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Preço do lítio já duplicou este ano
É usado como estabilizador do humor, mas o seu maior cliente é o setor automóvel, com as baterias para os veículos elétricos no topo do consumo. Sobe 108% desde janeiro, mas em 2023 pode corrigir.
Os preços do lítio registam um ganho acumulado de 108% desde o início de 2022. E a subida poderá não ficar por aqui, pelo menos até ao final do ano, já que a procura por este metal para o fabrico de baterias dos veículos elétricos costuma aumentar em novembro e dezembro.
Apesar de a cotação deste metal ter mais do que duplicado no ano, se olharmos para os últimos 12 meses, a subida é ainda mais expressiva – 182% –, muito à conta da trajetória ascendente do final de 2021. Atualmente, o preço do carbonato de lítio de grau elevado – usado na indústria de baterias – negoceia em torno dos 85.000 dólares por tonelada (577.500 yuans, no mercado de referência chinês). Em março, logo a seguir à invasão da Ucrânia pela Rússia (a 24 de fevereiro) os preços estabilizaram e depois sofreram uma queda até maio, mas depois retomaram a sua escalada até meio de novembro, altura em que desceram novamente para então estabilizarem nos atuais níveis.
O que tem motivado o bom momento do lítio é a procura por parte dos fabricantes de baterias, a par com uma escassez de oferta perante a procura. “O lítio tornou-se praticamente insubstituível na produção das baterias para veículos elétricos devido à sua elevada eficiência de armazenamento de energia. O aumento da procura pela matéria-prima tem-se refletido no preço, apoiando assim o crescimento exponencial que o lítio teve este ano. O facto de existir escassez, devido ao excesso de procura, também tem apoiado o cenário de alta”, sublinha Henrique Tomé, analista da XTB.
Por outro lado, “novembro e dezembro costumam ser bons meses nas vendas de veículos elétricos na China”, o que ajuda, referiu à Reuters o analista Caspar Rawles, da Benchmark Mineral Intelligente (BMI). No entanto, as vendas costumam cair em janeiro, devendo ser essa a tendência de todo o primeiro trimestre.
Com efeito, há riscos no horizonte e 2023 poderá ser um ano diferente. “Apesar dos vários fatores que contribuem para a subida dos preços, acredito que a médio prazo exista a possibilidade de os preços começarem a corrigir em baixa”, diz Henrique Tomé ao Negócios. “É importante notar que existem ‘red flags’. Estamos perante um abrandamento económico, o qual poderá até agravar-se, e este cenário acabará por penalizar os preços das matérias-primas, uma vez que a procura deverá diminuir”, acrescenta.
“O aumento da procura por veículos elétricos tem sido o grande responsável pela escassez no lado da oferta, que tem contribuído para o desequilíbrio entre a oferta e procura. Mas a médio e longo prazo esta situação não é sustentável e poderá ser um fator de risco”, considera.
Além disso, o metal poderá sofrer igualmente alguma pressão devido à retirada, pela China, dos subsídios aos veículos elétricos. O lítio é uma componente essencial na descarbonização dos transportes e grande parte da sua produção mundial – 80% de mais de 710.000 toneladas este ano, segundo a BMI – será canalizada para o fabrico de veículos elétricos. No entanto, o aumento dos inventários das empresas consumidoras poderá vir a pressionar os preços, se bem que não se prevê que regressem aos baixos níveis de 6.000 dólares por tonelada que registaram em novembro de 2020, referem os analistas inquiridos pela Reuters.
O Departamento de Investigação Económica da Coface, numa análise realizada no final de outubro e a que o Negócios teve acesso, sublinha que a maioria dos metais desvalorizou desde inícios do verão, mas que esse não foi o caso do lítio. “Apesar das perspetivas negativas para setores clientes do lítio, como o automóvel, o que limita a procura por baterias, não há um crash nas cotações.
E porquê? Por que motivo segue o lítio uma tendência distinta? Sobretudo por seis razões, explica o Coface Brief: as baterias dos veículos elétricos são essencialmente compostas por lítio; a procura não está a ser atendida pela oferta; os recursos geológicos parecem menos diversificados no que toca ao lítio quando comparado com outros metais de base (a Argentina, Bolívia e Chile detêm 53% das reservas mundiais, quando no caso do cobre, por exemplo, 75% das reservas identificadas estão distribuídas por 13 países); a produção de lítio está altamente concentrada (em 2021, era dominada por um trio – Austrália, Chile e China –, com 90% da produção global); no processamento, a cadeia de valor está ainda mais concentrada (em 2021, a China refinou 60% do lítio global), e a Europa visa ser autossuficiente na produção de baterias em 2030 – e esse mercado crescerá bastante.
E o que pode fazer descer e subir os preços? Segundo a Coface, um dos riscos de queda é o de que, no médio prazo, a elevada volatilidade das matérias-primas, devido aos sucessivos choques pandémicos, à guerra na Ucrânia e à desaceleração do crescimento mundial, possam afetar a tendência altista dos preços. Em contrapartida, um fator de sustentação poderá ser o do reforço das estratégias a longo prazo dos países industriais, direcionadas para um mundo mais amigo do ambiente, que poderão limitar a produção futura de lítio e de baterias – tendência que, por natureza, manterá os preços elevados.
Analista da XTB