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Francesa Alstom obrigada a devolver incentivos a Portugal
A francesa Alstom não contratou tantas pessoas como aquelas com que se comprometeu em 2013 perante Álvaro Santos Pereira e Paulo Portas. Agora, é obrigada a devolver os incentivos financeiros recebidos. E os juros.
O Estado português está a obrigar a francesa Alstom a devolver dinheiro que recebeu nos últimos anos. A empresa francesa não cumpriu o acordado com a AICEP em 2013 e, por isso, vai ter de reembolsar os incentivos financeiros auferidos pela criação de uma unidade fabril em Setúbal.
Assinado por Paulo Portas e Álvaro Santos Pereira em Fevereiro de 2013, o contrato de investimento entre a AICEP e a Alstom Portugal, Alstom Espanha e a Alstom Holdings não foi executado na sua totalidade. Aliás, "para o ano de 2015", foi apurado "um grau de cumprimento do contrato de 62,35%". Um grau que permite a resolução do contrato.
Foi isso que aconteceu, em Outubro de 2016, pelas mãos do ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, e pelo secretário de Estado da Internacionalização, Jorge Costa Oliveira, no Despacho n.º 12801/2016, publicado a 25 de Outubro em Diário da República.
Além de terminar a ligação contratual entre o Estado português e as sociedades, o diploma publicado em Diário da República "implica a devolução do montante do incentivo financeiro pago à Alstom Portugal, acrescido de juros". O pagamento poderá ser feito em "36 prestações mensais". Ou seja, a companhia de origem francesa tem três anos para devolver os incentivos que começou a receber há três anos. Nestes últimos três anos, a Alstom mudou com a aquisição por parte da americana General Electric.
Não foi possível ainda apurar o montante em causa. O Negócios aguarda a resposta do Ministério da Economia. A Alstom não respondeu aos vários contactos.
Empregos criados 43% abaixo do prometido
A auditoria feita ao projecto acordado pela Alstom e o Governo anterior, que previa a construção e equipamento de uma unidade de produção, em Setúbal, "para o fabrico de dois novos equipamentos inovadores direccionados para centrais nucleares", detectou vários incumprimentos. Um deles dizia respeito aos postos de trabalho. A empresa em Portugal contava com 210 postos de trabalho na altura da auditoria, em Novembro de 2015, "quando deveriam constar do seu quadro de pessoal 373 postos de trabalho permanentes, correspondentes aos 55 a criar, acrescidos dos 318 já existentes".
Isto porque, em Fevereiro de 2013, esses eram números com que a companhia francesa se comprometia: "O investimento em causa excede os 13,4 milhões de euros, prevendo-se a criação de 55 postos de trabalho directos e a manutenção de 318, bem como, o alcance, no termo da vigência do contrato, de um valor acumulado de vendas e prestação de serviços de cerca de 616 milhões de euros e de um valor acrescentado bruto acumulado de 187,7 milhões de euros", assinalava o Despacho n.º 2276/2013.
Em Março de 2014, a Alstom, empresa de infraestruturas de energia e transporte, tinha tentado já renegociar o contrato acordado um ano antes, mas não conseguira. O objectivo era promover uma "alteração substancial do projecto de investimento, consubstanciada, nomeadamente, na prorrogação do período de investimento, na substituição dos produtos que deveriam ser fabricados, na redução significativa dos objectivos contratuais e na reformulação do plano de investimento".
A defesa da Alstom
A Alstom justificava que tinha sido alvo de cisão das suas áreas de negócio ligadas às energias renováveis (um dos motivos para ter solicitado a revisão do contrato). Não era só isso a explicar o incumprimento dos objectivos: a conjuntura económica internacional e as dificuldades financeiras dos mercados para onde a companhia exporta também a prejudicaram, segundo avançou na sua justificação.
Um outro aspecto teve que ver com o facto de o investimento não ter cumprido os fins a que estava previstos. "Uma parte significativa dos investimentos realizados decorreram da aquisição de equipamentos que não estão previstos no referido plano e extravasam o âmbito do projecto, tendo sido apurada uma taxa de execução de apenas 48,12% do investimento elegível contratualizado".
Ao todo, para 2015, o grau de cumprimento, como referido, foi de 62,35%. A Alstom, que só concluiu o investimento quatro meses após a data estimada, não fabricou também os produtos previstos que beneficiariam dos incentivos.
Um projecto com grandes elogios
Em 2013, o despacho que anunciava o investimento era de grandes elogios. O investimento iria dar um "contributo estratégico para a economia nacional". A "vertente exclusivamente exportadora" e o "efeito de arrastamento" sobre o resto da economia era positivo, até pelo impulso que iria dar à região de Setúbal.
Em 2014, António Pires de Lima, o sucessor de Santos Pereira na pasta da Economia ainda no Executivo anterior, esteve em Paris onde elogiou o investimento em Portugal como um dos sinais positivos da economia, dando o exemplo da Alstom como um dos interessados no mercado português.