Opinião
[674.] BMW M2
Primeiro pensei que o novo BMW M2 Coupé desafiava as leis do país, como o Código da Estrada e seus prudentes mas irritantes limites de velocidade.
A campanha apresenta-se com a frase "A desafiar as leis." Faço notar que o ponto está na própria frase: o carro desafia as leis. Ponto final. Parágrafo.
A imagem que o acompanha na publicidade e em movimento não deixam margens para dúvida a este respeito. O carro move-se mais veloz do que o Código da Estrada permite.
O contexto, porém, exime-o às leis e aos tribunais: o carro está num circuito automóvel, onde as leis não se aplicam. Mas a assinatura não se fica pelo desafio às leis. Depois de ponto final e parágrafo, lá vem a frase "Da física." Portanto, se excluirmos o ponto final e o parágrafo que serviram para criar uma certeza que afinal não era certa - uma ilusão de leitura - a frase única, resultando das duas que lá estão, é: "A desafiar as leis da física."
Daí o meu "uf!" inicial. O anúncio, bem vistas as coisas, não incita o observador a desejar desafiar as leis do seu país. Mas… por baixo das frase surge, em letras menores, novo texto: "Novo BMW M2 Coupé. Puro prazer de competir." Cá está! Afinal, os publicitários quiseram mesmo sugerir ao observador o excesso de velocidade! Se o carro não é só para usar nos circuitos automóveis com impunidade legal, os publicitários querem-no a "competir" nas estradas! Afinal não é "uf!", é "paf!"
O vídeo da campanha chama-se em português "Tente seguir a Gigi Hadid". Tive de procurar, para saber que Gigi não se relaciona com aquele senhor do restaurante numa praia do Algarve, mas que é um "modelo internacional", isto é, um modelo que aparece em campanhas de marcas globais.
"Consegue manter os olhos na Gigi?", pergunta a voz off enquanto Gigi avança para um carro. Trata-se de um desafio, lá está, um jogo: o observador terá de tentar manter os olhos na Gigi. Ela entra num de cinco M2 que se lançam em corrida desenfreada, desafiando a velocidade num tal circuito para testes automobilísticos.
Como os cinco carros entram à compita, passando uns em frente dos outros, ficamos com dificuldade em perceber em qual deles segue a nossa Gigi. Em poucos segundos, depois de percorrerem centenas de metros (ai!, as leis da física!), os carros alinham-se e a voz off pergunta-nos em inglês: "Então, em qual deles está ela?" Por baixo, aparecem cinco quadrados, com os números 1 a 5 no interior, convidando o observador a interagir, participando no passatempo.
A pergunta da voz aparece no final escrita em português em boa versão: "Sabe em que automóvel ela está, certo?" Induz a pensar não só em qual dos cinco carros concretos está a nossa Gigi mas também a responder mentalmente "num BMW M2". Quando, por baixo, o texto ordena "escolha o BMW M2 da Gigi" está na realidade a dizer "escolha um BMW M2", pois na imagem não há nenhuma outra marca ou modelo.
Este anúncio baseia-se, portanto, numa adivinha em forma de passatempo. É como o jogo da bolinha, em que alguém esconde um berlinde debaixo de um copo e depois move três recipientes muito rapidamente, obrigando o observador ao esforço de perceber em qual está escondida a bolinha. Em inglês, o jogo tem vários nomes, como "shell game" ou "thimblerig", sendo "thimblerigger" o jogador da bolinha, mas também sinónimo de vigarice, pois houve no passado houve gangues deste jogo, nas ruas, que enganavam os jogadores transferindo por truque a bolinha do copo original para outro. Mas não vamos por aí. Fiquemo-nos pela essência do jogo: tentar iludir o observador através dos movimentos rápidos - desafiando as leis da física e da óptica. Um pouco como a publicidade.
Coluna semanal à quinta-feira
A imagem que o acompanha na publicidade e em movimento não deixam margens para dúvida a este respeito. O carro move-se mais veloz do que o Código da Estrada permite.
Daí o meu "uf!" inicial. O anúncio, bem vistas as coisas, não incita o observador a desejar desafiar as leis do seu país. Mas… por baixo das frase surge, em letras menores, novo texto: "Novo BMW M2 Coupé. Puro prazer de competir." Cá está! Afinal, os publicitários quiseram mesmo sugerir ao observador o excesso de velocidade! Se o carro não é só para usar nos circuitos automóveis com impunidade legal, os publicitários querem-no a "competir" nas estradas! Afinal não é "uf!", é "paf!"
O vídeo da campanha chama-se em português "Tente seguir a Gigi Hadid". Tive de procurar, para saber que Gigi não se relaciona com aquele senhor do restaurante numa praia do Algarve, mas que é um "modelo internacional", isto é, um modelo que aparece em campanhas de marcas globais.
"Consegue manter os olhos na Gigi?", pergunta a voz off enquanto Gigi avança para um carro. Trata-se de um desafio, lá está, um jogo: o observador terá de tentar manter os olhos na Gigi. Ela entra num de cinco M2 que se lançam em corrida desenfreada, desafiando a velocidade num tal circuito para testes automobilísticos.
Como os cinco carros entram à compita, passando uns em frente dos outros, ficamos com dificuldade em perceber em qual deles segue a nossa Gigi. Em poucos segundos, depois de percorrerem centenas de metros (ai!, as leis da física!), os carros alinham-se e a voz off pergunta-nos em inglês: "Então, em qual deles está ela?" Por baixo, aparecem cinco quadrados, com os números 1 a 5 no interior, convidando o observador a interagir, participando no passatempo.
A pergunta da voz aparece no final escrita em português em boa versão: "Sabe em que automóvel ela está, certo?" Induz a pensar não só em qual dos cinco carros concretos está a nossa Gigi mas também a responder mentalmente "num BMW M2". Quando, por baixo, o texto ordena "escolha o BMW M2 da Gigi" está na realidade a dizer "escolha um BMW M2", pois na imagem não há nenhuma outra marca ou modelo.
Este anúncio baseia-se, portanto, numa adivinha em forma de passatempo. É como o jogo da bolinha, em que alguém esconde um berlinde debaixo de um copo e depois move três recipientes muito rapidamente, obrigando o observador ao esforço de perceber em qual está escondida a bolinha. Em inglês, o jogo tem vários nomes, como "shell game" ou "thimblerig", sendo "thimblerigger" o jogador da bolinha, mas também sinónimo de vigarice, pois houve no passado houve gangues deste jogo, nas ruas, que enganavam os jogadores transferindo por truque a bolinha do copo original para outro. Mas não vamos por aí. Fiquemo-nos pela essência do jogo: tentar iludir o observador através dos movimentos rápidos - desafiando as leis da física e da óptica. Um pouco como a publicidade.
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