Opinião
"It´s still a man's world"
Esta é a questão mais crítica: a grave falta de transparência nos critérios de qualificação dos administradores das empresas. E para que isto se modifique, o equilíbrio de género não pode ser regulado de forma isolada.
E quem diz o contrário mente.
O princípio da igualdade de género constitui um dos princípios fundamentais não só da nossa Constituição, mas também da União Europeia, tendo sido consagrado pela primeira vez no Tratado de Roma em 1957, onde se previa já o princípio da igualdade de remuneração entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
Passados estes anos:
• Nos conselhos de administração das empresas cotadas em bolsa, apenas 12% dos cargos de administração são ocupados por mulheres;
• 13 dessas empresas não têm uma única mulher nos seus conselhos de administração ou de supervisão;
• No setor empresarial do Estado apenas 28% dos membros do conselho de administração são mulheres;
• As mulheres representam 58,6% dos licenciados em Portugal, mas representam somente 9% dos membros dos conselhos de administração das empresas portuguesas.
Contra factos não há argumentos: vivemos uma aparente igualdade inquinada por séculos de História e desvantagens culturais que é necessário combater através de uma legislação discriminatória, pela positiva.
Com o amadurecimento da sociedade surgem mudanças civilizacionais, acompanhadas por alterações legislativas, que permitem o bem-estar universal sem olhar a géneros. É neste contexto, rumo à maturidade, que entra em vigor a Lei n.º 62/2017, que promove uma representação mais equilibrada entre homens e mulheres nos conselhos de administração do setor empresarial do Estado e das empresas cotadas. Esta lei representa um avanço extraordinário, no sentido de alterar mentalidades na esperança de que, de uma vez por todas, se eliminem os obstáculos à participação das mulheres nos conselhos de administração.
Porque quem perde é a sociedade, não as mulheres, mas todos nós. A insuficiente utilização das competências de mulheres altamente qualificadas representa uma oportunidade perdida pelas empresas. Em termos de governo e potencial de crescimento económico.
O correto funcionamento do mercado de trabalho para cargos de direção e administração está ainda comprometido. O problema reside na persistência de vários obstáculos ao percurso de mulheres com as qualificações mais do que necessárias para desempenhar cargos nos conselhos de administração, numa cultura empresarial dominada por homens e na falta de transparência nas nomeações para cargos decisivos.
Esta é a questão mais crítica: a grave falta de transparência nos critérios de qualificação dos administradores das empresas. E para que isto se modifique, o equilíbrio de género não pode ser regulado de forma isolada. Deve ser enquadrado num regime geral de critérios de adequação de membros de órgãos sociais, como a idoneidade, a qualificação, a competência e experiência necessárias para o desempenho de funções no setor em questão, explorando de forma otimizada os talentos dos candidatos, independentemente do género.
Espera-se que, com esta evolução civilizacional, tão brevemente quanto possível e sem imposições legais, os cargos venham a ser atribuídos não só com respeito pelo princípio da igualdade, mas essencialmente por mérito. O contrário tem necessariamente um impacto negativo nas empresas.
Por último, tenho de referir: tenho o privilégio de poder trabalhar numa sociedade de advogados que no ano passado promoveu quatro novos sócios, dos quais três mulheres, e em que o conselho de administração é admiravelmente presidido por uma outra mulher.
"It´s a man's world." Mas sem quaisquer imposições legais, a igualdade de género já entrou nalgumas portas.
Advogada
Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico