Opinião
A recuperação económica das regiões devastadas pelo fogo
Assim, para compensar o aumento de despesas e redução das receitas que implicarão as tragédias de Junho e Outubro, impõe-se reverter as medidas iniciais de redução de receitas e aumento de despesas face ao verificado em 2017.
Os governantes (primeiro-ministro, ministro e secretário de Estado da Administração Interna) lançaram várias ideias que são de aproveitar e levar a sério. Primeiro, as populações têm de se defender elas próprias (secretário de Estado). Segundo, as populações têm de ser mais resilientes (ministra). Terceiro, mais tragédias como estas vão voltar a acontecer (primeiro-ministro). Juntando tudo: o Estado, através dos seus representantes, declara-se incapaz de acorrer às populações e incita-as a tomar a iniciativa.
Estas afirmações foram em geral mal vistas, mas contêm em si uma ideia importante e válida: é necessário confiar nas populações para resolver os problemas locais, porque o Estado não lhes sabe valer. Desta ideia devem tirar as devidas consequências.
Considerando apenas a recuperação económica - deixando para os respectivos especialistas a questão prioritária e vital da organização e comando da Protecção Civil - há 3 pontos a sublinhar. Primeiro, as medidas para a recuperação das regiões afectadas. Segundo, a questão da mitologia dos efeitos nocivos do eucalipto. Terceiro, a alteração da proposta do OE 2018.
Confiar nas populações
Além das ajudas imediatas de compensação pelas perdas causadas, deveriam ser criadas zonas económicas especiais nos concelhos afectados onde se implementaria imediatamente - para entrar em vigor já em 2018 e para valerem nessas regiões por um período mínimo de 20 anos - as seguintes quatro medidas:
1) Isenção das taxas de IRC, IMI e de todos os impostos e taxas sobre o património;
2) Redução para 1/4 das taxas actuais taxas do IRS e do IVA em vigor no restante território nacional;
3) Nenhum organismo de Estado poderá exigir ao cidadão informação, documento ou comprovativo já existentes nos seus arquivos ou de qualquer outro organismo do Estado;
4) As autorizações e licenciamentos serão automaticamente concedidas mediante simples declaração do interessado que se comprometa a cumprir todos os preceitos e regulamentos existentes.
Confiar na ciência: abandonar a eucaliptofobia
O relatório independente sobre a tragédia de Junho - que o Governo declara adoptar na sua acção - alinha na histeria eucaliptofóbica, embora não se canse de apelar à aplicação do conhecimento nas reformas a empreender. Pena que os autores não apliquem a si próprios tão sábio conselho, bebendo no que melhor se investigou sobre a matéria. Não se pode omitir a melhor investigação dos nossos agrónomos e silvicultores e entrar por derivas ideológicas nocivas para a economia nacional. Neste contexto - por ser um marco e uma referência internacional - devem recordar-se experiências do Prof. Mariano Feio que evidenciou de forma concludente a falta de fundamento da histeria antieucalipto.
Para os distraídos: Mariano Feio (1914-2001), investigador, agricultor, engenheiro, estudou não apenas no gabinete, mas na prática, fez da sua Herdade do Outeiro de 1.220 hectares, dos quais 90 ha de eucaliptais, em Ferreira do Alentejo, um laboratório de investigação. Produziu conhecimento fundamental, que verteu em livro(1), baseado em reflexões teóricas e experimentação amplamente reconhecidas internacionalmente. Os seus resultados contrariam a mitologia da nocividade do eucalipto. Pena que a universidade a quem doou a herdade-laboratório e a biblioteca não venha - nestas ocasiões - fazer justiça e lembrar os contributos científicos do seu benemérito.
A proposta de OE 2108: não ceder ao aumento do deficit
A proposta original de OE 2018, que mal deu entrada na AR, conseguia, com algum contorcionismo, um certo equilíbrio num contexto que fosse de recuperação económica interna e externa.
A proposta original não tem margem de precaução para situações como a presente. A tentação é para quebrar os equilíbrios, apesar de tudo conseguidos, e ultrapassar largamente o deficit orçamentado. A condescendência das instituições europeias não vai ser difícil de obter. Mas é outro o interesse do futuro da economia portuguesa que passa antes por não ultrapassar o deficit inicialmente previsto.
Assim, para compensar o aumento de despesas e redução das receitas que implicarão as tragédias de Junho e Outubro, impõe-se reverter as medidas iniciais de redução de receitas e aumento de despesas face ao verificado em 2017.
(1)Mariano Feio, "A Reconversão da Agricultura e a Problemática do Eucalipto", Associação Central da Agricultura Portuguesa, 1989, Lisboa.
Economista e professor no ISEG