Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre a Selecção no Mundial; o fim de Bruno de Carvalho no Sporting, o ISP e as negociações do OE, entre outros temas.
OS COMBUSTÍVEIS BAIXAM?
- O que se passa nesta matéria é uma loucura – um exercício de completa demagogia e leviandade. De todos os agentes políticos.
a) Governo – É o maior culpado. Prometeu que este adicional no imposto sobre os produtos petrolíferos era transitório – que só existia enquanto o preço do petróleo estivesse baixo. Pois bem. Passou de transitório a definitivo, mesmo quando o preço do petróleo subiu. O Governo falhou a palavra. Ficou-se pela demagogia.
b) Oposição – CDS e PSD são outros culpados. Criam a expectativa de que com esta lei o preço dos combustíveis pode baixar este ano. Mas sabem que isso é impossível. Esta lei é inconstitucional. Viola a chamada norma travão prevista na Constituição. Logo, ou a lei não seria aprovada; ou, sendo, teria de ser vetada pelo PR ou chumbaria no TC. Numa palavra: demagogia e leviandade.
c) PCP e BE – Os últimos culpados e os últimos demagogos. Apoiaram este adicional no ISP quando aprovaram o OE e agora viabilizam a iniciativa da oposição. Tentando agradar a gregos e a troianos. Sabendo que estão a ser desleais com o Governo que apoiam, com o Orçamento que aprovaram e com a Constituição que dizem respeitar.
- O que é que isto prova?
a) Primeiro, que estão todos em campanha eleitoral. A demagogia está à solta e a regra é o vale tudo.
b) Segundo, que é assim que os políticos perdem o respeito dos cidadãos. Toda a gente percebe que tudo isto é um exercício de "esperteza saloia".
O FIM DE BRUNO DE CARVALHO
- Primeiro apontamento: esta Assembleia Geral (a maior de sempre na vida do Sporting) é uma grande manifestação de força e de democracia. Os sócios do Sporting foram claros, foram inequívocos, foram inteligentes e tiveram a coragem de romper.
É uma grande lição para os demagogos e os populistas. O poder está no povo.
- Segundo apontamento: por que é que Bruno de Carvalho cai com estrondo, apesar de quase toda a gente elogiar uma boa parte da sua actuação?
a) Porque se deslumbrou e endeusou com o poder (quis ser uma espécie de Dono disto Tudo);
b) Porque quis o poder absoluto – controlar tudo, mandar em tudo, afrontar tudo (chegou a ter votações de 90%);
c) Porque ultrapassou todos os limites – da lei, da ética, do bom senso, da razoabilidade e da decência.
Esta é outra lição para os populistas e demagogos. Em democracia, mesmo no futebol, tem que haver regras, limites e respeito. Bruno de Carvalho não respeitou nada nem ninguém. Por isso, caiu.
- Finalmente, esta Assembleia Geral é um grande motivo de esperança e de aviso. Por um lado, ela é a prova de que o populismo pode ser vencido. Mas atenção! Para o futuro convém ter mais cuidado. O populismo tem um preço. E um preço elevado. Bruno de Carvalho caiu mas o Sporting vai pagar uma factura pesada. É que esta gestão vai deixar sequelas fortes.
O DIA D DA SELECÇÃO
- Primeira nota: este é um Mundial atípico. Uma caixinha de surpresas. Uma boa parte dos favoritos tem sentido dificuldades enormes (caso do Brasil, da Argentina ou da Alemanha). Em boa verdade, ninguém pode facilitar.
- Segunda nota: o vídeo-árbitro tem sido importantíssimo para afirmar a verdade desportiva. Mesmo assim, tem havido falhas clamorosas da arbitragem. Erros com forte influência no resultado. É uma boa lição para Portugal. Passamos a vida, cá dentro, a queixarmo-nos dos árbitros. Afinal, na mais alta competição do futebol, repetem-se os mesmos maus exemplos.
- Terceira nota: para já, este Mundial vai de vento em popa para Cristiano Ronaldo. Primeiro, porque ele tem estado em grande; depois, porque os seus principais adversários à conquista da Bola de Ouro, têm estado francamente em baixo (é o caso de Messi e de Neymar).
- Última nota: Portugal continua fiel ao ADN de Fernando Santos – uma Selecção resultadista. Focada no resultado e não na exibição. Não é necessariamente mau. Durante anos tínhamos boas exibições e vitórias morais. Mas, apesar de tudo, podia ser um pouco melhor: podemos tentar conciliar a qualidade do resultado com a qualidade da exibição. Afinal, no meio termo está a virtude. Espera-se que ela se afirme amanhã, no jogo com o Irão.
TRAPALHADAS NO PSD
- Mais uma semana de descoordenações no PSD. Aquilo a que antigamente se chamavam trapalhadas. A novidade é que desta vez já não são descoordenações desencadeadas pela oposição a Rui Rio. Agora, são trapalhadas entre Rio e os seus próprios apoiantes e dirigentes. Três casos em 10 dias:
a) Professores – David Justino a defender uma posição. Rio a defender outra. Só que Justino é vice-presidente de Rio.
b) Orçamento – Silva Peneda a defender uma coisa. Rio a defender outra. Só que Silva Peneda é do Conselho Estratégico de Rio.
c) Combustíveis – O líder parlamentar a votar de uma forma. Rio a defender outra votação. Só que Fernando Negrão é uma escolha de Rio.
