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Qual o futuro do sector dos media?

O digital e as publicações de nicho são algumas das soluções apontadas pelos protagonistas do sector para os media superarem a actual crise. Carlos Magno espera que a ERC “seja mais útil ao sector” em 2016.

Cátia Barbosa/Negócios
02 de Janeiro de 2016 às 10:30
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Nos últimos anos o sector dos media tem estado sob pressão. A queda das receitas publicitárias, das vendas de jornais e a migração dos leitores para o mundo digital alterou o cenário da indústria. O que pode esperar o sector em 2016?

As perspectivas de alguns protagonistas e especialistas do sector ouvidos pelo Negócios não são muito animadoras. Mas há um ponto em que todos concordam: a inversão do actual panorama passará pela aposta no digital.

"O sector tem vindo a atravessar uma fase difícil, face às mutações tecnológicas e de hábitos dos consumidores, a par do ambiente económico geral", disse ao Negócios Luís Nazaré, director da Plataforma de Media Privados (PMP).

Para Joaquim Vieira, ex-provedor do Público e presidente do Observatório de Imprensa, o cenário em 2016 confirmará o agravamento da crise. "Isto porque a crise, no caso português, não tem que ver apenas com a contracção da economia (devido à crise económica e financeira dos últimos anos), mas também com a crise geral dos media tradicionais, que estão a ser abandonados pelo público em favor dos media digitais. É nesse quadro de alteração de um paradigma civilizacional quanto aos modos de comunicação que a crise dos media deve ser contextualizada", sublinhou.

A migração dos leitores para o mundo online tem obrigado os meios de comunicação social a reinventarem-se, para não perderem o comboio da digitalização mas também para captarem receitas publicitárias. Com a queda da venda de jornais, as audiências passaram a ser o principal chamariz dos anunciantes. Estará então a morte do papel anunciada? As opiniões dividem-se.

Luís Nazaré acredita que o papel não morrerá. E relembra o caso da rádio, "a quem muitos anteviam um final triste". Porém, "o seu peso tende a diminuir ainda".

Francisco Rui Cádima, professor na Universidade Nova de Lisboa, antevê que "a morte do jornal em papel é certa, mas difícil de datar". "Para muitos jornais isso já aconteceu... Para os que vão ficando, o seu desaparecimento poderá ser rápido, ou a médio, ou longo prazo, sendo que daqui a 20-30 anos o jornal em papel - a existir - será um nicho de mercado ou de ‘culto’ muito específico", detalhou o coordenador do mestrado de Novos Media e Práticas Web.

Por sua vez, António Granado, jornalista e professor na Universidade Nova de Lisboa, defende que as perspectivas para o papel "são negras". Tendo em conta que os números em cima da mesa já são "tão baixos", António Granado tem dúvidas que alguns títulos impressos se aguentem. "Depende da boa vontade dos patrões dos media a sua continuação", comenta.

António Granado acredita, contudo, que haverá espaço para projectos jornalísticos impressos especializados, como de economia e política.

Já Carlos Magno, presidente da ERC, comenta que "2016 vai ser o ano da reciclagem digital e da inevitável realidade reencontrada. Haverá títulos a prolongar a sua metamorfose do analógico para o futuro em que os diversos grupos terão de assumir a credibilidade das suas marcas. O ano que vem será duro e difícil mas a diversidade servirá de alternativa ao buraco negro da agenda mediática".

A bóia de salvação do sector

A baixa rentabilidade tem levado à concentração de alguns títulos, bem como ao despedimento de profissionais da área. De 2007 a 2014, o número de jornalistas desceu de 6.839 para 5.621, uma redução de 17,8%, segundo os últimos dados da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ). 

Em 2015, o cenário de novos despedimentos voltou a ensombrar o sector com a reestruturação do Sol e do i, que levou à saída de 100 pessoas, o programa de rescisões do Público e a situação financeira complicada do Económico, que recentemente foi alvo de uma penhora pelo Fisco das receitas.

