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Da Bíblia à pornografia: o novo programa oficial Republicano

Foi aprovado esta semana o programa político do Partido Republicano, actualizado de quatro em quatro anos. Conheça oito dos mais polémicos capítulos.

23 de Julho de 2016 às 15:00
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De quatro em quatro anos, os principais partidos norte-americanos actualizam o seu programa político. É a chamada "Platform", cuja versão republicana foi aprovada esta semana, coincidindo com a nomeação oficial de Donald Trump como o candidato presidencial. O documento normalmente parte de uma base pré-existente, junta-lhe uma série de consultas populares (actualmente online) e os temas são depois debatidos por uma comissão de membros do partido, que decidem as propostas e os termos em que estas são passadas ao papel. A nova versão reflecte o habitual conservadorismo republicano mas junta-lhe factores claramente influenciados pelas posições extremistas de Donald Trump. Como o Wall Street Journal salientou, em editorial, este programa é "o mais extremista" de qualquer partido americano de que há memória. "Em vez de tentar reconciliar as posições heréticas do Sr. Trump com a ortodoxia conservadora, os autores simplesmente optaram por seguir a visão mais extremista das duas visões", acrescenta.
Agora que Trump vai oficialmente disputar o lugar de Barack Obama, é oportuno conhecer algumas das medidas mais polémicas advocadas no programa republicano, que abre com a seguinte dedicatória: "Para todos que se mantêm fortes perante o perigo, para que o povo Americano possa ser protegido dele; os homens e mulheres das nossas forças militares, das nossas forças policiais e dos serviços de primeira resposta de todas as comunidades na nossa terra; e para as suas famílias".

 

O muro com o México e quem o vai pagar

É uma das mais conhecidas medidas de Trump, mas só parte é novidade. O programa de 2012 já pedia uma barreira física entre os EUA e o México, mas composta por uma dupla vedação, que aliás chegou a estar prevista desde 2006 mas que nunca foi concluída. Agora, chegou a vez do muro, que terá de cobrir toda a fronteira do sul dos EUA de forma a parar "o trânsito pedestre e veicular". O que não surge na plataforma é como esta gigantesca obra será paga, mas Trump já explicou, no seu próprio site: a conta, de entre 5 e 10 mil milhões de dólares, será apresentada ao México. Nas suas contas, 24 mil milhões de dólares são enviados anualmente dos EUA para o México, dinheiro de trabalhadores mexicanos que vai para as suas famílias. "A maioria deste dinheiro vem de imigrantes ilegais", afirma, sem citar uma fonte, acrescentando que "este dinheiro serve, na prática, como a Segurança Social para as famílias pobres no México". A primeira medida de Trump seria obrigar todos aqueles que querem transferir dinheiro para o México a provar, em cada transacção, que estão legais nos EUA. "Ao segundo dia o México irá protestar", prevê Trump, que admite deixar cair a medida se o país vizinho pagar a construção do muro. "É uma decisão fácil para o México: façam um pagamento único de entre 5 a 10 mil milhões de dólares e assim garantem que 24 mil milhões continuam a fluir para o vosso país, ano após ano".

 

Fim do casamento entre pessoas do mesmo sexo

É uma velha luta conservadora e está de novo na agenda. Num capítulo intitulado "Grandes Famílias Americanas", a plataforma afirma que "a família é o alicerce da sociedade civil, e a pedra de toque da família é o casamento natural, a união entre um homem e uma mulher". "Não aceitamos a redefinição do que é o casamento por parte do Supremo Tribunal e exigimos a sua reversão, seja através de uma reconsideração judicial ou de uma emenda constitucional devolvendo aos Estados o controlo sobre o casamento", pode ler-se. O documento defende ainda que as escolas devem ser livres de se organizar como quiserem, nomeadamente na questão dos lavabos (não sendo obrigadas a qualquer medida para servir estudantes transgéneros), e que os serviços devem ser livres de "declinar vender produtos ou serviços a indivíduos cujas actividades vão contra as suas visões religiosas sobre essas actividades". No entanto, esta semana, Donald Trump incluiu, de forma surpreendente, a comunidade LGBT entre os grupos cujos direitos pretende defender.  

 

Fim da "febre" das alterações climáticas

"Rejeitamos as agendas tanto do Protocolo de Quioto como do Acordo de Paris, que representam apenas o compromisso pessoal dos seus signatários; nenhum acordo deste tipo pode vincular os Estados Unidos até ser submetido e ractificado pelo Senado", é uma das afirmações. Em geral, o programa contesta as certezas acerca das alterações climáticas e defende que nenhum tipo de energia (nomeadamente renovável) deve ser protegido em detrimento dos outros. As limitações ambientais – à construção, à exploração de recursos e à utilização do carvão, por exemplo – são vistos como obstáculos ao desenvolvimento económico e à criação de postos de trabalho, que devem ser removidos.

