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Costa: "Não podemos ter a ilusão de que passámos do inferno para o paraíso"
O primeiro-ministro reconhece que o país não passou "do inferno para o paraíso" com a recuperação económica, numa entrevista em que sublinha a "regra de elementar bom senso" de não mexer numa solução de governo que "corre bem".
Numa entrevista de 12 páginas à revista Visão, que irá para as bancas na quinta-feira, António Costa começa por lembrar que os excedentes do saldo primário já vêm de "há três anos", permitindo "uma redução consistente da dívida pública", o que é uma "trajetória a prosseguir" porque não está tudo resolvido.
"Não podemos ter a ilusão de que passámos do inferno para o paraíso. Felizmente já largámos o inferno e, ao contrário do que alguns temiam, o diabo não regressou. Mas temos de prosseguir no caminho solidamente", acentua o líder do executivo, mostrando-se apostado em prosseguir o caminho de redução da dívida pública.
Costa considera, aliás, que os "os cidadãos têm mais bom senso do que aquele que reina na bolha político-mediática" e, por isso, percebem a necessidade de continuação do esforço de consolidação orçamental.
"As pessoas percebem que não podemos ir mais longe do que temos ido e o caminho que temos vindo a fazer. Também sabem que, em ano de eleições, se pudéssemos fazer ainda melhor, faríamos. As pessoas apreciam esse sentido de responsabilidade", argumenta.
O primeiro-ministro critica "alguns setores profissionais" que se "convenceram de que, por ser ano eleitoral, "o Governo facilmente ficaria refém da contestação social".
"Enganaram-se. O País não esquece o sofrimento pelo qual passou e pelo qual não quer voltar a passar", sublinha.
Na opinião de chefe do executivo, os portugueses sabem que "a melhor garantia é poderem continuar a contar com um Governo que avança com segurança a cada passo que dá".
Quanto à estratégia eleitoral, António Costa aponta o objetivo de alcançar "o melhor resultado possível" nas legislativas de 06 de outubro, mas admite que se chegou "a uma fase do calendário político em que, inevitavelmente, cada um puxará a brasa à sua sardinha..."."E o PS também tem de fazer pela vida", salienta.
O também secretário-geral socialista admite, por outro lado, a repetição da solução de Governo do PS com o apoio parlamentar do PCP, PEV e BE, designada por 'geringonça', afiançando: "Nunca imporei condições para governar. Devemos governar nas condições que os portugueses determinarem".
"Tenho uma regra de elementar bom senso: se as coisas correm bem, porquê mudar?", questiona o chefe do Governo, indicando que "a confiança entre os parceiros é superior àquela que existia há quatro anos", quando alguns dos protagonistas nem sequer se conheciam.
António Costa considera mesmo que "um entendimento só será impossível se algum dos envolvidos estabelecer como linha vermelha alguma matéria que sabe, de antemão, não ser aceite pelos outros".
"Para já, nesta legislatura saímos com uma confiança reforçada que nos permite pensar que é possível esse entendimento. Aliás, tenho dito que isso nem depende de haver ou não haver maioria absoluta", salienta o líder socialista, reiterando a sua preferência por manter os parceiros fora do executivo: "Por vezes, é preferível manter uma boa amizade a estragá-la com uma relação amorosa falhada..."
O primeiro-ministro frisa que, na legislatura que agora vai terminar, o executivo conseguiu "cumprir todos os compromissos assumidos com os portugueses e as posições conjuntas com os parceiros, e ainda respeitar os acordos com a União Europeia".
"Nós não governamos para o BE nem para o PCP. Nós governamos para os portugueses e governamos o País. Cada ciclo tem as suas prioridades. Para a próxima legislatura, veremos quais as propostas que os partidos têm a apresentar e qual o grau de convergência possível", afirma.
Quanto à possibilidade de uma solução de Bloco Central, defende que "só deve surgir em circunstâncias extraordinárias", porque, "caso contrário, a ausência de alternativa dá espaço às forças radicais ou populistas".
Costa sublinha que "essa ideia de que só a direita gere bem as contas está desmentida" e até lembra que, quando foi presidente da Câmara de Lisboa, também teve de pôr as contas em ordem.
Questionado sobre a "crise na direita" apontada pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa limita-se a responder: "O PR pode acumular as suas funções com as de analista político. O primeiro-ministro não pode nem deve..."
Na entrevista, o chefe do executivo frisa que, "em valor absoluto, há mais recursos na Saúde" do que há quatro anos e aborda também a necessidade de intervenção em bancos como o Banif e as relações com o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa.
"Um incidente com um banco não é, infelizmente, um incidente com qualquer outra empresa", frisa o primeiro-ministro, lembrando que, em 2008, "a falência de um banco arrastou o mundo para a maior crise económica desde 1929".
Quanto às suas relações com o atual governador do Banco de Portugal, Costa diz que "nunca foram desagradáveis", "nem mesmo sabendo que na própria tarde em que o governo estava a tomar posse", Carlos Costa "se encontrava a dirigir uma carta ao Banco Central Europeu informando que o Banif tinha de entrar em processo de resolução nas semanas imediatamente a seguir".