Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque

Miguel Cadilhe e o BPN: “Sinto que o tempo me deu razão, mas isso não conforta”

O último presidente do BPN privado vê com “enorme tristeza” o custo da nacionalização da qual foi crítico, aponta a mira a Teixeira dos Santos e Constâncio, e recorda uma confissão de incapacidade do antecessor.
Hugo Neutel 03 de Novembro de 2023 às 09:00

Cada vez mais convencido que a nacionalização foi um "enorme erro", triste com o custo que a opção teve para o Estado e extremamente crítico da atuação do Governo e do Banco de Portugal (BdP). É assim que o último presidente do BPN antes da nacionalização olha para o caso. Miguel Cadilhe considera que os mais de 6 mil milhões de euros que voaram dos cofres públicos ao longo destes quinze anos são a prova de que tinha razão em 2008.

 

O BPN foi nacionalizado há 15 anos. Que memória guarda do período durante o qual liderou o banco? 

Guardo a memória do enorme erro que foi a nacionalização. Disseram que a nacionalização não traria custos para os contribuintes, foi o que se viu, uma enormidade arrastada até ao presente. Não quiseram deixar prosseguir o nosso plano estrutural do grupo, que era um excelente plano. Travaram-no, quando tínhamos várias frentes em execução, frentes que exigiam tempo e serenidade e eram geradores de confiança. E não quiseram ajudar-nos quando se agravou o problema de liquidez do BPN, estava a minha equipa no terceiro ou quarto mês de funções. É dos tais problemas que podem paralisar um banco, se não houver inteligência na situação. Do que precisávamos era de um inequívoco apoio de tesouraria pelo BdP, intercalar, digamos uma espécie de pequeno "whatever it takes" como foi o celebrado rasgo de Draghi em 2012. Em vez disso, o que se nos deparou foi um Governador reticente em tudo o que fosse apoiar a nossa tesouraria. Naquele verão de 2008, não deixei de dizer várias vezes ao governador Vítor Constâncio que o BdP tinha fraquejado durante anos no braço da supervisão e que agora piorava as coisas ao fraquejar no braço da liquidez. No fundo, penso que o BdP temia o que pudéssemos fazer, temia que a minha equipa destapasse a verdade que estava encoberta, a embaraçosa verdade sobre a qualidade e a responsabilidade da supervisão. Temia que as duas auditorias externas e independentes, que imediatamente nós mandámos fazer, pudessem pôr a descoberto a face sombria do BPN e a correspondente passividade da supervisão, como efetivamente puseram, numa extensão aliás que nos surpreendeu. Quem também nos temia, era um conjunto de personalidades politicamente influentes que estavam envolvidas em alguns momentos de gestão danosa do BPN ou do grupo, e cujos nomes haveriam de aparecer sucessivamente.

 

Chegou à presidência do BPN em junho e em outubro denunciou crimes cometidos ao mais alto nível no banco. Lembra-se do primeiro momento em que suspeitou que existiriam problemas dessa natureza?

Rejeitei vezes sem conta o convite para o BPN e o grupo SLN. Por fim, recolhi algumas informações e alguns indícios antes de aceitar, mas nada porém que se assemelhasse ao que depois viemos a auditar e encontrar. Antes de ser eleito, pedi ao Governador para me receber, era para falarmos do dossier BPN, naturalmente sob total reserva, mas ele recusou reunir comigo enquanto eu não estivesse em funções, o que estranhei, me desagradou e me pôs de sobreaviso. Por essas e por outras, preocupei-me desde a primeira hora, ainda antes de ser designado, em rodear a minha equipa de um sólido e externo aconselhamento jurídico. Evidentemente, a segurança jurídica era condição imprescindível para lidarmos com a realidade da qual tivéramos alguns avisos. 

Ver comentários
Saber mais Miguel Cadilhe BPN Teixeira dos Santos
Outras Notícias
Mais notícias Negócios Premium
+ Negócios Premium
Capa do Jornal
Publicidade
C•Studio