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Investidores ignoraram os sinais de burla nos selos
Num artigo recente da conceituada revista financeira norte-americana “Barrons”, um jornalista conta a história de como se dirigiu a Vicente Martin Peña, executivo de topo da Afinsa Bienes Tangibles, para que analisasse fotocópias de dois conjuntos de selo
Num artigo recente da conceituada revista financeira norte-americana "Barrons", um jornalista conta a história de como se dirigiu a Vicente Martin Peña, executivo de topo da Afinsa Bienes Tangibles, para que analisasse fotocópias de dois conjuntos de selos e lhe dissesse quanto poderiam valer.
Um tinha sido emitido na Bulgária, em 1980, e o outro em Ingermanland, um enclave finlandês na Rússia, em 1920. "São demasiado recentes para que possam ser considerados um investimento", disse Peña, salientando que "nunca" os compraria.
"Existem muitas pessoas a vender coisas no mercado filatélico que não têm quaisquer escrúpulos e que se aproveitam dos compradores que não percebem muito do assunto", acrescentou Peña ao jornalista da "Barrons", para depois perguntar: "A quem é que os comprou?" "Foi a si", respondeu-lhe o jornalista, mostrando dois contratos da Afinsa para as referidas séries. Os contratos indicavam que cada conjunto tinha sido vendido por 600 euros na altura e estavam assinados por... Vicente Martin Peña.
Esta história denuncia a pedra angular do esquema em que assenta o modelo de negócia da Afinsa e do Fórum Filatélico. Como explicou ao Jornal de Negócios, o administrador do "Think Finance" – um "site" português que vem a alertar para este esquema de investimento em selos há largos meses –, "o problema não está nos selos, mas sim em garantir-se uma rendibilidade substancialmente acima daquela que se consegue obter no mercado sem risco". "A questão central destes esquemas é que já acumularam dívidas para com os clientes muito superiores à sua situação líquida. Porém, tal não seria um problema, se essas dívidas estivessem no balanço dessas entidades. Mas não estão, pelo que se conclui que a soma dos activos e a situação líquida não permite fazer-lhes face", acrescentou.
"As empresas pagam ao cliente a mais-valia prometida e nestes esquemas não há quem se queixe. Até tudo implodir", adiantou o mesmo especialista. De acordo com o "Financial Times", num artigo em Setembro último, esse buraco já existia e, portanto, era uma questão de tempo até as empresas envolvidas na alegada burla ruírem. Em Janeiro deste ano, o presidente da Associação Internacional dos Peritos em Filatelia, José M. Sempere, alertou para "o falso investimento filatélico", acusando "inúmeras falsidades" da "propaganda comercial das empresas de investimento em bens tangíveis, concretamente de filatelia".
Qualquer investidor mais atento tinha argumentos fortes para pensar duas vezes antes de se meter neste esquema. Bastava comparar a disparidade gritante entre os preços dos selos no catálogo da Fórum Filatélico e o seu real valor de mercado, afixado em "sites" ou catálogos da especialidade (ver ilustração em baixo). A totalidade das séries valorizada pela Fórum Filatélico – de 1956 a 1992, ininterruptamente, sob o tema Europa – era de 87.371 euros no início deste ano, quando a mesma colecção era passível de ser comprada em estado novo, em vários locais, por cerca de 7.900 euros (11 vezes menos). Quando a esmola é grande...