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A despedida do “político irrepetível”

Um corrupio de gente passou pelos Jerónimos. Muitos políticos, muitas caras conhecidas e muitos, ainda mais, rostos anónimos, que quiseram prestar a última homenagem a Mário Soares. O dia foi de despedidas e de elogios.

09 de Janeiro de 2017 às 21:44
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"As pessoas já não se lembram, mas ele sempre gostou muito de rosas amarelas." Maria Emília Duque, 66 anos, militante socialista, tem na mão os autocolantes da campanha de Soares à Presidência da República em 1986, a tal em que começou com as sondagens a darem-lhe 8% e em que acabou vencedor. "Soares é fixe", lê-se num deles. No outro uma rosa amarela a apelar ao voto no PS. "São recordações, diz Maria Emília. "Tinha que vir aqui. Mário Soares foi um grande político. É muito difícil ser como ele".

 

Um "homem único", um "político irrepetível". Ao longo do dia, em dezenas de comentários que foram sendo proferidos pelas muitas figuras públicas que quiseram prestar homenagem a Mário Soares, a ideia foi repetida até à exaustão: deixou uma marca muito pessoal na política portuguesa e na história de democracia do país.

 

Emília Duque, com as suas lembranças de campanhas soaristas foi de manhã cedo para a Praça do Município, o primeiro local onde a cidade prestou homenagem ao ex-presidente. O cortejo fúnebre, que passara primeiro pela casa do Campo Grande onde sempre viveu a família Soares, atravessou a cidade e em frente à Câmara Municipal a urna foi trasladada para um armão da GNR, puxado a cavalo, que a levou até Belém. Jonas e Lilá, os netos mais novos, entregaram à GNR duas das mais de 60 condecorações que o avô recebeu ao longo dos anos e que o acompanharam até ao Mosteiro dos Jerónimos, naquele que foi um dos primeiros momentos solenes do dia.

 

Sobre a urna, apenas uma bandeira da República e a enfeitar o carro, rosas amarelas. As tais de que Soares gostava muito. Fernando Medina, num gesto cheio de simbolismo, juntou-lhes um cravo vermelho. Mais tarde, em declarações aos jornalistas, diria, emocionado, que Soares "deixou um legado imortal" de "valores por que vale a pena continuar a lutar e um grande exemplo de dedicação, coragem, luta pela democracia e pela tolerância".

 

Passava pouco da uma da tarde quando o cortejo fúnebre, acompanhado por 84 cavalos da GNR chegou a Belém, onde foi recebido por centenas de pessoas aguardavam e foi no meio de um forte aplauso que a urna entrou no Mosteiro, ao som da Marcha Fúnebre tocada pela banda da GNR.

 

No final, uma voz no meio da multidão gritou "Soares é Fixe" e várias outras se lhe juntaram, recuperando o tal slogan da campanha de 86. Do lado de lá das baias colocadas pela polícia para impedir a passagem agitavam-se bandeiras e viam-se cravos vermelhos no ar.

 

 

"Foi muito importante contra o fascismo"

 

Margarida, Lourenço, Carolina, Mariana, Beatriz, Leonor. Têm todos 14 anos, andam no 9º ano e sabem muito bem quem foi Mário Soares. "Foi uma pessoa corajosa." "Teve uma grande carreira política." "Foi muito importante contra o fascismo.". São alunos do Colégio Moderno, pertencente à família Soares, e conheciam o ex-Presidente de o ver por lá, na escola ou na rua, que é a mesma da casa dele. "Cumprimentava sempre toda a gente, era tipo o pai do nosso colégio". Estão todos na fila para entrar na Sala dos Azulejos, no Mosteiro, onde o corpo de Mário Soares se encontra em câmara ardente e onde querem cumprimentar a filha, Isabel Soares, directora do Colégio Moderno.

Uma fila longa. Formou-se ao início da tarde, quando se abriram as portas aos populares, e manteve-se quase ininterrupta até à noite. Só familiares, amigos e figuras públicas entravam directamente, de acordo com o protocolo gerido pelo Ministério dos negócios Estrangeiros, uma vez que é funeral com honras de Estado.

Houve, no entanto, quem optasse por ir para a fila dos populares, como José Sócrates, que apareceu a meio da tarde. À saída disse aos jornalistas que Soares foi "o político carismático do século XX", "um homem absolutamente extraordinário, que se bateu contra a ditadura". Ambos tiveram uma relação muito próxima, mesmo nos últimos tempos, com Sócrates a braços com a Operação Marquês e Soares sempre a apoiá-lo e a visitá-lo na prisão. "Foi um grande amigo", disse, emocionado, o ex-primeiro-ministro

 

Sócrates, Ferro Rodrigues, Manuel Alegre, Maria Manuel Leitão Marques, Pedro Silva Pereira, Helena Roseta, mas também Jerónimo de Sousa, Pedro Passos Coelho, Assunção Cristas, Catarina Martins e muitos outros nomes da vida política, no activo ou retirados e dos vários quadrantes políticos. Todos passaram pelos Jerónimos, assim como ex-presidentes da República, como Jorge Sampaio ou Ramalho Eanes. E, sendo certo que Soares nunca foi um homem consensual – nem sequer na morte, baste dar uma volta pelas redes sociais -  todos lembraram a sua contribuição para a democracia portuguesa. Um político "irrepetível", como diria Helena Roseta.

 

António Costa, que optou por não interromper a visita de Estado à Índia, foi um dos grandes ausentes e a sua decisão tem recebido algumas críticas. Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros que regressou à pressa, procurou dar-lhes resposta. A opção do primeiro-ministro, afirmou, "é uma bela homenagem a Mário Soares. Tenho a absoluta certeza que ele compreenderia", afirmou.

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