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Jorge Marrão - Gestor 26 de Agosto de 2020 às 20:27

Como uma democracia se pode tornar totalitária?

Na América de Trump, a sociedade civil afasta-se da Casa Branca, rejeitando os seus atropelos à democracia. No Portugal de Costa, a sociedade civil é convidada a ir a São Bento, faz tréguas e assume compromissos institucionais.

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A FRASE...

 

"Aqui Trump não se safava."

Manuel Soares, Público, 26 de Agosto de 2020

 

A ANÁLISE...

No Portugal de hoje, não há lugar para o indivíduo, só há um lugar seguro: o do Estado. O psicólogo americano Bruno Bettelheim defendia, depois de ter passado por um campo de concentração, que o "nosso comportamento é mais ditado pelas circunstâncias do que pela personalidade". Para não se cair na loucura e na desintegração da personalidade, era necessário preservar uma zona de liberdade de pensamento, por mais insignificante que fosse. Desde que as circunstâncias se tornem excecionais, os comportamentos tornam-se imprevisíveis. Concluía que um bom alemão se podia assim tornar num carrasco.
 

A ansiedade individual ao aumentar com as crises, sendo o caso desta pandemia, promove as tentações totalitárias, isto é um cerco à mais pequena liberdade de pensamento e ação que sejam oposição ao poder instalado. Paralelamente, referia que "se os indivíduos são capazes de superar por si mesmos as suas angústias, constroem uma sociedade livre e democrática; se não o são, ou se consideram o esforço individual superior às suas possibilidades, são atraídos pela sociedade totalitária" (1989, Sorman, Guy, "Os verdadeiros pensadores do nosso tempo", Editorial Inquérito).

 

Ao lugar seguro do Estado acrescem os lugares daqueles que se ligam ao Estado, os da receção da distribuição dos recursos públicos (impostos) e os dos fundos europeus; os dos poderes e estatutos que se espalham pelos correligionários, simpatizantes e boys; os lugares das empresas e de redes de influência que navegam à boleia de leis, normas e regulamentos que protegem uns privados em detrimento de outros; os dos administradores regionais, locais e de freguesia que cumprem escrupulosamente os ditames do centro Estado, e que não se atrevem a defender o cidadão, para não comprometer o governo, e os das instituições que, parecendo que são duma sociedade civil independente, são atraídos pela longa manus estatal.

 

Na América de Trump, a sociedade civil afasta-se da Casa Branca, rejeitando os seus atropelos à democracia. No Portugal de Costa, a sociedade civil é convidada a ir a São Bento, faz tréguas e assume compromissos institucionais. Assim se vê a juventude da democracia portuguesa. Lendo alguns media e opinião publicada, apenas nós estamos em condições de dar lições à "concentração" democrática de Trump. Com a nossa prevalece o medo de existir. 

 

Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências diretas e indiretas das políticas para todos os setores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.

maovisivel@gmail.com

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