Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Os principais excertos da sua intervenção na SIC.
A EVOLUÇÃO NA MATEMÁTICA
Durante anos a fio ouvimos dizer que os alunos portugueses eram maus a matemática. E que esse era um sinal do nosso subdesenvolvimento. Agora, essa situação parece que está a inverter-se. Tivemos esta semana uma excelente notícia.
Periodicamente há avaliações internacionais de matemática (houve em 2015, antes tinha havido em 2011 – normalmente de quatro em quatro anos). Pois bem:
Em 49 países avaliados, ficámos em 13º lugar (subimos 2 posições em relação a 2011);
Ficámos à frente da Finlândia e Holanda, dois países de referência nesta área;
Somos o país que mais progrediu em 20 anos, ou seja, entre 1995 e 2015.
O que é que isto significa? Duas coisas:
Que a aposta na melhoria da matemática está a dar resultados (começou com Marçal Grilo, continuou com David Justino, Maria de Lurdes Rodrigues, Isabel Alçada e Nuno Crato).
Que a exigência é o caminho e não o facilitismo. É o trabalho da exigência que nos pode levar ao sucesso e não o contrário. Por isso, é mais difícil perceber que o actual Ministro tenha terminado com a avaliação a matemática no 4º ano de escolaridade. Esperemos que não haja um retrocesso.
A VISITA DOS REIS DE ESPANHA
Foi uma visita com grande significado.
Primeiro – Há mais de um ano que os Reis de Espanha não faziam uma visita de Estado;
Segundo – Portugal e Espanha têm neste momento vários interesses em comum:
Espanha pode vir a ser candidata à presidência do Eurogrupo;
Portugal viu o seu peso internacional "reforçado" com a eleição de António Guterres;
E, finalmente, no plano bilateral, vão ser retomadas as cimeiras luso-espanholas suspensas nos últimos anos.
Tudo isto exigia um grande investimento de parte a parte e o estabelecimento de cumplicidades entre o Presidente português e a monarquia espanhola.
E essa cumplicidade viu-se, ouviu-se e sentiu-se. Desde logo nos discursos. É uma cumplicidade importante para os dois países, quer no plano bilateral, quer no plano europeu.
Nota final: a atitude do BE na Assembleia da República.
Foi uma atitude descortês e gratuita. Goste-se ou não do regime político espanhol, a verdade é que a Monarquia espanhola é constitucional, é democrática e é sufragada pela maioria dos espanhóis.
É uma atitude incoerente. O Bloco elogia uma ditadura (o regime cubano) e desrespeita uma democracia (a democracia espanhola).
Uma atitude só comparável à atitude que o PSD teve no 1º de Dezembro ao faltar às comemorações oficiais do dia da Restauração.
O PSD esteve mal. Se faltou às comemorações por causa da reposição do feriado mostra ressabiamento.
Se faltou por qualquer outra razão, mostra não perceber o significado da data. É a data que assinala a restauração da independência de Portugal.
PAULO MACEDO NA CGD
Rei morto, rei posto. Sai António Domingues e entra Paulo Macedo. É, finalmente, um virar de página na Caixa Geral de Depósitos.
Quanto a Domingues, aplica-se na perfeição o conhecido provérbio popular "O que nasce torto tarde ou nunca se endireita".
Foi o que sucedeu. O processo começou mal (com vetos de nomes) e acabou mal, com uma demissão cheia de arrogância e sobranceria, que ainda por cima demorou uma eternidade a concretizar-se.
Paulo Macedo é uma boa escolha. Provavelmente até melhor que a de António Domingues.
São ambos tecnicamente muito competentes. Só que Paulo Macedo tem mais mundo; tem uma vasta experiência de liderança que Domingues nunca teve; e tem uma capacidade para gerir momentos complexos que Domingues mostrou não ter.
Acresce que Paulo Macedo tem o hábito de fazer bem todos os lugares por onde passa. Foi assim no BCP, foi assim na Direcção Geral de Impostos e foi assim no Ministério da Saúde.
Duas notas finais:
A primeira para assinalar a escolha de Rui Vilar para Chairman. É uma excelente escolha. Rui Vilar foi o Presidente mais marcante que a CGD teve até hoje e é uma pessoa muito sensata e competente;
A segunda para sublinhar que a Caixa precisa de paz e tranquilidade:Compete ao novo líder, Paulo Macedo, criar condições nesse sentido; E compete aos partidos, sobretudo aos partidos da oposição, deixar de fazer guerra à Caixa. Tudo o que é de mais é erro. E o PSD, sobretudo o PSD, começa a exagerar nos ataques à Caixa. Fica a parecer: ou uma birra; ou uma obsessão pessoal; ou um ataque à ideia de banco público.
Novo Banco
As propostas do BPI e do BCP, na prática, estão fora da corrida;
As propostas dos Fundos, até ao momento, não são suficientemente competitivas para vencerem;
A proposta chinesa é financeiramente, neste momento, a mais forte;
Apesar de as negociações ainda estarem a decorrer, a decisão final deverá ser ainda este ano.
SANTANA LOPES DESISTE DE LISBOA
Para muitos a decisão de Santana Lopes não é surpresa. Já era esperada. Mas é uma decisão totalmente legítima. Agora, é uma decisão que tem consequências políticas sérias. Sobretudo três:
Primeiro: consequências para Medina. Ao Presidente da Câmara saiu-lhe a sorte grande.
Não tem um adversário forte nem à esquerda nem à direita. Já tinha evitado, à esquerda, a candidatura de Mariana Mortágua, que lhe podia fazer mossa; agora, evita também a de Santana Lopes.
