Opinião
Regularização do IVA nos incobráveis
A regularização do IVA nos incobráveis é um tema recorrente de dúvidas e discussão entre os operadores económicos e contabilistas. O objetivo deste artigo é, em linguagem simples e sintética, tentar fazer alguma luz sobre esta matéria e alertar para as novidades em matéria fiscal.
Para melhor se entender qual o significado da regularização do IVA é necessário entender a mecânica deste imposto - imposto sobre o valor acrescentado. O IVA é um tributo que incide sobre o consumo e que se aplica ao longo da cadeia produtiva, sendo também apelidado de imposto plurifásico.
Os operadores liquidam imposto aos adquirentes, os quais exercem o direito à dedução, recaindo o encargo no consumidor final ou nos sujeitos passivos sem direito à dedução.
A liquidação do IVA é efetuada na emissão da fatura e não no pagamento, pese embora seja possível a opção pelo regime de IVA de caixa.
A regularização do IVA prevista no artigo 78.º e seguintes do Código do IVA permite ao credor deduzir a seu favor o imposto que liquidou e entregou nos cofres do Estado, mas que não recebeu.
Nos créditos incobráveis elencamos as situações em que é possível a regularização a favor do credor:
• Processo de execução, após o registo a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 717.º do Código do Processo Civil;
• Processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado, após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, quando exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do mesmo Código;
• Processo especial de revitalização (PER), após homologação do plano de recuperação pelo juiz, previsto no artigo 17.º-F do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE);
• Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), após celebração do acordo previsto no diploma que aprovou este procedimento.
No processo de execução, o registo informático das execuções apresenta a lista das execuções terminadas ou suspensas por não terem sido encontrados bens penhoráveis. Só após este registo é que a execução pode servir para a regularização do IVA, para créditos vencidos após 1 de fevereiro de 2013.
Insolvência de caráter limitado e caráter pleno
No processo de insolvência, o credor só pode regularizar o IVA a seu favor quando esta for decretada de caráter limitado, após trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos. Ou quando exista a homologação do plano de recuperação, objeto de deliberação prevista no Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Quando a insolvência do devedor é decretada de caráter limitado, porque não existe massa insolvente a gerir, os credores podem regularizar o IVA após o trânsito em julgado desde que possuam a certidão judicial com estes elementos. Na insolvência de caráter limitado não há lugar à reclamação dos créditos.
Quando a insolvência do devedor é decretada de caráter pleno, os credores podem regularizar o IVA a seu favor, após trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação dos créditos, nas situações em que o devedor é liquidado ou após a homologação do plano de recuperação.
E aqui há uma novidade que, uma vez mais, vem penalizar o credor.
Até 2015, a regularização do IVA era possível «dentro do processo de insolvência» quando já era possível conhecer os créditos reclamados no prazo legal e reconhecidos pelo administrador da insolvência. A regularização podia ser efetuada com a homologação da deliberação de liquidação ou manutenção do devedor.
Após 2015, o momento da regularização do IVA só ocorre com o trânsito em julgado, findo o processo, apesar da Autoridade Tributária sempre ter tido esse entendimento, ou seja, a regularização só será possível muito mais tarde.
No plano especial de revitalização (PER), o momento da regularização do IVA ocorre com a aprovação do plano de recuperação (após a conclusão das negociações) e respetiva homologação pelo juiz. Nestes processos, a Autoridade Tributária entende que apenas se pode regularizar o IVA da divida perdoada.
No SIREVE, mecanismo sem intervenção judicial, o credor apenas pode recuperar ou regularizar o IVA a seu favor após a celebração do acordo previsto no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 178/2012.
A acrescer a todos estes formalismos, o Código do IVA exige ainda a intervenção de um revisor oficial de contas a avalizar todos os procedimentos. A Autoridade Tributária entende que não é exigível a intervenção do ROC quando os requisitos de incobrabilidade se verificaram até 31 de dezembro de 2013.
Um dos aspetos, entre muitos, a ter em conta em todos estes meandros jurídicos, é o prazo para o exercício do direito à regularização do IVA dos incobráveis que é de dois anos (para créditos vencidos após 1 de janeiro de 2013) a contar do primeiro dia útil do ano seguinte ao do nascimento do direito à dedução, não se aplicando, nestes casos, o prazo geral de quatro anos.
Demasiados entraves, demasiadas medidas de salvaguarda quando os credores são, na esmagadora maioria, micro, pequenas e médias empresas sem os recursos nem o apoio jurídico necessário para acompanhar estes processos jurídicos, com efeito dissuasor ao exercício de um direito.
Consultor da OTOC
Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico