Opinião
George e a economia da pop
A música pop nunca foi inocente. Esteve sempre apaixonada pelo pecado. Fosse ele o sexo, as drogas ou o consumo económico desenfreado. Foi muitas vezes o reflexo de uma era ou o interruptor de mutações sociais e culturais que transformaram as sociedades.
A morte de George Michael, herói e besta destes tempos, ecoa estas décadas de transformações rápidas como a velocidade da luz. George Michael não era santo nem pecador: era um cantor brilhante e um exímio letrista sobre a idade do desejo. Foi sobre isso que sempre cantou.
Percebe-se porquê: George Michael irrompeu com os Wham nos tempos de Thatcher e de Reagan. A sua imagem era a típica desses anos em que o sucesso individual passou a ser glorificado, em que o início da globalização tornou fácil o êxito de um cantor em qualquer parte do mundo, em que o dinheiro jorrava de Wall Street ou da indústria discográfica como se não houvesse amanhã. Cantando o desejo, naufragando na luxúria, George Michael foi as duas faces desse mundo que criámos.
George Michael representou a era em que a juventude era a vanguarda do consumo de massas, iniciada nos anos de 1960 com a chegada do 45rpm e 33rpm que destronaram os frágeis discos de 78rpm e em que os rádios-transistores facilitaram o sucesso de grupos como os Beatles. A tecnologia ligava-se à cultura popular para dinamizar uma nova economia baseada no consumo extremo e no prazer absoluto.
George Michael foi uma das vozes de uma jovem Grã-Bretanha que se queria libertar dos anos cinzentos da depressão económica dos anos 60. A nova era global não apenas acelerou transacções financeiras: fez de cantores como ele heróis sem fronteiras.
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