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Energia fervilha com mira numa maior escassez
Os preços nos mercados energéticos dispararam, perante a possibilidade de perturbação do fornecimento russo. Petróleo, gás e eletricidade en ebulição.
A ofensiva russa na Ucrânia deixou os mercados em ebulição. Se, por um lado, as bolsas afundaram, os ativos-refúgio por excelência – ouro, obrigações soberanas, e moedas como o dólar, iene e franco suíço – dispararam com a corrida dos investidores à procura de apostas mais seguras. O mercado da energia não foi exceção e as principais “commodities” deste segmento foram catapultadas, na quinta-feira, para máximos de vários anos.
O petróleo foi uma das matérias-primas em destaque, a disparar mais de 8% nos principais mercados. Em Londres, o Brent do Mar do Norte, referência para as importações europeias, tocou nos 105,79 dólares por barril, nível que não atingia desde agosto de 2014. Já o West Texas Intermediate, “benchmark” para os EUA, chegou aos 100,54 dólares, também em máximos de oito anos.
Com esta evolução, os contratos para entrega de petróleo em prazos mais curtos estão já mais caros do que aqueles que são negociados com datas mais distantes, fenómeno que é conhecido como “backwardation”. O facto de a oferta de crude não estar a conseguir acompanhar o aumento do consumo leva a que os preços do “ouro negro” subam na entrega mais imediata, e o ataque à Ucrânia veio sustentar ainda mais este cenário, já que existe o receio de que a Rússia possa fechar as torneiras do petróleo e do gás.
O UBS sublinha, numa análise a que o Negócios teve acesso, que a diferença de preço entre o contrato de futuros para entrega no próximo mês e os contratos com vencimentos mais longos está em recordes, o que se traduz num movimento de “super backwardation”. “Esta estrutura de preços sinaliza um mercado petrolífero apertado, impulsionado pela retoma da procura, pela queda dos stocks e menor capacidade disponível”, diz Giovanni Staunovo, analista de matérias-primas do banco suíço.
A escassez de oferta no curto prazo – muito à conta do desinvestimento no setor durante a pandemia e também devido às metas globais para uma economia verde – está assim a levar a uma maior retirada de crude dos inventários, já que os produtores estão a bombear abaixo daquilo que as refinarias precisam. O que faz com que os preços subam ainda mais.
Perante este cenário, os EUA estão a ponderar recorrer às suas reservas petrolíferas de emergência, uma vez mais em coordenação com aliados, para conter a forte subida dos preços, referiu a Bloomberg citando fontes próximas do processo. Apesar de ainda não ter sido tomada uma decisão, estão em curso conversações no seio da Administração Biden, estando em cima da mesa um chamado patamar de gatilho – ou seja, um nível de preços a partir do qual poderá ser coordenada uma libertação das reservas estratégicas.
A energia que vem da Rússia
A Rússia é a segunda maior produtora mundial de crude, vendendo a maioria do seu produto às refinarias europeia, e é também a maior fornecedora de gás natural da Europa – providenciando cerca de 40% do consumo desta matéria-prima no Velho Continente. E a ofensiva na Ucrânia intensificou os receios de escassez de abastecimento, levando a que também os preços do gás disparassem, com os futuros do TTF no mercado de referência holandês a escalarem 41%. Já a eletricidade para entrega em março encareceu 31% no mercado alemão.
Por cá, o Ministério do Ambiente sublinhou que o conflito entre a Rússia e a Ucrânia terá “implicações” nos mercados energéticos, mas garantiu que o abastecimento de gás e petróleo a Portugal está salvaguardado. No entanto, há alertas. “À medida que um ataque militar completo se desenrola, confirmando o cenário mais temido, as sanções ocidentais provavelmente farão com que a Rússia não consiga ou não queira vender as suas ‘commodities’ à Europa e a outros aliados ocidentais, o que significa que a escassez de oferta de petróleo em curso provavelmente aumentará e, consequentemente, os preços”, diz Ricardo Evangelista, diretor executivo da ActivTrades Europa.
As energias renováveis também receberam um “boost” na sessão de ontem, com os investidores a anteciparem a necessidade crescente de alternativas. O índice europeu de energias renováveis disparou 9,3%, naquele que foi o maior salto desde março de 2020. Cotadas como a EDPR, Orsted, Siemens Gamesa Renewable Energy e Vestas Wind Systems subiram todas mais de 10%. A empresa liderada por Miguel Stilwell foi também impulsionada pela compra de 91% da Sunseap, empresa de energia solar de Singapura.