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29 de Maio de 2017 às 20:14

A prova de estafetas

Há com certeza espaço para cada um de nós criticar a forma como o défice foi sendo reduzido, a velocidade dessa redução ou a incidência da mesma.

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Nas provas de estafetas, cada atleta percorre uma distância para entregar o testemunho ao atleta seguinte, a quem compete percorrer outra distância semelhante até entregar o testemunho ao atleta subsequente, e assim sucessivamente até que o último atleta chega à meta. No fim, toda a equipa festeja, do primeiro ao último atleta: a vitória foi de todos, o testemunho não chegou à meta por teletransporte.

 

Vem isto a propósito da saída de Portugal do Procedimento por Défice Excessivo, uma excelente notícia que foi saudada por todos os partidos responsáveis (ou seja, todos menos os partidos que apoiam o PS no Governo).

 

Não caberia pela cabeça de ninguém saudar e celebrar apenas o esforço deste último ano e meio, esquecendo, omitindo, minimizando, o esforço que foi feito desde 2011 pelo anterior governo, que então encontrou um défice superior a 10%. Mas passou pela cabeça do PS, como se apenas o último atleta da estafeta tivesse o mérito da vitória por ter sido ele a cortar a meta.

 

Ora, o défice não passou diretamente, de um ano para o outro, e graças a este Governo, de mais de 10% para menos de 3%. Houve um trabalho contínuo, desde 2011, nesse sentido, e que foi resultando numa sucessiva redução do défice. Há com certeza espaço para cada um de nós criticar a forma como o défice foi sendo reduzido, a velocidade dessa redução ou a incidência da mesma. O que não há é espaço algum para se dizer que, se não fosse este Governo, Portugal não teria saído do Procedimento por Défice Excessivo.

 

O recente artigo do ministro das Finanças no Público é todo um exemplo desta forma de fazer política, a de esquecer os governos anteriores, a de querer fazer mérito exclusivo seu o que de bom existe. Na verdade, o ministro desfia um rol de bons indicadores esquecendo-se de apresentar séries longas, esquecendo-se de dizer que a redução do défice, a redução do desemprego, a diminuição das taxas de juro ou a trajetória de crescimento, entre outros feitos destacados no artigo, começaram antes dele e do seu trabalho. É o último atleta a querer ficar com os méritos esquecendo-se de quem lhe passou o testemunho.

 

Esta forma de fazer política, que é transversal ao nosso sistema partidário, é prejudicial ao país e afeta a credibilidade dos políticos.

 

Prejudicial, desde logo, porque obriga ou força os governos a reverter só porque sim, a desfazer só porque sim, a recomeçar do zero só porque sim. Perde-se tempo e dinheiro e massa crítica e nunca saímos do estado do recomeço. Se um governo é incapaz de reconhecer os méritos do anterior, deixar o que está bem feito, assumindo-o, e mudar apenas o que há a mudar, nunca mais nos preparamos para vencer num mundo global. E mesmo que as políticas não se revertam, elas são revertidas no discurso, só para disfarçar, impedindo o país de criar um corpo consensualizado de políticas.

 

Afeta a credibilidade dos políticos, porque nos transforma em meros peões de combate. Como poderemos cativar pessoas para a política, como poderemos aproximar eleitos de eleitores, se aquilo que lhes apresentamos é a impossibilidade do consenso, do entendimento, se aquilo que lhes oferecemos é a divisão do mundo entre bons e maus?

 

Talvez por isso nunca me tenha passado pela cabeça deixar de fora os méritos dos governos anteriores quando chamado a comentar o crescimento do turismo em Portugal, por mais convencido que estivesse, e estou, do decisivo contributo da radical alteração no modelo de promoção de Portugal e do intenso processo de simplificação e liberalização que tive a honra de liderar.

 

Advogado

 

Este artigo está em conformidade com o novo acordo ortográfico

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