Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Os principais excertos da sua intervenção na SIC.
OPERAÇÃO AUTÁRQUICAS
- Sintra
a) Vai ser provavelmente o grande caso da noite eleitoral. A luta mais renhida das próximas eleições autárquicas. O vencedor vai ser uma incógnita até à contagem do último voto.
b) Basílio Horta (PS)
- De um lado estará Basílio Horta, o Presidente da Câmara e provável recandidato pelo PS.
- Tem a seu favor ser um bom político, um político experiente, uma figura mediática e estar no primeiro mandato. Tem contra si o facto de, desta vez, PSD, CDS e os independentes de há 4 anos estarem unidos e não divididos por várias listas.
c) Marco Almeida (PSD/CDS/Movimento Independente)
- Do outro lado estará Marco Almeida. Tem a seu favor o facto de ser um autarca muito conhecido em Sintra, de há 4 anos, sem apoio partidário, ter ficado próximo da vitória e de agora, 4 anos depois, juntar todas as partes. A desvantagem é que Basílio Horta hoje é poder e o poder tem sempre o seu peso eleitoral.
d) Conclusão: quem vai ganhar Sintra é uma incógnita. Como diz um amigo meu, especialista em sondagens, Sintra é uma espécie de Ohio ou Florida portuguesa. Ou seja, um caso de incerteza até final.
- Covilhã
a) Temos na Covilhã quatro bons candidatos. E num caso – Adolfo Mesquita Nunes – dá-se até a circunstância de ser uma figura nacional, que dá o bom exemplo de se candidatar na sua terra.
b) Em qualquer caso, a disputa da presidência vai ser, sobretudo, em torno de dois candidatos – o Presidente da Câmara actual e o ex-Presidente Carlos Pinto.
- O Presidente actual, do PS, tem a grande vantagem de estar apenas no primeiro mandato. Estatisticamente, estar em primeiro mandato é uma vantagem.
- Carlos Pinto, que foi Presidente da Câmara pelo PSD durante quase 20 anos e que agora concorre como independente, tem a seu favor o facto de ter sido considerado por toda a gente um grande Presidente de Câmara. Se isso é suficiente para ganhar só o saberemos no dia 1 de Outubro.
O CASO EDP E REN
- A questão de fundo não surpreende nem é nova. É a questão das "rendas excessivas" na energia que, sobretudo no tempo da troika, foi amplamente discutida. Eu próprio critiquei amplamente essas "rendas excessivas" nos comentários que então fazia noutra televisão.
a) No fundo, a ideia de que o Estado, no Governo Sócrates, ao firmar os chamados CMEC, foi demasiado mãos largas para com a EDP, assim prejudicando o interesse público e penalizando os contribuintes.
b) E, mais tarde, já no Governo Passos Coelho, a dúvida que ficou se o Estado não podia ter ido mais longe do que foi, na tentativa de moralização da situação.
- Tudo isto era conhecido. E tudo isto se confinava a uma discussão política, económica e de melhor ou pior defesa do interesse público. O que é novo e inesperado é levar esta questão para o plano criminal, para alegados casos de corrupção. E, sobre isso, há que dizer o seguinte, porque ninguém conhece o processo:
a) Primeiro: é a justiça, como sempre, a fazer o seu papel de investigação. E isso é de saudar.
b) Segundo: nesta fase há suspeitas e não certezas e os arguidos presumem-se inocentes e não culpados até desenvolvimentos futuros.
- Voltando ao plano político, esta questão das "rendas excessivas" ainda pode ser um "berbicacho" quer para o PS quer para o PSD.
- O BE vai reagendar o tema no Parlamento;
- Como vão agir o PS e o PSD?
- Provavelmente vão votar contra e bloquear qualquer revisão da matéria. Mas vão pagar um preço.
VOLTARAM AS GREVES?
- De repente, parece que voltaram as greves. Depois da função pública, dos médicos e metalúrgicos, há outras que se pré-anunciam: greve de enfermeiros, de juízes e de professores.
