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Da ética dos mínimos à “imaginação moral”

É certo que as empresas podem escolher cumprir apenas aquilo a que são obrigadas. Mas também é verdade que as que optam por esta estratégia, não vão além da mediocridade. Escolher a via da “má actuação” para a garantia do lucro imediato é o caminho mais fácil, mas é através da vontade genuína de fazer (o) bem que se chega mais longe. Uma revisitação dos fundamentos da ética empresarial pela “voz experiente” de um dos maiores especialistas na área, Domènec Melé

19 de Fevereiro de 2016 às 17:00
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"Os mínimos éticos são um bom começo para as empresas, mas aquelas que apenas os cumprem, não deixam de ser medíocres". Quem o afirma é Domènec Melé, reconhecido especialista mundial em Ética Empresarial e que esteve esta semana na AESE-Business School a propósito de um seminário sobre esta temática que, por mais dissecada que seja, continua a ser objecto de mais teoria do que de prática efectiva.

Razão pela qual continua a ser necessário recordar os seus fundamentos, os caminhos que já percorreu e as falhas que continuam a subsistir na sua aplicação por parte das empresas, sejam elas de pequena ou média dimensão ou gigantes empresariais que, mais vezes do que seria desejável, continuam a ser notícia pelas más razões. O primeiro dia do seminário organizado pela AESE teve como enfoque dois grandes temas abordados pelo responsável de Ética Empresarial da IESE-Business School: a "Ética para uma boa gestão de empresas" e a "Ética na organização e no trato com as pessoas", enquanto dimensão intrínseca de qualquer tomada de decisão na medida em que são exactamente as pessoas que por ela são afectadas. O VER assistiu às duas intervenções do Professor Melé, com quem também conversou, e tenta, no artigo que se segue, sumarizar a sua visão e alguns ensinamentos que, por mais que pareçam óbvios, não o são tanto assim.

"O risco está em reduzir a ética ao que se pode medir"

Sabemos que, de tempos a tempos, aparece um "interesse renovado" no que às questões de ética empresarial dizem respeito. Mas, em termos da sua evolução, o denominado "movimento pela ética empresarial" pode ser "compartimentado" em décadas.

Como recorda o Professor Melé, foi a pressão social, na década de 70 do século XX – e com o escândalo "Lockheed" – empresa aerospacial envolvida em casos graves de corrupção que atingiram, em simultâneo, vários países como o Japão, a Alemanha, a Itália e a Holanda, – em conjunto com a ascensão do movimento dos direitos civis e dos consumidores que "marcou" o início de um interesse mais alargado no que à ética das empresas diz respeito. Mas só nos anos 80 é que a disciplina se converteu num verdadeiro movimento de peso, ao qual correspondeu um impulso genuíno no mundo académico e empresarial, que viria a cimentar-se ainda mais ao longo da década de 90 (e inícios dos anos 2000) com os famosos escândalos da consultora Arthur Andersen, da WorldCom, da Enron, entre outros, e que deram origem a um interesse crescente dedicado às "boas práticas" e às questões éticas do governo corporativo.

Mais próximo da nossa memória – e das consequências directas que a mesma teve na vida de milhões de pessoas – enquadram-se os escândalos da banca americana e a consequente crise financeira e económica que viria a abalar o mundo tal como o conhecíamos. Todavia e em simultâneo, e ainda na década de 90, mas com expressão mais vincada a partir do início do novo século, as empresas começaram a introduzir práticas corporativas relacionadas com códigos de conduta e formação em ética empresarial, ao mesmo tempo que os denominados "valores" foram ganhando notoriedade renovada com a ascensão da chamada responsabilidade social das empresas e, numa óptica mais alargada, com os movimentos de sustentabilidade, numa visão mais holística da noção "multi-stakeholders" aos quais as organizações devem prestar atenção – e contas, apesar de, em muitas ocasiões, a questão continuar a ser tratada mais como "retórica do que como gramática",como sublinha o Professor.

Como declarou ao VER, são já "muitas as empresas que começam a perceber que a actividade económica tem uma dimensão ética, e por isso, compreendem que um comportamento ético e responsável não é alheio aos resultados, na medida em que produz aceitação social e gera confiança." Adicionalmente, "estes e outros factores influenciam o desempenho económico da empresa a médio e longo prazo". Todavia, Melé afirmou ainda que "as empresas que seguem uma tendência economicista podem aceitar cumprir os mínimos éticos ou por imposição legal ou por pressão da opinião pública, na medida que as exigências de ética aumentam com a percepção da corrupção". Questionado sobre se ainda é necessário que existam escândalos empresariais de grande envergadura para que surja um interesse renovado no que à (falta de) ética empresarial diz respeito, o especialista asseverou que "historicamente, os escândalos têm tido a sua influência, sim, mas também já existem muitas empresas que se esforçam por ter uma boa reputação ou que o fazem devido a um elevado sentido de responsabilidade".

Na actualidade, e como sabemos, a tendência para integrar a ética com a eficiência da empresa é fruto de um desenvolvimento "dos tempos". Vivemos na era em que a gestão é muito mais baseada na missão da empresa, a qual tem de ser congruente também com o bem comum da sociedade e de todos os seus stakeholders. Para além das questões de reputação e boa imagem (v.caixa), as empresas sabem que são cada vez mais escrutinadas e que têm de obedecer a regras e normas, que visam o seu bom comportamento. Mas será que os mecanismos que, entretanto, se popularizaram, são suficientes para as manter na "linha"? Ao VER, Domènec Melé afirmou não estar completamente seguro sobre a sua eficácia, apesar de considerar que "os rankings, as certificações e os relatórios podem ajudar a melhorar certos aspectos, aos quais não se dava a devida atenção anteriormente". Todavia, afiança, "o risco está em reduzir a ética ao que se pode medir e a verdade é que, antes ou agora, sempre existiram empresas que são éticas por convicção e que não precisam de nenhum código ou de escrutínio externo para assim se manterem".


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