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Do corte da perspectiva aos avisos sobre a dívida, o que a Fitch tem dito sobre Portugal

A Fitch é a primeira agência a ter a opção de decidir sobre o “rating” de Portugal após a saída do Procedimento dos Défices Excessivos. Tem reconhecido a melhoria das finanças públicas mas alertado para o elevado nível da dívida.

16 de Junho de 2017 às 06:50
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Entre as três maiores agências de "rating", a Fitch foi a que esteve mais perto de retirar Portugal da classificação vista como "lixo" pelos mercados. Entre Abril de 2014 e Março de 2016 teve o "rating" de BB+ com perspectiva positiva, o que indiciava a possibilidade de fazer uma melhoria da classificação. Os últimos comentários da agência têm sinalizado que vê alguns progressos, mas que se mostra cautelosa com o elevado nível da dívida. Como tem evoluído a análise da Fitch sobre Portugal?

11 Abril de 2014: Perspectiva sobe para positiva

A Fitch melhorou a perspectiva para positiva com um "rating" de BB+, o primeiro nível de "lixo". Na base da decisão de atribuir um "outlook" favorável, os analistas Michele Napolitano e Enam Ahmed destacaram "o bom progresso na redução do défice orçamental" e "a recuperação da economia portuguesa".

Salientaram que o défice de 4,5% em 2013 ficou abaixo da meta de 5,5% do programa de assistência financeira. E que apesar da contracção de 1,4% da economia nesse ano, essa queda foi inferior ao estimado (-1,8%). Sublinharam ainda os dados do PIB do quarto trimestre de 2013, que teve uma subida em termos anuais de 1,6%, a primeira melhoria trimestral desde o quarto trimestre de 2010.  Isso levou, na altura, a Fitch a rever em alta as estimativas para o crescimento nos anos seguintes.

Apesar de considerar que as condições de financiamento tinham melhorado, na altura a Fitch sugeria que Portugal solicitasse uma linha cautelar após a saída do programa de assistência. Já em relação ao rácio da dívida sobre o PIB, a agência notou "uma melhoria marginal". E esperava que o endividamento do Estado tivesse atingido o pico em 2013, com um rácio de 129% do PIB que fosse diminuindo de forma gradual até 2020 para 115% do PIB.

4 de Março de 2016: Solução de governo e défice justificaram descida da perspectiva

Depois de quase dois anos sem concretizar a perspectiva positiva numa subida do "rating", algo que não é muito usual, a Fitch decidiu baixar o "outlook" para estável, alinhando-o com o da S&P e da Moody’s. Na base da decisão, os analistas Federico Barriga Salazar e Douglas Winslow enumeraram factores relacionados com o défice, com a dinâmica da dívida pública e com a solução governativa que surgiu após as Legislativas de 2015.

"O desempenho orçamental de 2015 ficou bem fora da meta, com um défice estimado de 4,2% do PIB comparado com a expectativa inicial de 2,7%", referia a agência. Esse número foi agravado com o custo de 2.200 milhões de euros com o Banif. Mas a Fitch salientou que excluindo esse valor, o défice ficaria acima de 3% o que levaria a que Portugal não saísse do PDE [procedimento dos défices excessivos]. Considerou que a redução do défice estava a ser sustentada com "um crescimento moderado em vez de medidas estruturais".

A Fitch considerava ainda que a meta do défice de 2,2% para 2016 "estava em risco", já que considerava que estava "baseada em pressupostos optimistas sobre o crescimento económico". Referia também que as reversões de algumas políticas teriam dificuldade em ser compensadas e assumia um défice de 2,8% para 2016. Portugal acabaria 2016 com um défice de 2%.

A agência justificou ainda a descida da perspectiva com a solução governativa. "Mantemos a visão de que o governo liderado por António Costa irá manter uma abordagem pró-europeia. Mas, equilibrar os compromissos das regras orçamentais da União Europeia e as exigências do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista é difícil, aumentando consideravelmente os riscos políticos no curto prazo", defendia a Fitch. E apontava a necessidade de implementar mais medidas de austeridade ao longo de 2016 ou a negociação do Orçamento para 2017 como um potencial ponto de ruptura da coligação.  

Já do lado da dívida, dizia que a dinâmica continuava "fraca". "A dívida bruta do Estado caiu para cerca de 129% do PIB no final de 2015, bem acima da meta original de 124,2% e a nossa estimativa anterior de 127,9%", observava a Fitch. E estimava que o rácio baixasse para 122% até 2020, "deixando as finanças públicas com flexibilidade limitada se confrontada com choques futuros ou exposição ao risco de deflação".

