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27 de Janeiro de 2021 às 19:25

As vacinas e o papel da política

Um conjunto de titulares de órgãos de soberania deveriam ser vacinados prioritariamente porque é importante que o Primeiro-Ministro possa tomar decisões sem estar na circunstância de não poder partilhar uma sala de reuniões com ninguém e que o líder da oposição possa exprimir as críticas que entenda a essas decisões sem estar entubado.

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Os titulares dos órgãos democráticos de decisão estão frequentemente na posição incómoda de terem de definir regras que são aplicáveis a si próprios, e assim à acusação de que estão a criar para si próprios privilégios injustos. A definição dos critérios de prioridade na vacinação contra a covid é apenas mais um desses casos, e a polémica em seu redor segue infelizmente um padrão comum aos últimos anos.

 

Devia ter sido evidente e assumido desde o princípio que um conjunto de titulares de órgãos de soberania deveriam ser vacinados prioritariamente. Não por desempenharem funções de especial risco (embora em muitos casos isso também aconteça) mas porque o regular funcionamento dos órgãos do poder democrático é essencial para a vida do país, incluindo o combate à pandemia. É importante que o primeiro-ministro possa tomar decisões sem estar na circunstância de não poder partilhar uma sala de reuniões com ninguém, e que o líder da oposição possa exprimir as críticas que entenda a essas decisões sem estar entubado.

 

O confinamento obrigatório do Presidente da República despertou em muitos a consciência do problema e levou a críticas sobre a ausência de titulares de cargos políticos na lista de prioridades. A recente definição de critérios (que, concedo, terá resultado num universo excessivamente alargado) levou a críticas no sentido inverso. Estas críticas incluíram tomadas de posição de alguns deputados na linha "não serei vacinado antes de vacinarem todos os velhinhos."

 

Há certamente muitos critérios possíveis para delimitar o universo dos "prioritários". Hoje de manhã já li cinco opiniões sustentando, como se se tratasse de evidência, que cinco outros critérios seriam preferíveis. Mais do que o concreto critério interessa-me a atitude dos que, sendo políticos eleitos e sem terem proposto em tempo critério alternativo, procuram agora explorar o filão da desvalorização da importância da atividade política.

 

A este propósito recordei-me do debate em torno da isenção de IMI que é aplicável aos partidos políticos relativamente aos prédios utilizados para as suas finalidades. É naturalmente fácil criticar o "privilégio" dos partidos, criado por eles próprios, através dos seus deputados eleitos. Contudo, olhando para a lei, vemos que a mesma isenção abrange também entidades religiosas, sindicatos, organizações patronais e profissionais, instituições de solidariedade e educação, associações desportivas e culturais - no fundo, todas as atividades de caráter social e sem fins lucrativos. O discurso de que os partidos não deveriam estar isentos - à época subscrito por BE e CDS - é simplesmente o discurso da desvalorização do papel da política, que seria então a única atividade com esta natureza a não merecer essa consideração por parte da lei. Colocando a atividade dos partidos abaixo do clube desportivo ou da associação recreativa, talvez se compre popularidade barata, mas não se contribui para a saúde da democracia.

 

Se alguns deputados entendem que o exercício de funções de soberania não tem qualquer importância, discordo. Se entendem que, no caso, só o PR e alguns membros do Governo deveriam ser vacinados, podiam tê-lo proposto (como é evidente, seria difícil o próprio Governo tomar uma decisão com esse conteúdo). Face ao critério que está em cima da mesa, sugiro que tomem a posição que entenderem: votem contra ele, proponham outro e forcem a respetiva votação. Foi para tomar parte da decisão coletiva que foram eleitos. A bravata individual de declinar a vacina é apenas mau exemplo de recusa individual de ser vacinado, que é tudo o que um plano geral de vacinação não precisa.

 

 

Professor de Direito

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