Notícia
Notas da semana de Marques Mendes
A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana, naqueles que são os principais excertos da sua intervenção na SIC. O comentador fala da visita de Costa à Índia, da subida dos juros da dívida, do caso da TSU/salário mínimo e do cenário de nacionalização do Novo Banco.
COSTA NA ÍNDIA
Esta visita foi importante por três razões:
Primeiro: a Índia é o segundo país mais populoso do mundo e tem um potencial enorme de crescimento e de investimento no mundo. Logo, esta visita é uma oportunidade de tentar atrair investimento para Portugal.
Segundo: a relação de Portugal com a Índia tem sido muito formal e muito distante. Quebrar esta distância e esta formalidade é essencial para o futuro.
Terceiro: o facto de António Costa ter ligações familiares à Índia, através de Goa, pode criar uma relação afectiva que facilita quer a relação política quer a relação económica.
O que é que esta visita revela?
Um PM diferente do início do mandato – mais virado para a economia, para os investidores, para o investimento.
António Costa sabe que por aqui passa o futuro. Se a economia crescer, o futuro do país e o seu podem estar assegurados. Se a economia não crescer, o país vai ter dificuldades e ele corre o risco de perder eleições.
E para haver crescimento é preciso haver investimento. E é isso que ele procura.
Primeira questão – a posição do Governo. Nesta matéria, o Governo tem um mérito e uma fragilidade.
O mérito é o de tudo ter feito para aproximar as posições dos parceiros sociais e ter conseguido alcançar um acordo de concertação social.
A fragilidade é o de não ter acautelado as condições necessárias para que as medidas previstas no acordo fossem aprovadas no Parlamento.
Segunda questão – a posição do PSD. A manter-se o que foi anunciado, o PSD toma uma decisão incompreensível. E isto pode ser um monumental tiro no pé. O maior erro de Passos Coelho desde que está na oposição. Por duas razões:
Primeira razão: esta posição vai contra toda a história e toda a cultura do PSD. O PSD foi até hoje o partido que mais defendeu e estimulou a concertação social. Faz parte do seu ADN. Se agora inviabiliza este acordo, o PSD dá uma machadada na concertação social e faz o jogo dos adversários da concertação social.
Segunda razão: esta posição do PSD é de uma incoerência que não tem defesa possível. É que o PSD, em 2014, quando estava no Governo, aprovou uma medida em tudo semelhante a esta que agora vai rejeitar.
Também houve um acordo de concertação social sobre o salario mínimo. Também houve uma redução da TSU. Também teve natureza temporária. Também houve um Decreto-Lei. Tudo semelhante ao que agora está em causa.
Isto parece a futebolização da política. Tudo o que vem da minha equipe é bom. Mas se vier da equipe adversária já é mau. Mas isto infelizmente já é habitual.
Terceira questão – o problema é que há um dado novo que destrói a argumentação de Passos Coelho.
Qual é a argumentação de Passos Coelho? Segundo ele, a geringonça é que tem de assegurar a aprovação desta medida e não o PSD. Só que há um dado novo que contraria esta argumentação. E qual é esse dado novo?
É que o ano passado, em 2016, já havia geringonça, já Passos Coelho estava na oposição, também houve um acordo de concertação social sobre o salário mínimo, também houve redução temporária da TSU, também foi feito um Dec. Lei, e como é que votou no Parlamento o PSD? Votou contra? Não, em Abril de 2016, perante um caso em tudo igual ao de hoje, o PSD absteve-se. Não votou contra. O PCP e o BE é que votaram contra. O PSD viabilizou-a. Foi em 8 de Abril de 2016 e era o DL 11/2016 de 8 de Março.
Então e agora: o PSD vai ser diferente do que foi há menos de um ano?
É que, se o PSD não fizer agora o que fez em 2016, dir-se-á que o PSD de Passos Coelho é um catavento: teve uma posição em 2014; teve uma posição diferente no primeiro ano da geringonça; e tem uma terceira posição, diferente de todas as outras, no segundo ano da geringonça.
Isto é de um desgaste brutal. Em que posição ficam os deputados que em 2016 votaram de uma forma e em 2017 votam de forma diferente? São verbos de encher?
