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Frank Carlucci: o americano que acreditou na vitória da democracia em Portugal

Frank Carlucci, o embaixador dos EUA em Portugal durante os anos de brasa após a revolução de 25 de Abril de 1974 morreu domingo com 87 anos. Martins da Cruz, que privou com ele, diz que se perdeu "um bom amigo" do país.

Jorge Paula
04 de Junho de 2018 às 22:24
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A 16 de Setembro de 2003, Frank Carlucci e Mário Soares reencontraram-se na residência do embaixador norte-americano em Lisboa, na rua de Sacramento à Lapa. Os dois deixaram marcas fortes no período pós-revolução de 25 de Abril de 1974. Soares faleceu a 7 de Janeiro de 2017. Carlucci, que liderou a diplomacia dos Estados Unidos em Portugal entre 1975 e 1978, morreu no domingo aos 81 anos. O óbito foi tornado público esta segunda-feira, e ocorreu na sequência de complicações relacionadas com a doença de Parkinson.

Frank Carlucci, nos períodos de "brasa" da revolução era catalogado como o homem da CIA em Portugal e "persona non grata" para a esquerda radical. Mário Soares, o amigo dos americanos. Carlucci acabou por ser agraciado a 24 de Novembro de 2003 com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, atribuída pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio.

O reencontro desse dia foi testemunhado pela jornalista Teresa de Sousa, que na edição de 23 de Setembro do Público, o relata desta forma, usando as palavras de Carlucci. "O dr. Soares e eu passávamos aqui muitas horas a conversar sobre os problemas políticos portugueses, sobre as relações entre os nossos dois países e como seria possível fazer de Portugal uma democracia de tipo ocidental. Falávamos horas e horas..." Soares pega-lhe na palavra: "Estar aqui [na embaixada dos EUA] ajudava a perceber o que era Portugal e que talvez não fosse assim tão fácil alterar a sua natureza. Como os comunistas pensavam."

Os F-16 que Carlucci fez voar para Portugal

"Portugal perdeu um bom amigo", sublinhou o embaixador António Martins da Cruz ao Negócios. Segundo o antigo diplomata, Carlucci foi importante para Portugal em três momentos.

O primeiro, enquanto embaixador em Lisboa. Nestas circunstâncias "contrariou a indicação de Henry Kissinger [então secretário de Estado norte-americano] de fazer de Portugal uma vacina contra os regimes comunista". "Kissinger estava pronto para isolar Portugal dentro da NATO e cortar os programas de assistência dos EUA, mas Carlucci não concordou. Argumentou que o país poderia ser salvo para a democracia por causa dos seus laços com o Ocidente e pela força da Igreja Católica a nível local", corrobora o Washington Post, num obituário publicado na segunda-feira.

Depois, enquanto secretário de Estado da Defesa e durante uma visita do primeiro-ministro, Cavaco Silva, aos EUA, em 1988, criou as condições para que Portugal recebesse os primeiros aviões F-16, que tinham pertencido à Guarda Nacional norte-americana.

Finalmente, lembra Martins da Cruz, enquanto presidente honorário do grupo empresarial Carlyle, sempre teve Portugal em atenção. Através da Euromaer concretizou investimentos imobiliários na Alta de Lisboa e em 2004 o grupo Carlyle, em parceria com o BES e o empresário Américo Amorim, apresentou ao Governo uma proposta para substituir os italianos da ENI na posição de maior accionista da Galp. Esta última não se chegou a concretizar e a Euroamer, onde um dos sócios era Artur Albarran (jornalista da RTP e TVI) aparecia em 2016 na lista das 13 empresas que deviam mais de cinco milhões ao Estado.

A equipa da CIA fazia "o que lhes mandava"

O epíteto de homem da CIA em Portugal, afinal, era mesmo apropriado. "Tudo o que a CIA fez foi sob o meu comando. Qualquer acção que possa ter desenvolvido destinava-se a executar a política dos EUA, que era apoiar as forças democráticas em Portugal. A CIA era parte da equipa [da embaixada] e eles faziam o que lhes mandava", afirmou Carlucci no livro "Carlucci vs. Kissinger - Os EUA e a Revolução Portuguesa", de Bernardino Gomes e Tiago Moreira de Sá. Segundo os autores deste livro, publicado a 2008, "a acção da América acabou mesmo por contribuir para a vitória das forças democráticas".

Marcelo Rebelo de Sousa, citado pela Lusa, considera que Carlucci "desempenhou funções num período muito difícil, que foi o período talvez mais quente da revolução em Portugal" e "foi um dos dois grandes protagonistas do período da revolução".

Nascido a 19 de Outubro de 1939 em Scranton, na Pensilvânia, Frank Carlucci estudou na Universidade de Princeton, tendo depois transitado para a Harvard Business School. Segundo a Wikipédia serviu na Marinha entre 1952 e 1954, passou pelos serviços externos de 1956 a 1969, tendo participado em 1961 numa missão da CIA no antigo Congo belga, tendo de seguida passado por vários lugares durante a administração de Richard Nixon, entre as quais a de secretário de Estado da Defesa entre 1987 e 1989.
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