 

A pornografia é uma "ameaça pública"

Foi um dos temas debatidos pelo comité da plataforma, até se encontrar os termos certos da redacção final, nomeadamente se a pornografia deve ser considerada um risco para a saúde. Acabou por ficar essa classificação, associada à protecção das crianças. "A internet não se pode tornar um refúgio para os predadores. A pornografia, com os seus efeitos nefastos, especialmente nas crianças, tornou-se uma crise de saúde pública que está a destruir as vidas de milhões. Encorajamos os Estados a continuarem a lutar contra esta ameaça pública e reafirmamos o nosso compromisso para com a segurança e o bem-estar das crianças", afirmam os responsáveis republicanos.

 

Bíblias nos liceus

Tal como acontece em inúmeros outros temas, os republicanos querem tirar poder ao Governo central e dá-lo aos Estados e aos cidadãos. Nas escolas é também assim, com a proposta de que os estabelecimentos de ensino não tenham de retirar símbolos religiosos das suas instalações e que tenham a liberdade de propor um currículo de formação religiosa. "Sendo um bom conhecimento da Bíblia indispensável para o desenvolvimento de uma cidadania educada, encorajamos as legislaturas estaduais a oferecer a Bíblia num currículo literário como uma possibilidade de escolha nos liceus americanos". Todo o documento é perpassado por um sentimento religioso muito acentuado, estabelecendo que há direitos que os americanos receberam de Deus e não do Governo, pelo que este não lhos pode tirar.

 

Apoio total a Israel

Num subcapítulo intitulado "O nosso apoio inequívoco a Israel", a plataforma afirma isso mesmo, naquilo que é um clássico americano e, sobretudo, republicano. "É o único país do Médio Oriente onde encontramos liberdade de expressão e liberdade religiosa. Por isso, o apoio a Israel é uma expressão do Americanismo, e é responsabilidade do nosso governo fazer avançar políticas" nesse sentido. "O nosso partido orgulha-se de estar ao lado de Israel, agora e sempre", conclui. Palavras menos doces vão para o Irão e até para a Rússia, apesar de Trump ter elogiado Vladimir Putin mais de uma vez. Depois de referir os traços comuns entre os povos americanos e russos, vem a crítica: "temos um problema em comum: a contínua erosão das liberdades pessoais e dos direitos fundamentais sob a liderança dos actuais oficiais do Kremlin. Repressivos em casa e irresponsáveis externamente, as suas políticas colocam em perigo as nações que ganharam a auto-determinação depois do colapso da União Soviética", afirma. "Iremos enfrentar o regresso da beligerância russa com a mesma determinação que levou ao colapso da União Soviética. Não aceitaremos qualquer mudança territorial na Europa de Leste imposta pela força, na Ucrânia, na Geórgia ou em qualquer outro lugar, e iremos usar todas as medidas constitucionais apropriadas para levar à justiça os praticantes da agressão e do assassínio".

 

Pena de morte sim, aborto não

"Apoiamos uma emenda da vida humana à Constituição, e legislação para tornar claro que as protecções da 14ª Emenda se aplicam às crianças antes do nascimento", é a posição de partida. Isto traduz-se também no corte de fundos federais a qualquer instituição que faça ou promova de qualquer forma a interrupção voluntária da gravidez. "Apoiamos a designação de juízes que respeitem os valores familiares tradicionais e a santidade da vida humana inocente", acrescenta. A palavra inocente não é usada de forma inocente, até porque a santidade da vida não é defendida quando toca à penalização de criminosos. "A constitucionalidade da pena de morte é firmemente definida pela sua menção explícita na 5ª Emenda. Com as taxas de crime a explodirem nas nossas grandes cidades, condenamos o Supremo Tribunal e a sua erosão do direito das pessoas de aplicarem a pena capital nos seus Estados".

 

Não ao controlo de armas

"Defendemos o direito de os indivíduos manterem e usarem armas, um direito natural inalienável que precede a Constituição e é assegurado pela 2ª Emenda. Posse legal de armas permite aos Americanos exercer o seu direito divinamente atribuído de se defenderem, pela segurança dos seus lares, dos seus queridos e das suas comunidades", é posição oficial sobre o tema. Nada de novo, portanto, conhecendo-se a longa e próxima relação entre o Partido Republicano e a poderosa National Rifle Association (NRA). Os republicanos são ainda contra algumas medidas intermédias defendidas pelo Presidente Obama, como a proibição de venda ao público de alguns tipos de armas automáticas ou o racionamento na venda das munições de maior intensidade de disparo.

Aqui pode consultar o programa na íntegra.

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