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Madeira justifica manutenção da zona franca em mãos privadas com "mais eficiência"
O Governo Regional refere à TSF que o prolongamento por dez anos da concessão à SDM (dominada pelo grupo Pestana) cumpriu a lei das contratações e garante uma gestão mais expedita da zona franca. Especialista fala de "burla legal" e "caso único no mundo".
O Governo Regional da Madeira considera que a renovação por mais dez anos da concessão da zona franca da Madeira ao mesmo privado que a geriu nos últimos 30 anos (a Sociedade de Desenvolvimento da Madeira – SDM -, que é controlada pelo grupo Pestana) garante uma gestão mais eficiente que a administração pública.
O argumento é apresentado esta sexta-feira, 10 de Março, pelo secretário Regional das Finanças, Rui Gonçalves, em declarações à TSF. De acordo com o mesmo meio, a opção por manter o estipulado no contrato original – de preferência pelo anterior concessionário – também contraria os avisos deixados pelo Tribunal de Contas, quando em Janeiro de 2016 publicou os resultados de uma auditoria ao controlo da receita das concessões da Administração Regional Directa.
A renovação da concessão à mesma empresa – onde a Região Autónoma detém agora uma participação de 49%, depois de reforçar no final de Fevereiro a posição anterior, de 25%, com subscrição de novas acções - estaria prevista no contrato de concessão inicial, desde que houvesse uma proposta por parte dos gestores privados.
Mas o TdC considerou que essa solução "atinente ao instituto da renovação contratual não se compatibiliza com a tutela conferida ao princípio da protecção da concorrência, em sede de contratação pública, tal como está plasmada no ordenamento jurídico nacional e comunitário," lê-se no relatório da auditoria.
Essa predisposição do parceiro privado para a renovação chegou a 28 de Dezembro do ano passado, depois de o Governo ter convidado, a 25 de Novembro, a empresa a chegar-se à frente. No início de Fevereiro deste ano, o Conselho do Governo aprovou a adjudicação à SDM da concessão de serviço público "Administração e Exploração da Zona Franca da Madeira ou Centro Internacional de Negócios da Madeira".
Rui Gonçalves defende que o procedimento cumpriu o previsto no Código dos Contratos Públicos (através da figura do ajuste directo) e que a gestão privada do Centro Internacional de Negócios da Madeira é "muito mais eficiente que uma gestão pública", já que dispensa etapas como o visto prévio do Tribunal de Contas, género de procedimentos com os quais "não se compadece (…) a gestão de uma praça tão competitiva como é a da Madeira," defende.
Contudo, um economista citado pela TSF, João Pedro Martins, refere que este caso – gestão privada da zona franca é único no mundo. "É uma burla legal para beneficiar amigos. É o que acontece há 30 anos e vai continuar. É o único offshore do mundo em que um privado gere os tributos da colectividade", atribuindo "a Dionísio Pestana [dono do grupo Pestana] (…) um benefício que está vedado aos restantes concidadãos".
Contrato revogado antecipadamente, Governo reforça posição na SDM
O contrato de concessão original foi celebrado a 8 de Abril de 1987 e a sua validade expirava a 6 de Setembro deste ano. Mas, por mútuo acordo, Governo e SDM concordaram em antecipar o fim do contrato vigente e o início do novo contrato de concessão. Uma decisão que foi publicada no mesmo Jornal Oficial em que se formalizou a renovação do contrato com a mesma entidade.
A alteração da posição do Governo no capital da sociedade eleva também para 62% a fatia da receita obtida junto das empresas que usam na zona franca, contra os anteriores 39%. Já os privados passam a receber 38% do bolo.
No início deste mês o Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) anunciou ter registado 177 novas empresas no ano passado, aumentando para 1.996 o número de entidades em operação. O CINM terá obtido 190 milhões de euros em receitas fiscais, contra 151 milhões um ano antes, tendo o centro representado mais de 60% das receitas de IRC arrecadadas no arquipélago e mais de 17% das receitas de toda a região autónoma.
Em Março de 2015 Portugal acordou com a Comissão Europeia o Regime IV (que vigorará até final de 2027, data que coincide com a data do fim da concessão à SDM), que concede vantagens como taxa de IRC reduzida de 5% e recuperação de benefícios ao nível de distribuição de dividendos aos sócios e accionistas, condicionadas à criação de postos de trabalho e a investimento mínimo de 75.000 euros.
As empresas sediadas no CINM são oriundas de 60 países, 74% das quais provenientes da União Europeia. Cerca de um quarto das firmas ali estabelecidas têm origem portuguesa.