3 de Fevereiro de 2017: Dúvidas sobre a estratégia de redução do défice

A última vez que a Fitch teve a opção de fazer alterações no "rating" ainda não tinham sido divulgados os números oficiais do défice de 2016. No entanto, os analistas Federico Barriga Salazar e Douglas Winslow notavam que a descida do défice seria superior ao estimado. Ajustaram a previsão na altura de 2,7% para 2,3%. O ano seria fechado com um défice de 2%.

A Fitch referiu que "apesar do relativamente fraco crescimento da receita, o governo conseguiu cumprir com a sua meta para o défice ao implementar uma estratégia restrita de consolidação". Mas referiram que "isso foi parcialmente alcançado com a restrição no investimento público, o que cria dificuldades para acelerar o crescimento no médio prazo".

Do lado do crescimento, apesar de terem salientado uma melhoria no segundo semestre de 2016, referiram que no total desse ano ficou abaixo das estimativas. A Fitch observou ainda que apesar dos saldos primários que Portugal apresentou nos últimos anos o rácio da dívida pública não caiu devido às injecções de fundos no sistema financeiro. Referia que dados os problemas na qualidade dos activos dos bancos ainda havia muito trabalho a ser feito nesse campo e que havia incerteza sobre a exposição do soberano a potenciais responsabilidades no sector financeiro.

Apesar de reconhecer que o governo estava a fazer esforços nessa matéria, teria de haver uma acção política concertada com o apoio dos partidos mais à esquerda. E mesmo observando que "António Costa tinha um bom histórico a geir as diferenças entre os partidos, assegurando estabilidade política, há pouca margem para a implementação de reformas estruturais" em várias áreas económicas, incluindo medidas para a banca.

11 de Abril de 2017: Progressos no sector bancário

Após a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, que incluiu uma ida ao mercado do banco para emitir dívida de elevada subordinação, a Fitch destacou que "os esforços de Portugal para resolver os problemas no sector bancário continuam a ter progressos graduais". E comentou também o processo de venda do Novo Banco à Lone Star. Apesar de considerar que poderia ser também um desenvolvimento positivo alertou para o risco de execução da conclusão desse negócio, devido à troca de dívida que o Novo Banco terá de fazer.

"Os últimos desenvolvimentos são positivos. A CGD está melhor posicionada para melhorar a rentabilidade e uma venda bem-sucedida do Novo Banco pode melhorar o sentimento dos investidores sobre o sector bancário", referiram os analistas Federico Barriga Salazar e Josu Fabo, que acompanha o sector bancário.

Mas realçaram que "o acordo para o Novo banco está sujeito ao risco de execução. "Requer aprovação das autoridades europeias e aumentar em 500 milhões de euros os fundos próprios de nível 1 [CET1] a partir de um exercício voluntário de gestão de dívida, cujos detalhes ainda estão em discussão".

Além da conclusão da venda do Novo Banco, a Fitch considerava ainda que seria necessária uma solução para o malparado e que, nesse ponto, o desfecho das iniciativas que estavam a ser seguidas continuava a não ser claro.

23 de Maio de 2017: Saída do PDE sublinha os progressos, mas dívida ainda é elevada

Após a Comissão Europeia ter recomendado a saída de Portugal do PDE, os analistas Arnaud Louis e Michele Napolitano consideraram que isso "sublinhava o fortalecimento das finanças públicas do país após os ajustamentos de políticas e a recuperação económica". A Fitch aproveitou para referir que "esperava que a tendência subjacente de redução do défice continuasse". E apesar de, contrariamente a perspectivas que tiveram em anos anteriores em que apontavam para os riscos políticos, consideraram que "a estabilidade política desde a formação do novo governo no final de 2015 ajudou a sustentar os esforços para a saída do PDE".

Mas deixou avisos a factores que colocavam pressão no "rating". "A elevada dívida pública e a fraca qualidade dos activos no sector bancário ainda pesa no perfil de crédito soberano de Portugal", defendia a agência. E mostrou dúvidas sobre se alguns dos factores que ajudaram a baixar o défice iriam continuar. "Podem ser difíceis de suster. A despesa de capital pode acelerar a partir de uma base baixa, devido às exigências de mais investimento", referia a agência. E defendia que os "os baixos custos com juros na dívida pública reflectiam uma flexibilização sem precedentes na política monetária da Zona Euro nos anos mais recentes e ganhos adicionais podem estar limitados".

E fechou o comunicado com uma análise ao rácio de dívida de Portugal. "Estimamos que a dívida pública desça dos 130,4% do PIB do final de 2016, mas continuará bem acima da mediana da categoria de BB (51% do PIB) e da média da Zona Euro (90%) no médio prazo", referiram os analistas da agência. E concluíram que "a elevada dívida pública reduz a capacidade do país responder a choques económicos e financeiros e é uma fraqueza-chave para o perfil de crédito do soberano". 

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