- Por que é que tal sucede? Por 3 razões essenciais:
a) Por razões políticas. Estamos em ano eleitoral e, em tempo de eleições, o PCP e os sindicatos da CGTP precisam de se demarcar do Governo.
b) Porque os sindicatos decretaram o fim da crise. Consideram que já há folga financeira suficiente para satisfazer exigências antigas e actuais.
c) Finalmente, porque, estando já em preparação o Orçamento para 2018, os sindicatos fazem pressão para o Governo abrir os cordões à bolsa.
- Este período é um teste sério ao Governo. É verdade que a crise no seu pior acabou. Mas não passámos de repente de pobres a ricos. Temos alguns desafios muito sérios pela frente.
a) Primeiro: o desafio do crescimento. Estamos num pico de crescimento, é verdade. Mas temos ainda de transformar este pico em planalto. Assegurar que o crescimento veio mesmo para ficar, para aumentar e para ser duradouro.
b) Segundo: o desafio do défice e da dívida. Em 2010, as receitas do Estado davam para pagar as despesas até 10 de Outubro. Agora, dão para cobrir as despesas até 15 de Dezembro. Melhorámos mas continuamos a pedir dinheiro emprestado. Ou seja: temos de continuar a reduzir o défice e temos de começar a reduzir a dívida. Sem isso, as Agências de Rating não nos tiram do nível Lixo.
MAL-ESTAR NA GERINGONÇA?
- Há claros sinais de mal-estar e de nervosismo no BE e no PCP. No PCP vê-se, sobretudo, no regresso à rua, às manifestações populares (ainda ontem tivemos duas, em Lisboa e no Porto). No BE vê-se mesmo em discurso directo de Catarina Martins (entrevista à Antena 1).
- Este mal-estar tem razões diferentes:
a) No PCP, a preocupação são as autárquicas. Estas são as primeiras eleições desde que há geringonça. É um teste à solução governativa. O PCP tem o receio de poder perder Câmaras. É que, se perder, soam as campainhas de alarme. A ala mais ortodoxa virá logo questionar: afinal, o que é que ganhámos em sustentar o Governo? Por isso, o PCP tem de se demarcar do Governo. Fazer de conta que bate o pé. Que não abandonou as suas causas.
b) No BE a preocupação é a maioria absoluta. O BE, mais do que o PCP, está preocupado com a ideia de o PS ter uma maioria absoluta nas próximas eleições legislativas. É que, se António Costa tiver uma maioria, o BE e o PCP são descartáveis. E lá se vai o sonho de o Bloco poder entrar no Governo.
- Em qualquer caso, julgo que não haverá consequências de maior. Primeiro, porque não é provável o PCP baixar o seu resultado autárquico. Depois, porque nem PCP nem BE abrirão uma crise política. Faziam o jogo do PS e levavam uma pancada eleitoral.
CRISE NAS SECRETAS
- Há um problema sério com a indigitação do Embaixador Pereira Gomes para Director dos Serviços de Informações (o seu comportamento em Timor, em 1999, na sequencia do referendo e da intervenção de força das milícias indonésias).
- As acusações feitas (Ana Gomes e jornalistas) são graves;
- Se se confirmarem, evidentemente que ele não pode ser nomeado;
- Entretanto, Carlos Gaspar, então assessor de Jorge Sampaio, veio defender o embaixador.
- Perante isto, tudo deve ser escrutinado com rigor.
- A Assembleia da República vai agora ouvir o Embaixador. Muito bem. é o cumprimento de uma exigência legal. Mas o Parlamento deveria ouvir também outras pessoas, para que não fique uma dúvida sobre a verdade do que se passou.
A Assembleia da República deveria ouvir, designadamente, duas pessoas, que tinham cargos de responsabilidade, à época:
a) A Dra. Ana Gomes, então embaixadora na Indonésia e que denunciou esta situação;
b) O antigo Ministro Jaime Gama, que era Ministro dos Negócios estrangeiros à data dos acontecimentos e cuja opinião é, neste caso, absolutamente incontornável.
TRUMP E O ACORDO DE PARIS
- Por que é que Trump tomou esta decisão e sobretudo agora? Alguns dizem que foi para cumprir uma promessa eleitoral. Julgo que não foi só isso, nem sobretudo isso. Ele já falhou várias promessas eleitorais. As razões são outras:
- Trump está em sérias dificuldades. Porque falhou vários compromissos. O Muro com o México que não avança; a proibição de entrada que se arrasta nos tribunais; o Obamacare é uma meia-derrota.
