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Costa e Marcelo dizem que documento do BCE é técnico. E depois?

Presidente da República e primeiro-ministro desvalorizaram documento que o BCE se diz surpreendido com o mau desempenho de Portugal na implementação de reformas e no qual se defendem sanções para países como Portugal. O que pensa, afinal, o BCE?

Miguel Baltazar/Negócios
22 de Março de 2017 às 20:17
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O presidente da República e o primeiro-ministro desvalorizaram esta semana a posição do BCE sobre os desequilíbrios macroeconómicos excessivos que o Negócios noticiou com o título "BCE quer ultimato a Portugal: mais reformas ou sanções".

O Presidente da República foi forçado a desdizer a sua Casa Civil – que inicialmente considerou a posição do BCE "inacreditável" – dizendo tratar-se de um "documento técnico". O primeiro-ministro acrescentou que o documento "não faz avaliação própria, mas pronuncia-se sobre o relatório da Comissão Europeia".
       

Vale a pena detalhar a natureza do boletim, o que lá vem escrito sobre o Procedimento por Desequilíbrios Macroeconómicos (PDM) e qual é a posição do BCE sobre o assunto.

O que é o Boletim Económico do BCE?


É o principal documento de clarificação aos cidadãos da Zona Euro e à comunidade internacional sobre a forma como o BCE está a olhar para a realidade económica e financeira da região.

O boletim económico é divulgado duas semanas após cada reunião de política monetária do banco central e contém a informação a partir da qual o Conselho do BCE (liderado por Draghi e Constâncio) toma decisões como subir ou descer juros; pedir mais ou menos reformas estruturais na Zona Euro; etc.

É um documento eminentemente técnico, mas não deve ser confundido com as análises que vinculam apenas os economistas do BCE, como acontece com os documentos de trabalho e os artigos de investigação da instituição. De resto, ao contrário do que sucede nesses casos, o Boletim Económico não é assinado, exactamente por se tratar da análise da instituição.

Um paralelo próximo com este documento é o Boletim Económico do Banco de Portugal.


O que é o Procedimento dos Desequilíbrios Macroeconómicos?


Em 2012 arrancou um procedimento por desequilíbrios macroeconómicos (PDM), cujas regras no seu braço correctivo prevêem sanções para países que não respondam com medidas de política económica às recomendações que lhe são dirigidas anualmente pela União Europeia.

A Comissão nunca activou o braço correctivo, uma opção que aos olhos de muitos, incluindo o BCE (mas também o FMI), descredibiliza o tal PDM, uma vez que há países que repetidamente têm desequilíbrios excessivos, e que ainda assim não respondem de forma satisfatória às tais recomendações da UE.

A 22 de Fevereiro, no âmbito da sua análise anual para este este efeito, a Comissão considerou que Portugal (Itália e Chipre) registaram novamente desequilíbrios macroeconómicos excessivos em 2016, e exigiu aos três países um plano de reformas ambicioso que promova a redução dos desequilíbrios. Disse ainda que o plano de reformas de 2016 respondeu apenas de forma "limitada" às recomendações do ano passado (mais detalhes no Massa Monetária)

Em Maio, a Comissão Europeia decidirá se abre ou não um procedimento a Portugal (assim como Itália e Chipre) o qual prevê multas por incumprimento das recomendações dirigidas ao país. Para isso terá como informação adicional essencial a edição de 2017 do Plano Nacional de Reformas (PNR) português.


O que diz o Boletim Económico do BCE sobre o PDM?


A 20 de Março, num artigo titulado, "The 2017 macroeconomic imbalance procedure and implementation of the 2016 country-specific recommendations", o BCE expôs a sua análise à ronda anual de avaliação aos desequilíbrios macroeconómicos feita pela Comissão Europeia no final de Fevereiro.

É importante notar que o BCE não decide sobre esta matéria, resta-lhe por isso partilhar a sua análise ao ritmo de implementação das reformas na Zona Euro, e à eficácia do Procedimento. Foi isso que fez.

No que diz respeito a Portugal, o banco central toma nota das conclusões da Comissão: o país está há três anos com desequilíbrios macroeconómicos excessivos e implementou reformas apenas de forma limitada.

De seguida destaca pela negativa Portugal (e a Croácia) entre os países da Zona Euro, revelando surpresa com o mau desempenho nacional: a baixa implementação de reformas "é particularmente surpreendente no caso de Portugal e da Croácia, uma vez que estes países se comprometeram a uma agenda ambiciosa de reformas em 2016, razão pela qual a Comissão não abriu um procedimento por desequilíbrios". Ou seja, o procedimento que abre o caminho a sanções não avançou o ano passado com base numa promessa que não foi cumprida pelo Governo.

O BCE é favor de sanções a comportamentos como português?


Sim, é, e não é de agora, como lembra o boletim.

A bem da credibilidade do mecanismo e da saúde da economia da Zona Euro, os instrumentos do PDM, incluindo as sanções, devem ser usados caso não sejam implementadas as reformas necessárias, lê-se no documento: "Desde a criação deste procedimento que o BCE entende que os instrumentos do PDM - incluindo a totalidade do braço correctivo [ou seja, as sanções] - devem ser usadas em relação aos países com desequilíbrios excessivos. Esta posição também foi defendida explicitamente no relatório dos 5 presidentes [Documento propõe o aprofundamento da União Monetária e é assinado pelos cinco presidentes das instituições europeias: Jean-Claude Juncker (Comissão Europeia), Donald Tusk (Conselho da UE), Jeroen Dijsselbloem (Eurogrupo), Mario Draghi (BCE) e Martin Schulz (Parlamento Europeu)] ".

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