E Passos Coelho? Ele que é uma pessoa inteligente, não está a perceber que está a matar a boa imagem que criou no Governo. Está a perder a imagem de político responsável e com sentido de Estado que antes tinha. Parece agora um político radical.
Nota final
O DL sobre a redução da TSU será enviado pelo Governo, amanhã mesmo, para promulgação do Presidente da República. Prova de que o Governo não recua.
Em matéria de juros da dívida pública, Portugal não entrou com o pé direito em 2017. Bem pelo contrário. Os dados que existem são preocupantes:
Primeiro: Portugal emitiu esta semana 3 mil milhões de euros de dívida. Qual foi o juro? 4,2%.
O juro mais alto desde Fevereiro de 2014 (troika);
Muito acima da média de juros que Portugal paga (3,4%).
Segundo: ao contrário do que diz o Governo, este agravamento dos nossos juros não é apenas uma questão externa. Vejamos os três que tiveram resgastes:
No espaço de um ano, os juros da dívida espanhola e irlandesa baixaram. No mesmo período, os juros da dívida portuguesa subiram e muito.
Ou seja, a conjuntura externa é igual para todos. Apesar disso, a Irlanda melhorou, a Espanha melhorou e Portugal piorou e muito a sua posição.
Em conclusão: há um problema de falta de confiança em Portugal. Cuidemos, pois, do essencial: pôr a economia a crescer e recuperar a confiança abalada.
É sobre isto que a oposição devia falar, mais do que sobre a TSU. Infelizmente, até a oposição está em silêncio.
NACIONALIZAÇÃO – SIM OU NÃO?
Primeira questão – O que sucedeu e o que vai provavelmente suceder?
Primeiro: o Governo fez bem em estabelecer uma linha vermelha. Só vende se não houver garantia do Estado. E fez bem fazer este finca-pé.
Segundo: parece-me que o mais provável é que os concorrentes cedam e deixem cair a exigência de garantia do Estado. Se não fizerem isso, não têm negócio.
Segunda questão – E se isso não suceder, a nacionalização é solução? Não me parece. Agitá-la como arma negocial, percebe-se. Adoptá-la, nem pensar. O Governo não cai daí a baixo.
Eu percebo que alguns políticos defendam essa solução. Também já defendem há 9 anos no caso BPN, também diziam que era a melhor solução para os contribuintes, e o desastre foi o que se viu – 5 a 6 mil milhões de euros de prejuízo. Muitos políticos são assim – não fazem contas e vão pelo caminho fácil.
E também percebo que alguns empresários que têm dívidas ao Novo Banco também defendam a nacionalização. Estão a salvar a pele. É mais fácil negociar uma dívida com o Estado ou com um Ministro do que com um privado estrangeiro.
Posto isto, a nacionalização tem vários problemas:
Obriga o Estado a meter dinheiro e afecta as contas públicas;
Tem um dano reputacional na imagem do país e afasta ainda mais os investidores;
Pode afectar a saída de Portugal do procedimento de Défice Excessivo.
Provavelmente não passa em Bruxelas;
E, se passar, Bruxelas vai obrigar a remédios fortes (venda de partes do Banco, despedimentos e outras medidas pesadas).
Terceira questão – Sendo a venda a melhor solução, há, apesar de tudo, alternativas.
Primeira hipótese: se não for feita a venda agora, então é preferível negociar com Bruxelas a manutenção da situação actual por mais um ou dois anos.
É mais fácil Bruxelas autorizar esta prorrogação que a nacionalização.
E, como os resultados operacionais do Banco estão a melhorar, a venda poderá ser feita mais tarde em melhores condições.
Segunda hipótese: criar o Banco Mau e resolver os problemas dos activos tóxicos. Ou seja, separar o que é tóxico daquilo que não é.
Há meses que se fala nesta ideia. O PM e o Banco de Portugal têm.na defendido à exaustão.
O próprio PS veio agora, de novo, sustentar a ideia (através de Carlos César e João Galamba). Pois bem. Concretizá-la resolveria o problema e o Novo Banco ganhava valor.
Por que não concretizá-la?