitorado de esquerda. Agradar a gregos e troianos é difícil. A prova provada é que o PM sentiu necessidade de esta semana escrever um artigo no Público a dar explicações. E, quando se explica muito, isso significa que se está acossado e à defesa.

 

 

O DEBATE DAS EUROPEIAS

 

  1. Como estiveram os vários intervenientes no debate realizado na SIC:
  • Pedro Marques – Fraquinho, fraquinho. A provar que a sua escolha foi um erro de casting.
  • Paulo Rangel – Esteve bem. Moderadamente ao ataque com um ponto alto na questão dos fundos estruturais.
  • João Ferreira – No seu estilo habitual, mas percebendo-se que o PCP está nervoso. Pode perder um deputado para o Bloco.
  • Marisa Matias – Sai-se sempre bem em debates e aqui não foi excepção. Passou uma imagem de simpatia, confiança e conhecimento das matérias.
  • Nuno MeloDe todos foi o que esteve mais ao ataque. Trouxe Sócrates para o debate. Pode ser desajustado para a população em geral mas ajuda a mobilizar o seu núcleo duro eleitoral.
  • Marinho Pinto – Vê-se que não perdeu qualidades como debatente. Não se percebe é por que perdeu visibilidade e protagonismo ao longo destes últimos cinco anos.

 

  1. Politicamente falando, concluiu-se:
  2. Primeiro: um debate sem história;
  3. Segundo: a política doméstica sobrepôs-se sempre à política europeia;
  4. Terceiro: no essencial, os candidatos falaram para os seus núcleos duros eleitorais, porque nas Europeias são apenas estes que realmente votam.

 

 

ELEIÇÕES ESPANHOLAS

 

Três lições a tirar das eleições espanholas, que também dizem muito a Portugal:

 

  1. Primeira lição: uma coisa são votos, outra coisa são deputados. A direita em Espanha (PP, Vox, Ciudadanos e Navarra Suma) tem ligeiramente mais votos que a esquerda (PSOE e Podemos). Mas a esquerda tem mais deputados. Porquê? Porque a direita se dividiu imenso e os votos à esquerda se concentraram muito no PSOE. Foi o mesmo que sucedeu em Portugal em 2015 (a favor da PAF) e que pode agora suceder em favor do PS.

 

  1. Segunda lição: em política, estar no poder conta muito. Há poucos anos, quando na oposição, o PSOE estava ameaçadíssimo pelo Podemos. Sanchez, por sua vez, até foi "corrido" da liderança. Regressou e arranjou uma geringonça para assumir o poder. Chegado ao poder, com a ajuda da economia e das "aselhices" dos que provocaram eleições antecipadas, aumentou e muito o seu "score" eleitoral. Aqui, em Portugal, este é também o retrato do PS e de António Costa.

 

  1. Última lição: Sanchez provavelmente vai governar sozinho, em minoria, com apoio informal no Parlamento. Para a Espanha é sempre uma solução precária e instável. Para o líder do PSOE não é necessariamente mau: é que se o derrubarem ele faz-se de vítima e pode aumentar o seu resultado eleitoral. Cá também não é impossível que tal cenário suceda.
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