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2016: distribuir o que não se cria dá mau resultado 

Há três condições básicas para o empobrecimento dos povos. A primeira é quando se concentram no curto prazo em detrimento do médio e longo prazo.

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A segunda acontece quando se esquecem que não é possível distribuir o que não se cria. A terceira sucede quando ignoram que a poupança é um pressuposto fundamental do crescimento económico.

 

Qualquer um destes critérios, que são endémicos na sociedade portuguesa, acentuaram-se no ano que passou. A ilustrar o primeiro caso está o facto de não se conhecer, no acordo político entre PS, PCP e Bloco de Esquerda, nenhuma reforma estrutural da economia. Pelo contrário, as medidas são tomadas como se fosse um Governo de horizonte curto. Seja na receita (o imposto sobre o património era para ser de 0,3% acima dos 600 mil euros e acabou em 0,7% acima desse valor), seja na despesa: o Governo prometeu tudo e mais alguma coisa e termina o ano a congelar, indiscriminadamente, 1.600 milhões de euros.

 

É verdade que esse congelamento teve efeitos benéficos: evitou o agravamento dramático do défice orçamental e da dívida. Mas não valia a pena que, em vez de congelamentos, houvesse um plano global de corte de despesa para os próximos quatro anos?

 

O segundo ponto foi por demais evidente em 2016. O Governo resolveu distribuir este mundo e o outro em sete meses (leia-se reduzir a sobretaxa, reverter cortes de pensões e de salários), sem esquecer a reversão das privatizações e o aumento do número de funcionários do Estado (integração de "precários" na função pública). Este último ponto é exemplificativo da curteza de vistas da política seguida. PS, PCP e Bloco dizem que o Estado não vai gastar mais. Não é verdade. E, pior, vai criar obrigações legais que dificultam a redução de funcionários num próximo (e provável) resgate da República.

 

O terceiro ponto é crítico. A poupança é uma condicionante-chave do crescimento económico: é a poupança que financia o investimento. Ora essa poupança está no nível mais baixo da democracia (em 2016 chegou a ser negativa!). E em vez de tentar inverter a tendência, o Governo joga tudo no consumo. É certo que fala em investimento, mas os números são elucidativos: o investimento pesa 15% no PIB contra quase o dobro há 20 anos…

 

Em termos teóricos, o Governo diz que se estimular a economia, o consumo sobe e com ele o crescimento. Só que essa argumentação falha no "acid test", como se viu pelos últimos meses de António Costa (para não recordar a ponta final do Governo de José Sócrates): o crescimento económico de 2016 acaba abaixo de 2015. Apesar do aumento do consumo…

 

Os críticos desta visão pessimista (da atual governação) costumam dizer que os indicadores económicos fundamentais não a caucionam. Suspeito de que lhes falta acrescentar a essa argumentação o advérbio de modo "aparentemente". E lembrar-lhes as palavras de um economista que conhecia bem Portugal e os países do Sul da Europa, Rüdiger Dornbusch (tradução livre): "Na economia, as coisas demoram mais tempo a acontecer do que pensamos; mas quando acontecem, acontecem mais depressa do que pensávamos." O leitor ficou a pensar (por exemplo) numa inversão do movimento das taxas de juro, que poria o país novamente à beira da bancarrota? Pensa bem…

 

Jornalista

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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