- E está, sobretudo, cercado pelas acusações de ligações à Rússia, com investigações por todos os lados.
- Precisava, pois, de desviar as atenções e mostrar aos seus apoiantes que marcava um golo e afirmava uma vitória.
- Consequências desta decisão – Ao contrário da maior parte dos comentadores, eu acho que esta decisão acaba por ter um efeito muito positivo e um outro menos negativo do que se espera.
- Primeiro: aspecto muito positivo – Reforçou brutalmente a unidade no mundo em torno deste tema. Nunca se viu tanta união em torno da questão das alterações climáticas como agora. Em vez de sair rasgado, o Acordo de Paris acabou reforçado.
- Segundo: o facto de Trump ter tomado a decisão que tomou, isso não significa que os EUA não vão investir nas energias limpas. Bem pelo contrário. Muitas destas decisões nos EUA são tomadas nos Estados federados e pela sociedade civil. E a verdade é que muitos vão cumprir Paris, apesar de Trump ou contra o próprio Trump.
OS PORTUGUESES DA VENEZUELA
- Situação actual – gravíssima crise política, económica, social e humanitária.
- Há fome, sofrimento, falta de bens e sobretudo de medicamentos.
- O problema de saúde é muito grave – aumenta a mortalidade infantil, voltou a malária, o dengue está a multiplicar-se.
- Perspectivas de solução? Não há. A sociedade está radicalizada e as iniciativas diplomáticas de mediação do conflito (quer do Vaticano, quer por parte do ex-Presidente do Governo espanhol Zapatero) não deram em nada.
- Situação dos portugueses
a) Os da primeira geração, que têm negócios antigos (por exemplo, 95% da indústria de panificação está na mão de portugueses), não querem sair da Venezuela.
b) Os da segunda e da terceira gerações querem sair e estão a sair.
- Muitos para os países periféricos (Panamá, Equador, Brasil, EUA);
- Mas também para Portugal – Já regressaram à Madeira cerca de 3 a 4 mil portugueses).
- Desafio a Portugal e sobretudo à Madeira.
a) Saúda-se a ida à Venezuela do SE José Luís Carneiro e do Secretário Regional da Madeira, Sérgio Marques.
b) Boa ideia a do Governo Regional da Madeira de criar um Gabinete de Apoio aos portugueses que regressam da Venezuela.
c) Fundamental a cooperação entre os dois governos, nacional e regional, sobretudo face aos novos encargos financeiros que esta situação acarreta.
- Finalmente, convinha não esquecer que foi com esta ditadura (Chavez/Maduro) que alguns governantes portugueses andaram aos beijos e abraços.
NOTAS FINAIS
- Misericórdia de Lisboa no Montepio?
Há aqui algumas novidades:
a) É muito provável que a Misericórdia de Lisboa entre, de facto, no capital do Montepio (Caixa Económica) com uma participação que pode chegar aos 10% do capital;
b) É muito provável que não entre sozinha e que possa entrar mais uma ou outra Misericórdia. Para aprofundar essa ideia há na próxima semana uma reunião entre o Provedor da Misericórdia de Lisboa e o Presidente da União das Misericórdias.
c) Presidente da República, Governo e Banco de Portugal são grandes apoiantes destas decisões.
- Qual o crescimento do PIB em 2017?
Com o resultado do primeiro trimestre, o mais provável é o PIB crescer este ano entre 2,5% e 3%; mesmo que o crescimento nos próximos 3 trimestres fosse sempre 0% (e não será), o crescimento seria de 2%.
- Chamada de atenção ao Governo e às autoridades da aviação civil
- Esta semana, no Aeroporto do Porto, um avião esteve quase a colidir com um drone.
- É o quarto ou quinto caso este ano.
- Será preciso haver um acidente para as autoridades acordarem?
- Saudação a Manuela Eanes
- Deixou esta semana a presidência do Instituto de Apoio à Criança.
- Durante 30 anos teve um trabalho notável.
- Merece bem uma homenagem.