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Entrada das contas públicas em défice “não é uma fatalidade”, diz Mário Centeno
Governador do BdP explica diferenças face a previsões do Governo com outro cenário macroeconómico, mas também hipóteses assumidas para a execução orçamental. Mas “não há nada determinístico” que impeça resultado melhor.
Apesar de o Banco de Portugal (BdP) estar a prever um forte agravamento orçamental para os próximos anos, com a entrada das contas públicas em défice já a partir de 2025, Mário Centeno diz que este cenário "não é uma fatalidade" e que o Governo poderá chegar a resultados melhores em função da execução orçamental.
As projeções apresentadas nesta sexta-feira, no Boletim Económico de dezembro, apontam para défice de 0,1% do PIB em 2025, seguindo-se um défice de 1% do PIB em 2026 e novamente saldo negativo em 0,9% do PIB em 2027. A deterioração das contas públicas projetada coloca também o país a ultrapassar os limites máximos de variação de despesa primária líquida acordados com a Comissão Europeia no plano orçamental estrutural de médio prazo, para além das margens de segurança permitidas pelas novas regras orçamentais europeias.
"Não é uma fatalidade. Mas com os dados que temos aquele é o resultado que temos", afirmou o governador do Banco de Portugal, em conferência de imprensa, assegurando ter havido uma avaliação "judiciosa e cautelosa", quando questionado sobre as diferenças face às previsões do ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento.
Segundo Mário Centeno, as diferenças são explicadas em parte pelo diferente comportamento previsto para os agregados do PIB (as previsões de variação do PIB do BdP e do Governo são, em grande medida, aproximadas), mas também com diferentes hipóteses assumidas para a execução orçamental.
A exemplo, o governador salientou que "há alguma incerteza neste momento sobre o impacto das alterações de IRS, que foram múltiplas, muito numerosas" e admitiu que será possível, por exemplo, que a descida de retenções na fonte do imposto deste ano – a partir de setembro, mas na qual o Governo procurou fazer retroagir o efeito a janeiro, com vários contribuintes a não terem de descontar IRS em alguns meses – implica menores reembolsos em 2025, com impacto na receita desse ano. "É possível que haja aqui uma translação da receita de IRS de 2024 para 2025", disse.
Em todo o caso, Mário Centeno assinalou que, no que diz respeito à ultrapassagem dos limites de despesa líquida em 2025, basta a evolução das despesas com pessoal e com as transferências sociais para determinar o esgotamento da margem de variação admitida.
Apesar destas projeções fortemente negativas, o governador do Banco de Portugal defende que estará nas mãos do Governo manobrar a execução orçamental para obter melhores resultados. "Não há nada determinístico na execução orçamental, exceto a vontade de a fazer" afirmou.
Na apresentação do novo Boletim Económico, Centeno deixou também alertas quanto à evolução da economia, salientando que o indicador diário de atividade do económico do BdP está a sinalizar abrandamento no final do ano, factor que contribuiu para revisão em baixa – numa décima – da estimativa de crescimento para este ano, para 1,7%. Pesa contra o PIB nacional a deterioração das condições globais, contrariadas em parte internamente por uma agora prevista melhor evolução do consumo público e do investimento público.
O cenário de médio prazo para o crescimento do PIB, assinalou também Centeno, não inclui ainda a hipótese de imposição de tarifas pelo Presidente norte-americano, Donald Trump, a partir de janeiro, à semelhança do exercício também apresentado ontem pelo Banco Central Europeu. Essa hipótese fica para já do lado dos riscos descendentes que se poderão materializar.
Em todo o caso, Portugal deverá continuar a crescer mais do que a Zona Euro ao longo do próximos anos, com a manutenção do percurso de convergência a ser sublinhado como positiva pelo governador do BdP.