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Ouro “flirta” com recordes em clima de incerteza

O atual contexto de incerteza, com a crise bancária e as subidas dos juros pelos bancos centrais a coroarem os receios de desaceleração económica, está a levar a uma maior procura por ativos-refúgio.

Metal amarelo tem preservado valor ao longo do tempo. Bancos centrais têm reforçado as reservas, tendo comprado 1.136 toneladas em 2022.
Metal amarelo tem preservado valor ao longo do tempo. Bancos centrais têm reforçado as reservas, tendo comprado 1.136 toneladas em 2022. Alexander Manzyuk/Reuters
10 de Abril de 2023 às 08:00
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Os preços do ouro estão perto de atingir um novo recorde. A incerteza gerada pela crise bancária e o espectro da recessão trazido pelo ciclo de subida dos juros por parte dos bancos centrais são os principais fatores de sustentação do metal precioso, que tem rondado nos últimos dias o máximo histórico de 2.074,88 dólares por onça atingido em agosto de 2020, quando a incerteza decorrente da pandemia levou os investidores a procurarem a segurança do ouro.

Desta vez, explica Ricardo Evangelista, analista sénior da ActivTrades, as razões de ansiedade dos investidores podem ser atribuídas aos receios de uma desaceleração económica. “A crise bancária de março destacou o impacto negativo que o aperto monetário agressivo dos bancos centrais está a ter na economia. Os dados económicos que têm sido publicados mostraram uma desaceleração na atividade e na confiança, e o recente anúncio da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e seus aliados (OPEP +) sobre a intenção de cortar a produção – que provavelmente alimentará a inflação – contribuirá para uma maior deterioração do sentimento dos investidores”, afirma o estratega.

E “apesar da crescente tração destas visões, de que a economia global pode estar a caminho de uma séria contração, os bancos centrais continuam a deixar de lado as preocupações”, optando por se concentrar em combater a inflação persistentemente elevada por meio de taxas de juros cada vez mais altas. Neste contexto, “pode haver espaço para mais ganhos no preço do ouro”, estima Ricardo Evangelista.

O UBS tem o mesmo entendimento. Numa nota de “research” a que o Negócios teve acesso, assinada por Giovanni Staunovo, Wayne Gordon e Dominic Schnider, os analistas do banco suíço sublinham que “a incerteza exige cobertura de risco”. E é aí que o ouro mais brilha, com o seu estatuto de valor-refúgio.

“O ouro a pronto superou recentemente o patamar psicológico dos 2.000 dólares por onça e mantém-se muito perto do seu recorde de agosto de 2020. No UBS antecipamos que a cotação vá continuar a subir e apontamos para os 2.200 dólares num prazo de 12 meses”, sublinham os analistas no seu relatório.

A justificar esta visão está a convicção de que vão persistir as incertezas quanto ao “timing” do fim do ciclo de subida das taxas de juro. “Até poderemos acabar depois por assistir a um corte dos juros por parte da Reserva Federal (Fed) norte-americana – e, se isso acontecer, minará a robustez do dólar e intensificará a procura por ouro em várias frentes: barras e moedas, Exchange Traded Funds [produtos negociados em bolsa, cujo principal objetivo é replicar o desempenho de um determinado índice, “commodity” ou cabaz de ativos] e mercado de futuros”, projeta o banco suíço. Recorde-se que como o ouro é denominado em dólares, se a nota verde se depreciar o metal amarelo fica mais atrativo para quem negoceia com outras moedas.

A possibilidade de a Fed poder inverter a sua atual política monetária ainda este ano e acabar por cortar a taxa dos fundos federais é colocada já por muitos intervenientes de mercado. “Esta recente subida do ouro é um sinal de que os operadores continuam a achar que os juros diretores nos EUA estão perto do seu pico e que ainda deverão descer em 2023”, frisa Craig Erlam, analista sénior de mercado na plataforma de negociação online Oanda.

E há mais luzes no panorama promissor para quem investe em ouro. “Também antecipamos uma procura forte por parte do setor oficial, com os bancos centrais determinados em diversificar as suas reservas para lá do dólar e das Obrigações do Tesouro dos EUA. E, historicamente, as compras dos bancos centrais tendem a ser menos sensíveis aos preços”, refere o “research” do UBS. Assim sendo, não será o ouro mais caro que impedirá as autoridades monetárias de o adquirirem para reforçarem as suas reservas.

No ano passado, os bancos centrais compraram 1.136 toneladas de ouro, naquele que foi o maior volume anual desde 1967. A China, por exemplo, começou a reconstituir as suas reservas auríferas em 2022, depois de três anos sem o fazer, com o intuito de diversificar as suas apostas longe do dólar.

Por tudo isto, e não só, o ouro é o favorito do banco suíço quando comparado com os restantes metais preciosos. “Para quem é avesso ao risco, preferimos o ouro, pois a sua menor volatilidade e o seu reconhecido posicionamento como ativo seguro são características que suplantam a prata e os metais do grupo da platina [platina, paládio, ródio, ruténio, ósmio e irídio]”, apontam.

“Citando o ator Tom Hiddleston, ‘nunca sabemos o que está ao virar da esquina. Pode ser tudo ou pode nada ser. Se aplicarmos esta frase ao contexto dos acontecimentos recentes, o ‘stress’ no setor da banca nos EUA e na Europa foi inesperado. Mas isso também reforça a importância que damos à disciplina e diversificação quando falamos de portefólio. As coberturas de risco adequadas à situação fazem parte desta abordagem disciplinada – e, neste momento, o ouro encaixa perfeitamente nesse papel”, sublinham os analistas do UBS.

Para os estrategas do banco, os investidores beneficiarão do facto de deterem ouro como proteção contra a instabilidade do mercado financeiro. Até porque “o metal amarelo tem preservado o seu valor ao longo do tempo”.

 

O metal amarelo tem rondado o máximo atingido em agosto de 2020, nos 1,074,88 dólares por onça.

 

O ouro “spot” está nos 2.003,39 dólares por onça em Londres. Nos futuros de Nova Iorque, vale 2.009,30 dólares.
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