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Carlos Almeida Andrade - Economista 17 de Dezembro de 2015 às 20:05

Que opções para o crescimento?

Em Portugal, o debate político mais visível em torno do crescimento económico tende a centrar-se muito no papel da política orçamental. Mais consumo e investimento públicos, defendem alguns, é a receita necessária para aumentar o rendimento das famílias e, assim, conseguir um crescimento económico mais forte.

Claro que, quando falamos de crescimento, no sentido de um aumento real e sustentado da capacidade geradora de rendimento de uma economia, que se traduza em ganhos efectivos de bem-estar ao longo do tempo, deveríamos centrar a nossa atenção em outro tipo de políticas. A política orçamental deve ser enquadrada no contexto das políticas de estabilização, i.e. da procura de alguma atenuação dos efeitos dos ciclos económicos, e não no contexto das políticas de crescimento, ainda que uma política orçamental sã deva ser vista, obviamente, como uma condição necessária para o crescimento. A este propósito, é sempre bom notar que, em Portugal, ao longo das últimas duas décadas, a insistência cega em políticas orçamentais expansionistas foi acompanhada por uma tendência descendente do crescimento.

 

Assim, quando falamos de políticas que fomentem o crescimento económico, deveríamos falar, entre outras, de dimensões como a educação, a investigação científica e a qualidade das instituições, neste caso abrangendo aspectos como a justiça, o grau de corrupção, os respeito pelos direitos de propriedade, o funcionamento eficiente e transparente dos mercados, um sistema fiscal justo, eficiente e amigo do investimento, a garantia de igualdade de oportunidades, etc.

 

É importante, por exemplo, ter mercados menos esclerosados, menos dominados por interesses especiais e mais abertos a uma concorrência justa. Neste sentido, alguns desenvolvimentos recentes podem ser vistos como preocupantes, do ponto de vista da promoção do crescimento da economia portuguesa a médio e longo prazo. Contam-se, entre estes, os sinais e os incentivos criados pela abolição dos exames do 4º ano, mesmo com a sua substituição por exames de "aferição"; a perspectiva de abolição futura dos exames do 6º e 9º ano; o abandono da prova de avaliação dos professores, sem perspectiva de qualquer forma alternativa de avaliação; a cedência a uma instrumentalização política dos transportes públicos; e o abandono do grupo dinamarquês Maersk (o maior grupo armador mundial) das operações no porto de Lisboa - o segundo grande operador a tomar esta decisão - em resposta ao prolongamento de um quadro laboral disfuncional no sector, associado à protecção de interesses especiais.

Em maior ou menor grau, todos estes desenvolvimentos reflectem a ideia - ainda muito presente em Portugal - de que a protecção de interesses e privilégios particulares se sobrepõe a um quadro concorrencial aberto e transparente. Impede-se, assim, que as oportunidades sejam iguais para todos; que o esforço e o trabalho sejam recompensados; e que a procura de qualidade no trabalho e na educação beneficie a sociedade e a economia como um todo.

 

O caso da educação é particularmente relevante, tendo os exames sido abolidos sob argumentos falsos de que os alunos seriam violentados e os professores diminuídos (falo com experiência própria). É uma ilusão pensar que a avaliação não faz parte do processo de aprendizagem. E é um absurdo achar que a "felicidade" e a "alegria" de um aluno dependem de não ser testado e avaliado. Pelo contrário, feliz e realizado será um aluno que sente que aprendeu e ultrapassou obstáculos, preparando-o para a vida e qualificando-o para dar um contributo para a sociedade.

Os defensores da abolição dos exames defendem que quem melhor pode avaliar os alunos são os professores que os acompanham. Mas quem avalia os professores? Aparentemente, ninguém o fará. Caminhamos, então, para uma situação em que não só os alunos não são avaliados de forma independente ("aferir" não é avaliar), como os seus avaliadores - os professores - poderão fazer um bom ou mau trabalho, sem que isso faça qualquer diferença.

A este propósito, seria importante ter em conta os resultados apresentados, há poucos dias, no Banco de Portugal, pelo Prof. Eric Hanushek, da Universidade de Stanford: (i) uma melhoria na qualidade da educação, medida pelos testes PISA da OCDE (desempenho em matemática, ciência e leitura dos alunos de 15 anos), tem uma forte correlação com o crescimento económico; (ii) uma subida de cerca de 15 posições no "ranking" dos testes (para uma posição próxima, por exemplo, da Polónia) poderia resultar, a longo prazo, num aumento médio de 15% nos salários; (iii) gastar mais dinheiro não garante melhores resultados; estes podem ser obtidos através de outros factores, incluindo precisamente a avaliação dos professores e a actuação sobre os respectivos resultados (por exemplo substituindo os piores professores). Infelizmente, parece que nos estamos a afastar deste caminho.

 

Economista

 

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