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Corte da OPEP+ só iça petróleo se sair do papel

Se os membros da OPEP e seus aliados cumprirem à risca os novos níveis de produção que foram acordados na sexta-feira em Viena, a cotação do crude poderá retomar. Mas se o corte da oferta for menor do que o decidido, então barris de papel não içam preços.

Reuters
09 de Dezembro de 2019 às 07:00
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Os 14 membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e os seus 10 aliados – o chamado grupo OPEP+, onde se inclui a Rússia – juntaram-se em 2017 para reduzir a disponibilidade de crude no mercado, num contexto de excesso de oferta, muito à conta da maior produção dos EUA por via do petróleo de xisto. O corte de produção definido por estes 24 países estava atualmente em 1,2 milhões de barris por dia, mas na sexta-feira foi anunciado um reforço desta redução, em 500 mil barris diários, nos primeiros três meses de 2020.

Resultado: no total, haverá menos 1,7 milhões de barris por dia no mercado entre janeiro e março do próximo ano. Mas se não houver prevaricadores, este volume diário de redução pode ascender a 2,1 milhões de barris, uma vez que a Arábia Saudita anunciou que continuará a produzir menos 400 mil barris do que a quota que lhe está fixada. Aos sauditas interessa muito especialmente que os preços da matéria-prima subam, uma vez que isso beneficiará a sua petrolífera estatal, a Saudi Aramco, que entra em bolsa já na próxima quarta-feira, 11 de dezembro.

No entanto, para que esse corte de 2,1 milhões se efetive, é preciso que todos cumpram efetivamente as suas quotas. Daí o renovado apelo de Riade, uma vez que há países que têm excedido os volumes de produção definidos, como é o caso da Nigéria, Iraque, Rússia e Emirados Árabes Unidos.

A OPEP e os seus aliados não se debruçaram sobre o problema de um provável forte excesso da oferta no segundo trimestre de 2020. Continuo cético quanto à possibilidade de um nível total de cumprimento [das quotas] a partir de janeiro. Giovanni Staunovo
Analista de matérias-primas
do UBS

De prevaricadores a cumpridores?
E essa perspetiva de total cumprimento parece pouco provável para Giovanni Staunovo, analista de matérias-primas do UBS. No seu entender, os 500 mil barris do corte anunciado são, em parte, "barris de papel", isto porque a Arábia Saudita já está a produzir em torno do novo nível anunciado (9,744 milhões de barris por dia) devido à sua redução superior ao que lhe foi definido e porque no final deste ano a Rússia estará a produzir menos 70 mil barris do que em janeiro.

"Embora os países que têm produzido acima do devido possam melhorar o seu nível de cumprimento, continuo cético quanto à possibilidade de as coisas serem diferentes no futuro e de que a partir de janeiro atinjam um nível total de cumprimento", disse Staunovo ao Negócios.

Além do mais, "a OPEP e os seus aliados não se debruçaram sobre o problema de um provável forte excesso da oferta no segundo trimestre de 2020, tendo atirado com a decisão para inícios de março", acrescentou.

Por isso, apesar de os preços do petróleo terem sexta-feira reagido em alta à decisão da OPEP, "as deceções quanto ao cumprimento das quotas poderão fazer com que os preços do crude voltem a ficar sob pressão", sublinhou o analista do UBS.

Já Nader Naeimi olha o que aí vem para os meses futuros com maior otimismo, estimando uma subida das cotações do "ouro negro" nos próximos 12 meses. Para este estratega de investimento da AMP Capital Investors, "com os receios de um iminente excesso de oferta e com a há muito esperada entrada em bolsa da Saudi Aramco", era natural que os sauditas quisessem sustentar ainda mais os preços do crude, daí serem fervorosos defensores de uma maior dimensão nos cortes de produção". "Enquanto isso", referiu Naeimi ao Negócios, "o ciclo do setor industrial mundial está a dar sinais de retoma, especialmente nos mercados emergentes". Na sua opinião, "a conjugação dos cortes de produção e da retoma da procura deverá fazer subir os preços do petróleo para um intervalo entre os 65 e os 70 dólares por barril no próximo ano".

A conjugação dos cortes de produção e da retoma da procura deverá fazer subir os preços do petróleo para um intervalo  entre os 65 e os 70 dólares por barril no próximo ano. Nader Naeimi
Estratega de investimento
da AMP Capital Investors

A matéria-prima disparou em torno de 2% na sexta-feira, após o anúncio do reforço do corte de produção pela OPEP+, depois de já ter valorizado nas sessões anteriores perante a perspetiva dessa decisão. No acumulado da semana, o Brent do Mar do Norte, crude de referência para as importações portuguesas e que é negociado no mercado londrino, somou 2,98%.

Agora, é preciso que os 2,1 milhões de barris de corte saiam do papel e entrem de facto em vigor. É a única forma de deixarem de ser "barris de papel". Algo essencial numa altura em que o mercado se depara com uma oferta robusta de petróleo de xisto, proveniente sobretudo dos Estado Unidos, e com a esperada oferta adicional por parte de outros produtores que não fazem parte da OPEP+, como o Brasil e a Noruega.

Em março do próximo ano os ministros do setor energético da OPEP+voltam a encontrar-se, em reunião extraordinária, para analisarem os efeitos do novo plafond, se houve cumprimento e se o plano é para manter até junho – mês em que tem lugar em Viena a próxima reunião formal. 

OPEP+

Os números que importam

Há vários números com especial relevância na mais recente decisão da OPEP+. Se efetivados, os preços do crude conseguirão encaixar os esperados aumentos de produção noutras latitudes.

1,2 milhões
O plafond de produção dos membros da OPEP e seus aliados obedece atualmente a um corte de 1,2 milhões de barris por dia.

500 mil
A partir de janeiro do próximo ano, a OPEP+ procederá a uma redução adicional de 503 mil barris por dia: 372 mil por parte da OPEP e 131 mil à conta dos 10 aliados do cartel.

1,7 milhões
Com o corte adicional de 500 mil barris, que vigora no primeiro trimestre do próximo ano, os países da OPEP+ estarão a produzir - e a colocar no mercado - menos 1,7 milhões de barris por dia.

400 mil
Se, de um lado, existe quem faça batota e supere as suas quotas de produção, já a Arábia Saudita opera em ventos contrários, uma vez que tem cortado diariamente em 400 mil barris adicionais o plafond que lhe está fixado.

2,1 milhões
Riade anunciou na passada sexta-feira que continuará a superar em 400 mil barris por dia o corte de produção estabelecido para o reino. Isso significa que a redução total de oferta no mercado pode ascender a 2,1 milhões de barris diários. Mas, para que isso aconteça, é preciso que todos cumpram os cortes definidos. Os "prevaricadores", como a Nigéria, Rússia, Emirados Árabes Unidos e Iraque, terão de tentar cumprir os níveis de produção acordados se quiserem ver os preços do "ouro negro" subirem mais.


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