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Quanto vale o corte das bonificações nas reformas? Veja simulações
As novas regras das pensões antecipadas para quem tem carreiras muito longas são bem menos generosas do que o antecipado pelo Governo e a geringonça. Simulações preparadas para o Negócios pela FSO Consultores mostram quanto é que os pensionistas perdem por causa da interpretação que a Segurança Social está a aplicar.
O Governo anunciou o fim dos cortes nas pensões de quem tem carreiras contributivas muito longas, mas, na prática, há quem se reforme sem bonificações e quem continue a reformar-se com as regras antigas que implicam o corte do factor de sustentabilidade. A situação, avançada pelo Negócios na edição desta sexta-feira, 16 de Março, já levou alguns partidos, como o PSD e o PCP, a pedirem explicações ao ministro Vieira da Silva.
Para se ter uma ideia aproximada de quanto esta interpretação pode custar a um pensionista, o Negócios pediu simulações à FSO, uma consultora na área das pensões e da Segurança Social.
O que está em causa
À luz das regras de flexibilização da idade da reforma (por simplificação, chamemos-lhes "regras antigas", anteriores a Outubro de 2017), um pensionista com uma carreira de 48 anos de descontos que quisesse reformar-se, sofreria um corte por via do factor de sustentabilidade (cerca de 14%) e, em contrapartida, poderia ter direito a bonificações pelo facto de ter uma carreira muito longa.
No ano passado, o Governo alterou a lei de modo a favorecer estas pessoas, garantindo que deixariam de aplicar-se-lhes quaisquer cortes, fazendo desaparecer o corte por via do factor de sustentabilidade (chamemos-lhe o "regime novo").
Só que, como tivemos oportunidade de explicar, acabou por não fazer só isso. Ao mesmo tempo que concede a benesse da eliminação do factor de sustentabilidade, deixou de dar a bonificação pelos tais anos a mais de trabalho.
Ou seja, o que está a acontecer é que a Segurança Social calcula a pensão à luz do "regime antigo", com bonificação e corte por via do factor de sustentabilidade. E depois calcula-a à luz do "regime novo", mas não dá a bonificação. Compara os dois regimes e atribui ao reformado aquele que der uma pensão superior.
Quais os impactos?
Os efeitos desta prática, que tanto especialistas ouvidos pelo Negócios, como o próprio PCP considera que não respeitam a lei, dependem de caso para caso.
Há pensionistas que, tendo direito a grandes bonificações, acabam por receber mais pelo "regime antigo", e se reformam com o corte do factor de sustentabilidade. E há pensionistas para quem o "novo regime" é melhor, mesmo quando a Segurança Social lhes corta a bonificação.
Em comum, num caso e noutro, sempre que tivessem direito a bonificações, têm o facto de ficarem a perder face aquele que era o cenário expectável: que fosse levantado o factor de sustentabilidade e mantivessem o direito às bonificações.
O Governo, que ao longo da semana teve oportunidade de dar todas as explicações, divulgou dados ao início da noite desta sexta-feira: das 9.714 pensões de carreiras longas com intenção de deferimento desde Outubro, "99% beneficiam do novo regime", com pensões mais elevadas e sem penalizações. "Do total apenas 1% tem cálculo superior ao valor da sua pensão" com a aplicação do regime que tem o corte do factor de sustentabilidade. São "casos marginais", de "pessoas com longuíssimas carreiras contributivas", disse fonte oficial.
Estes dados indicam que a idade média destas reformas foi de 61,5 anos. Não revelam quantas pessoas perderam a bonificação nem quantas potencialmente a podem vir a perder. O Negócios também voltou a pedir ao Governo que explique de que forma é que a lei permite esta solução.
No quadro abaixo, preparado pela FSO consultores, apresentamos nove casos que ilustram o impacto desta interpretação. Por exemplo, um trabalhador que começou a trabalhar aos 13 anos de idade e peça para se reformar aos 64 anos de idade com 51 anos de descontos, à luz do anterior regime (com o corte de 14% e as bonificações) teria uma pensão sem qualquer redução e até ligeiramente melhorada: 1,0403 vezes a sua pensão estatutária. À luz do "novo regime", na forma como a Segurança Social está a aplica-lo, ficaria com uma pensão mais baixa – 4% inferior aquela que resulta das "regras antigas", pelo que receberá a pensão pela regra "antiga". E fica com uma pensão 20,8% inferior aquela que teria se a Segurança Social concedesse o fim do factor de sustentabilidade e a bonificação.
Tomemos agora o caso de quem iniciou a carreira aos 15 anos, tem 48 anos de descontos e se reforma aos 63 de idade (linha 3). Pelas regras "Antigas", a pessoa teria um corte na pensão – só teria direito a 90,6% da pensão estatutária. As regras novas, como a Segurança Social as está a aplicar, dão-lhe uma pensão 9,4% superior a que resulta das "regras antigas", pelo que o novo regime é mais favorável. Mas, ainda assim, não é tão favorável quanto devia, porque, como não se aplicam as bonificações, fica com uma pensão 5,2% inferior à que era suposto.
Nota: As duas últimas linhas da coluna foram corrigidas esta segunda-feira, 19 de Março, a pedido da FSO Consultores.