Está há meses em campanha e quase sem oposição. São as obras; é a municipalização da Carris; são as promessas de passes sociais gratuitos para crianças e com descontos para idosos.
E está, semana sim, semana sim, ao lado do Presidente da República. E estar com o Presidente é sempre eleitoralmente compensador.
Segundo: consequências para Cristas. Para a líder do CDS a não candidatura de Santana Lopes é outro brinde. Uma espécie de presente de Natal.
A partir de agora não corre riscos. O único risco que tinha desapareceu.
O que mostra que a sua candidatura, além de corajosa, foi um tiro certeiro. E um enorme embaraço para o PSD.
Terceiro: consequências para o PSD. Passos Coelho está numa encruzilhada.
Ou apoia Cristas e é quase uma humilhação. É que, nesta fase, apoiar a líder do CDS já não é por convicção. É por necessidade e por medo de um resultado muito mau;
Ou apresenta um candidato pouco traquejado e pode ficar atrás de Cristas – o que seria outra humilhação para o PSD.
Ou, então, descobre, de repente, uma candidatura surpresa, forte e credível. O que é cada vez mais difícil.
O CONGRESSO DO PCP
Foi um Congresso sem novidades mas um Congresso histórico. Porquê?
Porque pela primeira vez há um Congresso do PCP em que este faz parte de uma coligação de Governo. E pela primeira vez o PS não é apresentado como o inimigo principal do PCP.
E isto é fazer história. Só não se sabe até quando!
Depois, foi um Congresso tranquilo, porque o PCP está tranquilo.
Conseguiu num ano de governação tudo o que pretendia – reforçar o seu poder sindical, sobretudo nos transportes, na administração pública em geral e na educação em particular;
Vai conseguir manter o seu poder autárquico (há um acordo tácito entre PCP e PS para não se guerrearem mutuamente nas autárquicas).
Foi um Congresso importante para o PS e para António Costa.
Porque o PCP é claramente o parceiro mais leal e fiável que o Governo tem. Como ainda se viu recentemente no episódio da Caixa. O BE a votar com PSD e CDS. O PCP firme ao lado do Governo.
Com o PCP pode ser difícil negociar seja o que for. Mas depois, fechada a negociação, a palavra é uma sentença.
E esta manifestação de carácter é muito importante para o PS.
Finalmente, foi o último e o grande Congresso de Jerónimo de Sousa.
O último parece evidente. Vê-se a preocupação de preparar o futuro – houve uma significativa renovação de quadros.
Mas um Congresso em grande para Jerónimo de Sousa. Ele é o rosto dos acordos com o PS. E é um esteio essencial do PCP. Pela sua simpatia, bonomia, autenticidade e perseverança.
DESAFIOS DAS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS
As eleições autárquicas de 2017 vão exigir acertos nas estratégias dos partidos. E até do Governo. Porque são eleições com uma forte carga nacional.
PCP e BE – Vão radicalizar o seu discurso e propostas. Para compensar perdas nas últimas sondagens, marcar terreno e mobilizar os seus eleitores. É o caso, já, da exigência de mudanças nas leis laborais. Se o Governo cede, é um desastre. Afasta, de vez, os investidores.
BE – Vai procurar uma nova agenda legislativa. Como não tem campanha autárquica (porque não tem autarquias) e não quer desaparecer de circulação, vai enveredar por uma nova fúria legislativa para fazer prova de vida.
Governo – Está a passar despercebido. Mas António Costa está a entrar numa nova fase. A fase da economia.
Vai retomar e reforçar a diplomacia económica.
Vai passar a fazer visitas periódicas a empresas.
Vai passar a ter um discurso mais virado para o investimento e os investidores.
Quanto à oposição:
O PSD tem a posição mais incómoda. Corre o sério risco de não ganhar as autárquicas e nem sequer recuperar algumas das principais Câmaras. Por isso, a ideia é – baixar expectativas. Tudo fazer para que, correndo mal, pareça no final que não correu assim tão mal.
O CDS tem a posição mais cómoda. Tem poucas Câmaras mas as que tem não vai perder. Joga forte em Lisboa. Estas autárquicas podem ser a consolidação de Assunção Cristas. A legitimidade popular de que ela precisa.
CRISE EM ITÁLIA?
Primeira nota – Até hoje falou-se pouco em Portugal do referendo em Itália. E mal. Um resultado negativo no referendo italiano pode ter consequências muito sérias.
Uma crise política, com a demissão do PM;
Eleições antecipadas, com a eventual vitória da extrema-direita;
Possibilidade da saída do Euro (que a extrema-direita defende);
Ou seja, consequências tão sérias ou mais sérias que o Brexit (é que a Itália, ao contrário do RU, faz parte do Euro).
Segunda nota – No mundo ocidental, hoje, cada referendo ou cada eleição passou a ser um susto ou uma dor de cabeça:
Foi assim nos EUA;
Foi assim no referendo britânico;
É assim nas eleições presidenciais na Áustria e em França; nas legislativas na Holanda e Alemanha.
O que é que tudo isto significa? MAIS INCERTEZA.
O mundo está carregado de incerteza. E o futuro da Europa é cada vez mais incerto;
Isto é mau para a política. O sistema político e partidário europeu está em crise e até em implosão. E o centro político vai desaparecendo.
E é mau para a economia – neste clima de incerteza, a Europa não cresce, perde competitividade e torna-se cada vez mais irrelevante à escala global.