- O que é que isto revela? Três coisas:
a) Falta de liderança. Se houvesse liderança a sério, havia coordenação. E nenhum responsável falava ou decidia sem previamente articular com Rio. Como não há liderança a sério, o PSD está em autogestão.
b) Falta de debate político. Se houvesse debate político, havia pensamento e orientação. Como não há debate, é "cada cabeça sua sentença". Uma desafinação total.
c) Tendência suicida. Quando o PS está em dificuldade e em queda nas sondagens, o PSD, em vez de aproveitar, dá tiros nos pés.
Em conclusão: um desastre. Aos olhos dos eleitores, quem não manda no partido não conseguirá mandar no governo do país. Mau para o PSD. Péssimo para o país.
- Bloco Central?
- Rui Rio teima em duas outras coisas erradas: em admitir amiúde que o PSD vai perder as eleições; e em nunca fazer uma crítica a António Costa (critica o Governo mas nunca o PM).
- São dois erros crassos. Primeiro, porque desta forma o PSD não gera uma dinâmica de vitória; depois, porque estas atitudes legitimam as suspeitas que entre Costa e Rio passa a ideia de um futuro Bloco Central.
- E a suspeita é mais legítima do que se pensa. Um e outro não pensam noutra coisa. Só falta saber se terão condições políticas nos respectivos partidos para imporem um Governo de Bloco Central.
AS NEGOCIAÇÕES DO OE
- Começaram as negociações dentro da geringonça para a aprovação do próximo Orçamento. E o PR colocou pressão sobre os partidos à esquerda, dizendo que é a eles e não ao PSD que cabe aprovar o Orçamento.
- Nunca como este ano foi tão crispado e difícil o ambiente dentro da coligação. Mesmo assim, é do interesse de todos que o OE passe e não haja crise política.
a) É do interesse do PCP e do BE – Ambos têm medo de serem penalizados por provocarem uma crise e de beneficiarem o PS, que rapidamente se vitimizaria. Não querem repetir o erro de 2011.
b) É também do interesse do PS evitar uma crise:
- Primeiro: abrir uma crise significaria que a geringonça falhou. Seria uma derrota para o PS que a criou e a pôs de pé;
- Segundo: mesmo que o PS se fizesse de vítima, não haveria nenhuma garantia de que obtivesse uma maioria absoluta, face à queda nas sondagens;
- Finalmente: não tendo maioria absoluta, não poderia repetir, a seguir às eleições, a solução política que antes falhou.
A CANDIDATURA DE ANTÓNIO VITORINO
- É já no próximo dia 29 (6ª feira) que ocorre a eleição do novo Director-Geral da Organização Internacional das Migrações, um organismo no âmbito das Nações Unidas. Uma eleição com três candidatos, um dos quais António Vitorino.
- O que dizer desta candidatura?
a) Primeiro: é mais uma excelente iniciativa de Portugal. Ousar propor portugueses para altos cargos internacionais é sempre uma boa aposta;
b) Segundo: é uma excelente candidatura. António Vitorino é um excelente candidato. Além das suas qualidades pessoais, políticas e profissionais, António Vitorino tem, nesta área, uma bela experiência que adquiriu, designadamente, quando foi Comissário Europeu, onde desenvolveu um trabalho notável;
c) Terceiro: esta eleição é um desafio difícil. Basta pensar que um dos seus adversários é um norte-americano. E até hoje, em nove das escolhas para directores-gerais da Organização, oito foram dirigentes dos Estados Unidos da América. Mesmo assim, há sobretudo quatro razões que reforçam as probabilidades da eleição de António Vitorino.
- Primeiro, um fortíssimo apoio na UE e em África;
- Segundo, as atitudes de Trump, que desajudam o candidato americano e indirectamente favorecem Vitorino;
- Terceiro, o trabalho notável da diplomacia portuguesa;
- E, the last but not the least, a qualidade e o prestígio do nosso candidato.
A EUROPA E AS MIGRAÇÕES
- Nos EUA, Trump separa pais e filhos; a Itália recusa-se a acolher barcos com refugiados em risco; na Hungria, o Governo quer punir criminalmente quem ajude os imigrantes; na Alemanha, a coligação corre o risco de quebrar por causa das divisões sobre imigração. Hoje tivemos uma mini-cimeira europeia por causa da imigração.
- O que dizer de tudo isto?
a) Do ponto de vista humanitário, tudo isto é deplorável. O que sucede nos EUA e na UE é um retrocesso da civilização. É o regresso à barbárie. O mundo ocidental é tão moderno na tecnologia (no Facebook, no Twitter, na Indústria 4.0) e depois é tão arcaico nos princípios e valores.
b) Do ponto de vista político, tudo isto é perigosíssimo. É o maior ataque à democracia e ao Estado de Direito que se conhece nas últimas décadas.
- Porquê? Porque este é o campo em que florescem os ditadores e populistas e em que se afundam os moderados de centro-esquerda e de centro-direita;
- Porque o discurso anti-imigração dá votos; e porque os eleitores são muito permeáveis à exploração do medo, da insegurança e da chantagem;
c) Do ponto de vista europeu, a imigração é uma espécie de Cavalo de Troia:
- Primeiro: a mesma Europa que faz o grande projecto do Euro não é capaz de se entender para acolher imigrantes que, no máximo, representam 1% da população europeia;
- Segundo: a mesma Europa que tanto apregoa a solidariedade quando se trata de distribuir fundos estruturais não é capaz de ser solidária quando se fala de integrar pessoas.
- Finalmente: porque a UE, em vez de fazer pedagogia, deixa que os seus adversários façam demagogia. O discurso da pedagogia essencial é este: a Europa precisa de mais população; a economia europeia precisa de mais mão-de-obra; a segurança social dos países europeus precisa de mais receita; a imigração não é sinal de insegurança. Ou seja: uma política inteligente de portas abertas concilia a cultura dos valores com a lógica dos interesses europeus.