Opinião
Foi por isso que venci
"Nunca fui um talento. Fui sempre muito trabalhadora", comentou Inês Henriques ao sagrar-se campeã do mundo dos 50 quilómetros marcha, no domingo em Londres. Mas Inês Henriques não está só.
O senso comum conta histórias de atletas e profissionais excepcionais, os Ronaldos e Mozarts deste mundo, de génios nascidos para o que fazem. Mas a investigação científica indica outra realidade: não é conhecido nenhum caso de altíssima performance que tenha escapado a muitos e muitos anos de trabalho, exigente e focado em melhorar.
Ter jeito e gostar do que fazemos, evidentemente, ajuda. Treinamos mais, conseguimos bons resultados, motivamo-nos e praticamos mais ainda. Mas é só nesta última fase, quando praticamos mais do que os outros, quando continuamos a esforçar-nos além do bom, que as coisas excepcionais podem começar a acontecer.
Não é preciso ser-se "genial" para se ser o melhor do mundo, sugere o investigador Anders Ericsson na obra recente "Peak: Secrets from the New Science of Expertise". Pode mesmo ser vantajoso não ter vantagens à partida. Por exemplo, um estudo sobre xadrezistas de topo mundial concluiu que os melhores jogadores não são quem tem um QI - quociente de inteligência - mais elevado. Jogadores com QI medianos chegam às posições de topo e jogadores com QI elevados ficavam-se pelo meio da tabela. O facto é que muitos dos jogadores que não têm QI altos sentem que têm uma desvantagem e por isso esforçam-se mais, treinam mais horas, tentam inovar e acabam por vencer.
"Nunca fui um talento", disse Inês Henriques. Podia ter acrescentado, "foi por isso que venci."