Opinião
A democracia e a crise de saúde pública
Mas o 25 de abril não se suspendeu... Mais do que discutir o funcionamento de um órgão de soberania, lembremos, numa altura sem precedentes em que estamos longe uns dos outros, que foi abril que nos deu a resposta para o que vivemos hoje…
Vivemos um momento sem precedentes na nossa democracia. Um vírus sem rosto, que não distingue ninguém, colocou-nos a todos em alerta e fez de cada um de nós um executor do bem comum.
Portugal, aliás, os portugueses estão de parabéns. A capacidade de adaptação a uma realidade de isolamento social fez de cada um dos portugueses um executor de políticas públicas, mas sobretudo faz dos portugueses um exemplo de perseverança e responsabilidade.
E enquanto avançamos com a nossa democracia neste ténue equilíbrio entre a limitação, necessária, de alguns dos nossos direitos e a definição de apoios para os que viram a sua vida diretamente afetada por este fenómeno, há um elemento crucial que se impõe – a Democracia e a Liberdade não estão suspensas.
Fez o acaso fazer coincidir esta fase de confinamento mais restritivo, assente num Estado de Emergência que estávamos longe de imaginar que teria de ser decretado, com a evocação de abril, com a evocação da nossa democracia e liberdade.
E de repente muitas vozes se levantaram contra a sua evocação presencial pela Assembleia da República. Como se de uma novidade se tratasse, alguns partidos levantaram a voz contra a sessão plenária, da mesma forma que levantaram a sua voz contra o funcionamento do Parlamento.
Totalmente legítimo! Não fosse a liberdade de expressão uma das conquistas de abril…
Mas é também legítimo lembrar o motivo pelo qual é crucial a realização de uma reunião plenária nesse dia.
Tal como muitos profissionais que continuaram a trabalhar para garantir os serviços essenciais à sociedade, também as entidades com responsabilidades executivas e com responsabilidades na definição de políticas publicas mantiveram a sua atividade, adaptadas às regras definidas pela DGS.
Autarcas, Governo, Parlamento e muitas outras entidades públicas responsáveis por implementar a estratégia de combate a esta crise de saúde pública e económica, têm dado o seu contributo para ultrapassar esta fase com o mínimo de consequências possíveis.
Não se trata de qualquer ato de altruísmo, trata-se sim da responsabilidade que é devida pela assunção destas mesmas competências.
E por isso, evocar o 25 de abril de 1974 na casa da democracia não será uma exceção à regra definida até agora…
O Parlamento é a casa representativa de todos os portugueses. É aqui que devemos evocar a sua memória, ainda tão presente em cada momento em que esta casa é chamada a pronunciar-se.
E se há questão que devemos lamentar é o facto de, ao contrário de outros anos, não termos a possibilidade de celebrar este dia, com a vivacidade a que os portugueses nos acostumaram. Fruto do isolamento social que ainda nos é devido, não teremos as gerações reunidas, de cravo ao peito, a celebrar na rua a liberdade e a democracia que hoje nos permite concordar e divergir, protestar e debater.
Mas o 25 de abril não se suspendeu... Mais do que discutir o funcionamento de um órgão de soberania, lembremos, numa altura sem precedentes em que estamos longe uns dos outros, que foi abril que nos deu a resposta para o que vivemos hoje…
Foi abril que nos deu as bases para hoje, coletivamente, trabalharmos em prol da nossa comunidade. Façamo-lo em prol do bem comum!
Jurista e deputada do PS