E apesar dos valores das receitas publicitárias estarem a recuperar, a indústria não voltará a registar os mesmos valores do passado, explicou Luís Mergulhão, presidente da OmnicomMediaGroup.

Em Portugal, desde 2013 que se começou a observar uma recuperação do investimento publicitário, tendo aumentado 10% em 2014 face ao ano anterior. Em 2015 o crescimento terá rondado 1 a 2%. 

Como pode o sector inverter a situação de saída de profissionais e impulsionar as vendas e, consequentemente, as receitas? Através da digitalização. Esta parece ser a palavra-chave para o futuro sucesso e sustentabilidade dos media.

Francisco Rui Cádima defende que o caminho que os media têm de fazer para ultrapassar a actual crise passa pelo digital. Como? "Apostando sobretudo na interactividade com o seu público, na inovação, em novas narrativas/plataformas, na agregação de conteúdos e na especialização temática. E em sistemas de 'analytics' [análises], isto é, de Search Engine Optimization/Machine Learning [optimização de motores de pesquisa e conhecimento informático]", referiu.

 

O representante dos patrões dos media, Luís Nazaré, acredita que o sector pode ultrapassar os actuais desafios "a um tempo - inovando, valorizando, especializando e diversificando os conteúdos informativos numa lógica multi-plataforma". E, em simultâneo, capturando novos segmentos e fontes de receitas no meio digital, acrescentou.

"É preciso apostar cada vez mais nas formas digitais de difundir informação, explorando todos os novos recursos que elas permitem, porque é aí que está o futuro, e os órgãos convencionais acordaram tarde e a más horas para essa realidade, reagindo com muita lentidão", apontou Joaquim Vieira. No entanto, o jornalista frisa que esta aposta não é "garantia de sobrevivência, dado que a informação via digital ainda não assegura satisfatoriamente a viabilidade económica dos media. Contudo, acho que sem ela não haverá saída da crise".

O papel do regulador

Perante o actual cenário do sector dos media, que além dos problemas que o assombram há anos como a queda das receitas, as recentes notícias de despedimentos voltaram ao sector.

Um panorama que tem de ser alterado pelos gestores dos grupos de media e não pelo regulador (ERC), segundo os especialistas ouvidos pelo Negócios.

"Nenhum regulador resolve os problemas da indústria. O que se espera é que contribua para um ambiente de negócios saudável e que saiba resolver com inteligência e presteza os conflitos que se lhe apresentam", considera Luís Nazaré.

 

Uma opinião partilhada por Joaquim Vieira: "Não vejo de que forma a ERC poderá contribuir para os media convencionais saírem da crise. Valerá contudo a pena reflectir sobre se não existirá forma de criar uma entidade pública independente, blindada às intervenções e pressões políticas e de outros centros de poder, e dotada financeiramente dos meios necessários, para apoiar e garantir a publicação de alguns media". Isto porque "a existência de media independentes, com formas distintas de abordagem da informação, continua a ser um dos garantes de uma sociedade democrática amadurecida e saudável", sustentou.

 

Para Francisco Rui Cádima a solução para o sector sair da crise "depende sobretudo da gestão e da sua capacidade em reorientar a estratégia da indústria com parcerias com os operadores de redes e os novos intermediários digitais", como o Google e Facebook, exemplificou.

 

Uma sugestão partilhada por António Granado, que também defende que a associação dos media com estes gigantes digitais só traz benefícios. "Veja-se o que se passou em Espanha", sublinhou o professor na Universidade Nova de Lisboa, referindo-se à guerra dos media com o Google que levou à saída do Google News do mercado e, por sua vez, reduziu o tráfego dos sites.

Já Carlos Magno, presidente do regulador, lembrando que em 2016 a ERC fará dez anos, diz esperar "que seja mais útil ao sector. A regulação passa, do meu ponto de vista, mais pela certificação do que pela punição ou pela coima. Espero que o próximo ano seja regular. No verbo e no adjectivo. Espero que cada um siga o seu caminho e que os órgãos de comunicação defendam a sua própria liberdade. Enquadrados sempre pelo seu estatuto editorial e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos", concluiu.

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